segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Poemas pousaram nas árvores de Vinhedo

Como parte de um grande projeto em 86 cidades, organizado pelo Instituto Psia, selecionamos dez poemas de moradores locais e os pousamos nos galhos das árvores da praça no centro de nossa cidade, Vinhedo em SP. O resultado foi a leitura por transeuntes apressados, que encontraram minutos para acariciar e alimentar nossos poemas mansos. Desde o pessoal da limpeza , motoqueiros punk , executivos e pessoas crianças e idosas, comemoramos o Dia da Árvore com muita licença poética.


I VARAL DE POEMAS NAS ÁRVORES

CLUBE DOS ESCRITORES DE VINHEDO



“Poema que dá em árvore, quando amadurece não cai, pula e se agarra ao coração do leitor.”

Simone Pedersen



Inverno das horas

Estranho seria,
Se nessa pequena distância,
Entre um segundo e outro,
Não morasse dor, nem vazio.
Bom seria se surgisse barulho,
Gritaria desordenada e calor.
Mas é manhã cálida, cinzenta,
De gotas frias e ar gelado.
E nesse inverno das horas,
Estranhamente, reside saudade.
Faz brotar na face solidão.

Taiany Caroline Veronezzi


“Resto é Resto”

Tenho Deus na cabeça,
Tenho Deus no coração,
Respeito os mandamentos,
Busco a solução,

O resto é reza,
O resto é conversa...

Luto pelo pão de cada dia,
Respeito a minha vizinha,
Amo o próximo,
E os não próximos,
Amo a minha cachorrinha,

O resto é reza,
O resto é conversa...

Divido tudo o que tenho,
Pela Paz eu me empenho,
Desculpo, sempre, nunca odeio
Quando estou de saco cheio,

O resto é reza,
O resto é conversa...

Sem preconceitos,
Viva eu, viva as meninas e os meninos,
Viva os direitos, viva o hino!

O resto é reza,
O resto é conversa...

Marlene Cecília M. Sabatini


PROMESSA

O caminho que seguirei
Está repleto de lembranças
É saudade que não cala
É espera e é chegada...
O caminho por onde irei
Guarda a poesia nas flores
E o silêncio nos espinhos.
No pó dos meus passos
Toda a minha esperança.
Na distância do meu cansaço
A ternura do amanhã...
O caminho que farei
Está delineado nos meus sonhos.
Não é o antes, nem o depois
É o agora que se eterniza
Na paisagem de nós dois...

Vinhedo, Inverno de 2008.


Benevides Garcia

  
Levando a vida


o meu caminho

às  vezes escolho
às vezes aceito

o que a vida me oferece

às vezes acolho
às vezes rejeito

e assim vou levando

o amor eu recolho
o resto... dá-se um jeito!


Helenice Priedols


Será que o tempo parou?

Quando vejo um quadro belíssimo,
com paisagens admiráveis,
pergunto-me:  Será que o tempo parou?
Tenho certeza! Foi em ti que o artista se inspirou.

Tua beleza radiante,
agregada a teu sorriso transparente.
- Será que o tempo parou?
És maravilhosa? Ou sinto-me tão carente?

Oh! Minha musa e fonte inspiradora,
que move meus impulsos e pensamentos,
alguma vez já amaste?
Se esse alguém fosse eu, diria: - De fato, o tempo parou.


Aparecido Bi de Oliveira


Cinzas

Quero meus cigarros.
Dá-me e não me amoles.
Quero fumar a noite inteira.
E, já aviso, não irei à escola.

Quero ir a um lugar temido.
Por horas quero fazer amor.
Pouco me importam tuas doenças,
Se não quero prazer, mas dor.

Quero deliciar-me em teu choro,
Enquanto te conto teu problema:
Vivo contigo um romance forjado.
Nossa liberdade usa algema.

Não, não quero nada de ti.
Desta vida, só peço a morte.
Se essa me ouve, então virá,
Pois esta é minha sina, minha sorte.


Fernanda Farrenkopf


Distâncias

É a distância que nos aproxima,
Esse jogo de lua e sol, de luz e sombra,
De vento encrespando as ondas do mar
Até chegar à areia que espera solitária,
De pássaros atravessando nuvens no ar
Sem rotas traçadas no mapa astral,
Sem as linhas do destino desenhadas
Na palma das estendidas mãos.
Minhas mãos encontrando as tuas
Formando pontes à beira de precipícios.
E quando nossos corpos se encontram
As distâncias se encurtam
É como o céu beijar o mar
É se perder e não se encontrar
É como o sol e a lua estarem no mesmo lugar.


José Antonio Zechin


OLHAR

Seu olhar me fez sonhar
sonho que, como tantos outros,
imaginava seria fugaz, esqueceria;
mas, triste sina, continuo a sonhar,
agora inutilmente.


MARIAS

Se um dia me virem dormindo,
por favor, não me tragam flores
porque, destas, perfume já não sinto;
tragam-me recordações de amores
e imaginem estar eu, ali, fingindo.


Conrado Amstalden



Confidência

Um amigo me ensinou a voar, a abrir os braços e me lançar no espaço, sem medo e com confiança.
Me permiti sentir o vento no corpo inteiro e a respiração encurtada pela emoção.
Me deixou no alto da montanha e se despediu desaparecendo no céu.
Gritei que ele era lindo e acordei feliz para mais um dia.
Meus amigos me presentearam no meu aniversário, com uma queda livre num espaço coberto de estrelas e novamente o vento vestiu todo o meu corpo.
Acordei entorpecida de emoção e acreditando no amor existente na amizade.
Já visitei a lua e lugares coloridos e encantados.
Já me vesti de seda branca e ouvi uma promessa de amor.
Aprendi a acreditar nas diversas possibilidades, a seguir meu coração e viver para a eternidade.

                                                            
Núbia Hübner



Decisão

Deitada na cama,
Coberta de silêncio,
Escuto o escuro
Do meu dia.
Não tento mais fugir,
Sei que a vida
Sempre me acha.
Abro minhas janelas
Permito que os sonhos
Voem longe.
Choro ofensas e saudades,
Esvazio meu oásis.
Nada mais me atinge:
Hoje sou deserto.

Simone Alves Pedersen


POEMA FONÉTICO
consoantes surdas, sonoras...e não só.

Verdes vagas vagabundas*
vagueiam vagamente pelas marés...
O por do sol, poeta pintor
pincelou de cor a prata do mar...
e dolente, o dia, vaga vagamente
parte, penitente...


Ilda Regalato
Portugal


(*) Vagabundas: varejeiras



 rio sem dono

rio sem dono rio barrento rio brando rio bravo rio da dor
rio do amor rio das lavadeiras com suas rodilhas de pano as bacias cheias de roupas o rio doce o rio cercando
o rio lambendo as pedras o rio levando a vida
as lavadeiras cantando ensaboando o cheirinho de lavanda as águas do rio correndo o rio espumando
as   roupas quarando: de vez em quando a correnteza levando uma camisa.
eu feito um cascudo a bater desajeitados os braços e os pés
não fui um menino-peixe
(até hoje não sei nadar)
nem cacei passarinhos...
admirava-me o balanço das águas o vai e vem sem cessar
e o mistério escondido naquela ilha distante:
seria habitada?
por horas eu ficava a cismar chegava o crepúsculo a ave maria...
e a vastidão do céu dentro do meu olhar

Jair Barbosa
Belo Horizonte/MG

  
Recital da Goiabeira.

Eram cacos de acasos.
Pousados na goiabeira.
O tempo, correndo, rio abaixo.
E a sorte, feito sereia,
Riscava silhuetas de afeto
Entre bocas de areia.

Karline da Costa Batista
www.anancara.blogspot.com
Aracati/CE


abismo.

tínhamos: leite, luar e laço
faltava: amor, amora e amasso
restou um                    espaço.



Rafael Luiz Zen
www.rafikizen.blogspot.com.br
Brusque/SC




ENCANTAMENTO

                                    no balde de juçaras
                                    o homem busca
                                    a água de que precisa

                                    no terreno seco
                                    procura o vento

                                    encontra Deus
                                    disfarçado de sabiá


Luiz Otávio Oliani
Rio De Janeiro/RJ

memória afogada

O passado engoliu quase tudo
Não posso nem falar, nem lembrar, nem temer
O passado me roubou a alegria
Não deixou fotos,
Nem histórias ainda por contar
Podia ter roubado minhas lágrimas
e não deixá-las secarem ao sol
e não deixá-las molharem minha alma
Podia ter sido mais condolente
e devolver o que eu perdi
e trazer o que eu amei
Mas deixou apenas a certeza
de que nem tudo se repete
e que a pedra jogada não volta
O passado engoliu quase tudo
Insensível, deixou as lembranças 

Clarice Paes
www.
claricepaes.blogspot.com
Campinas/SP



O POUSO DO HAIKAI

Um poema pousou
na árvore do pensamento
e logo ficou.

Francisco Cleyson de Sousa Gomes
www.saladapoeticalia.blogspot.com
Teresina/PI



ár vore

                               ar ar ar ar ar ar árvore
foice

ar ar ar ar ar árvor
foice

ar ar ar ar árvo
foice

ar ar ar árv
foice

ar ar ár
foice

ar á
foice

...
foi-se

Reginaldo Costa de Albuquerque
Campo Grande/MS

  
Relíquia

Relíquia: deveras é o sentimento guardado...
O que não pode ser expressado...

Quimeras, outroras, remakes, releases  
Unidos por pontos. E as virgulas:
Entrelaçadas...


Robson Leandro Soda
Santa Cruz do Sul/RS


Feriado

Presente cheio de passado.
Afeto extravasado. 
Tempo e espaço para mim.
Livro, música, edredom, amor sem fim. 
Chega de pensar em futuro.
No fundo, nada é seguro. 
Fui morar um tempo dentro do meu coração.
Por favor, não me incomode não. 


Tatiana Wan-Der-Maas Guimarães
Governador Valadares/MG




Nuvens

    Nuvens são crianças.
    Crianças especiais.
    Que um certo dia
    De tanto comerem açúcar,
    Se transformaram em algodão doce!

Tom Vital
Belo Horizonte/MG


  
ALFABETO DO VERDE                                       

Um lagarto carrega os desusos da tarde
ao sol
sobre as pedras do muro.

O pensamento navega entre as fendas,
sob as folhas das trepadeiras,
com sede de entender o alfabeto do verde.

Se o jardineiro hoje vier com a foice
para arrancar as folhagens que dão significado à muralha,
ensinarei a ele:
não se matam essas pequenas paisagens individuais
que emprestam vida aos olhos
na leitura das coisas.

Sérgio Bernardo
Nova Friburgo/RJ

  
COCHICHO

Ela veio caminhando
toda acanhada

querendo me contar as boas novas


Aproximou-se de mim

com as mãos fechadas
diante do rosto

assim, como se trouxesse
só pra me mostrar

ao abrir dos dedos
um vagalume

Rodrigo Domit
Rio de Janeiro/RJ



Poema a Gonçalves Dias

A terra onde havia palmeiras
Hoje tem devastação;
Onde cantava o sabiá
Reina solta a erosão.

Que diria o poeta
Se vivesse para ver
Toda a sua poesia
Neste solo esmaecer.

Com certeza ia chorar
Pela triste imensidão
Pela seca e o deserto

Desencantado por certo
E com dor no coração
Pediria pra não voltar...


Valdeck Almeida de Jesus
Salvador/BA


Transeuntes

Fingimos que dormíamos ao anoitecer
E nossas risadas frouxas quase nos denunciaram,
Mas o velho mundo andava sonolento e não pode perceber
Que o nosso fingimento foi o bastante para ele ser enganado.
Então saímos pelos fundos sem ninguém nos ver,
E corremos bem depressa para longe de tudo que era claro,
Habitamos cada silêncio do desconhecido escurecer
Se alimentando de cada mistérios que nos era dado.
E cada esquina era um palco para você,
E cada sorriso era uma marca que deixávamos.
Fomos adentrando naquela noite sem perceber
Que colhíamos tudo aquilo que nos sonhos havíamos plantado.
Então tornamos depois de muitas voltas a entender
Que todo esse nosso reino era limitado,
A manhã carregada de pessoas estava prestes a aparecer,
E colocar fim em tudo nesse nosso grande achado...
Ei, noite, não se deixe amanhecer,
Que é no silêncio o nosso grande carnaval,
Ei, noite, não abra a porta para aqueles que abortam porquês,
Pois o existencialismo é o nosso assunto principal.


Leonardo Bruno de Araújo Santos
www.facebook.com/araujoleonardo
Arcoverde/PE


  
Visão Nefasta

A luz percorre a iris
E não revela a poesia

A realidade
Corre risco

Rosana Banharoli
Santo André/SP















Simone Pedersen é escritora e escreve para a revista Contemporartes há dois anos. Em outubro publica seu vigésimo livro. Publica para crianças e adultos.

www.simonealvespedersen.blogspot.com





9 comentários:

Unknown disse...

O projeto do PSIA "Poemas nas Árvores " é a prova que pode-se plantar poesia e colher leitores de forma simples e colorida.

25 de setembro de 2012 às 00:19
edweinels disse...

Um projeto maravilhoso que tem que ser, cada vez mais, incentivado. Parabens aos organizadores e a todos os poetas que participaram do projeto: irmanando Poesia e Natureza. Parabens a todos.

25 de setembro de 2012 às 01:48
thoshio katsurayama disse...

Belíssimo projeto e deve ser repetido. Note-se a presença de belos poemas e autores extremamente criativos. É uma oportunidade para se expressarem e serem conhecidos por um público diferente. Parabéns a todos!

25 de setembro de 2012 às 09:08
Núbia Hübner disse...

Uma idéia simples com resultado magnífico. Parabéns e obrigada aos organizadores do evento pela oportunidade de participar. Abraço carinhoso aos escritores em especial meus poetas vinhedenses.

25 de setembro de 2012 às 09:13
Rodrigo Domit disse...

iniciativa muito bacana do Marcelo Rocha, lá de Governador Valadares - MG

foi um prazer enorme fazer parte desta mobilização!


=]

25 de setembro de 2012 às 09:58
geraldo trombin disse...

O projeto é inovador e belo... os textos do amigos participantes, cativantes, versos que se espalharam feito formigas pelos meus braços-galhos-árvores... isso merece um abraço... Sintam-se então por mim abraçados...
e também homenageados por tão grandiosa iniciativa...

*^^*

25 de setembro de 2012 às 16:15
Anônimo disse...


Valeu, Vinhedo ! Impressionou ! As palavras e construções poéticas fibrilaram em meu coração.
Menção honrosa para Simone!
Quem sabe, noutra ocasião, experimentem expor poesia em trovas, que atingem a todos mais diretamente, com simplicidade, sendo rimadas e popularmente accessíveis!
Parabéns a todos! Lóla Prata- presidenta da seção Bragança, da União Brasileira de Trovadores.


25 de setembro de 2012 às 21:12
Anônimo disse...

Uma iniciativa muito legal!!! Romper a rotina do dia=a=dia, com poesia!!!Adorei!!!!

26 de setembro de 2012 às 20:20
Karline Batista disse...

Tornar a poesia algo ao alcance do leitor, levá-la as ruas e povoar o cotidiano com um outro jeito de sentir as coisas é mais do que gratificante, é nobre!

Estou contente de ter participado deste projeto mais uma vez,

11 de novembro de 2012 às 14:39

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