domingo, 3 de outubro de 2010

Inquietante igualdade: processos de manutenção social


por Lucas Piter Alves Costa.

Graffiti de Banksi.
No percurso de minha vida acadêmica, tive a oportunidade conhecer distintos segmentos sociais, ou melhor, pude presenciar e participar de diversos grupos, com suas margens de manobra comportamentais mais ou menos elaboradas, rígidas ou determinadas. Em outras palavras, quero dizer que qualquer que seja o motivo que leve algumas pessoas a se reunirem (no caso, levando-se em conta meu percurso acadêmico), seja por uma apresentação de seminário, por uma causa estudantil, por questões de moradia (como nos alojamentos ou repúblicas), será possível notar que algumas normas de comportamento serão minimamente instituídas, mesmo que inconscientemente.

O espaço dessas relações sociais é um lugar de troca e construção de valores. Mais do que um espaço de identificação com o outro, é, antes de tudo, um espaço de diferenciação. As relações humanas estão sempre se tangenciando pela alteridade, elas serão sempre assimétricas em algum ponto, podendo chegar mesmo à hierarquização como meio civilizatório. Isso pode ser muito bem notado no meio acadêmico se levarmos em consideração que constituímos um nicho social que valoriza muito a titulação, até mesmo entre os graduandos. Quem vai negar que a notória (e às vezes abusiva) oposição entre veterano e calouro é uma prática de valorização assimétrica dos sujeitos sociais?

Michel Foucault,
autor de A Ordem do Discurso.
Portanto, estamos sempre criando a alteridade através de nossas práticas sócio-discursivas. Posso causar polêmica com o que vou dizer, mas acredito que a igualdade seja apenas uma utopia. E ainda, seria ingenuidade acreditar que o discurso da igualdade em um mundo essencialmente competitivo não seria uma tentativa de dominação, de instituição de uma nova ordem que possibilite dar ao lado fraco da alteridade uma chance de poder. Não precisamos exemplificar com revoluções operárias, estudantis ou marchas sexistas, basta buscarmos na memória uma simples DR (Discussão de Relação) ou uma atividade de lazer baseada na competição. A todo momento estamos tentando legitimar nossa posição em diferentes nichos sociais de nosso interesse. Minha tentativa de expressar essa opinião é prova dessa intencionalidade.

Então, se a igualdade é uma utopia, significa que ela não exerce a sua função? Não é bem assim. Acredito que, como no caso de toda utopia, a igualdade se preza a ser buscada, não atingida. É no processo de busca que ocorre os aperfeiçoamentos sociais, não na estabilização. A mera menção de uma dada igualdade suscita entre os segmentos que a compõem uma nova tática de manobra dentro do quadro social em questão, seja de manutenção dessa suposta igualdade, seja de superação de algum outro estado de alteridade. É impossível atingir um estado de igualdade que seja perene, se estamos falando de relacionamentos humanos.

Diferenças?Igualdade?

Por fim, ouso dizer que não acredito em relações humanas que não se pautem por alguma hierarquização – a simples diferença de idade pode ser fator balizador de comportamento entre duas pessoas, o que diremos então sobre o reconhecimento intelectual ou outros pontos mais polêmicos. Acredito na necessidade das diferenças para o dinamismo e aperfeiçoamento humanos. É no reconhecimento das diferenças que construímos o respeito, tão mais alcançável que a igualdade.


Fonte das ilustrações:
Ilustração 1: http://1.bp.blogspot.com/17banksyES_468x606.jpg
Ilustração 2: https://www.msu.edu/~duffkerr/HistoryOfSex/foucault2.jpg
Ilustração 3: http://blogdorabay.files.wordpress.com/2009/06/kaiser-16-06-2009-12451581931.jpg
Ilustração 4: http://www.video-divertido.com/data/media/19/Diferenca_entre_homens_e_mulheres_4.jpg



Contribuição do leitor Lucas Piter Alves Costa, estudante de Letras na Universidade Federal de Viçosa. Foi membro do Centro Acadêmico de Letras Ipsis Litteris e da Comissão Organizadora do XII EMEL. Foi representante discente da Coordenação do Curso de Letras da UFV (2009). Áreas de interesse: Literaturas de Língua Portuguesa; Literatura Comparada; Cinema; HQs; Artes Plásticas, Estudos de Tradução Intersemiótica, Narratologia, AD Semiolinguística. Tem experiência como professor de desenho artístico. Atualmente desenvolve a pesquisa "Encontro de Gerações: O Tempo Narrativo n'O Alienista", sob o viés da Análise do Discurso Semiolinguística.

1 comentários:

Ana Cecília disse...

Gostei muito de tuas palavras, Lucas. E concordo contigo, esse discurso de igualdade é hipócrita. Bem, hipócrita não é bem o que eu queria dizer, mas vale. Somos diferentes e na verdade temos que lutar e desafiar a convivência não em prol da igualdade e sim da existência e resistência das diferenças. Assim estaremos vivendo mais sincera e ricamente. Igualdade é simplista.

4 de outubro de 2010 às 23:28

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