GRAVADOR OU GRAVURISTA?
GRAVADOR OU GRAVURISTA?
Semana passada, atropelado pelo
calendário e
pressionado pela absoluta falta de tempo e de inspiração para escrever, deixei de publicar meu segundo texto na coluna Art&fato, nesta conceituada revista eletrônica. Decidido a me penitenciar dessa “falha literária”, vasculhei arquivos antigos e encontrei, em esquecida gaveta de minha desorganização cotidiana, um estudo que iniciei na EMBAP - Escola de Música e Belas Artes do Paraná, abordando a polêmica sobre duas expressões de uso corrente dos amantes do ofício da gravura: gravador e gravurista e resolvi publicá-lo. O assunto é árido e sempre causa confusão e críticas, mas esse é o objetivo de quem escreve: provocar reações.
A maioria dos aficionados da arte da gravura sequer admitem a menção do termo gravurista , que consideram pejorativo e inadequado. O argumento mais forte que utilizam esses artistas, entre os quais destaco meu professor de xilogravura e amigo, grande mestre André de Miranda, é que gravura é a arte de gravar, sulcar, marcar a matriz de madeira ou metal. O artista grava, isto é, faz sulcos, marcas na placa ou chapa que vai ser impressa depois, o que resulta numa estampa onde a imagem aparece invertida. Portanto, o artista que grava só pode ser gravador. O termo gravurista, para eles, não caracteriza adequadamente esse ato de gravar, sulcar ou marcar a chapa ou placa. Parece termo frouxo, mais conveniente a quem coleciona ou aprecia gravura, ou àquele que faz cópias em xerox ou por outro meio fotomecânico de pinturas ou desenhos. Não representa, portanto, o artista que faz gravura.
pressionado pela absoluta falta de tempo e de inspiração para escrever, deixei de publicar meu segundo texto na coluna Art&fato, nesta conceituada revista eletrônica. Decidido a me penitenciar dessa “falha literária”, vasculhei arquivos antigos e encontrei, em esquecida gaveta de minha desorganização cotidiana, um estudo que iniciei na EMBAP - Escola de Música e Belas Artes do Paraná, abordando a polêmica sobre duas expressões de uso corrente dos amantes do ofício da gravura: gravador e gravurista e resolvi publicá-lo. O assunto é árido e sempre causa confusão e críticas, mas esse é o objetivo de quem escreve: provocar reações.
A maioria dos aficionados da arte da gravura sequer admitem a menção do termo gravurista , que consideram pejorativo e inadequado. O argumento mais forte que utilizam esses artistas, entre os quais destaco meu professor de xilogravura e amigo, grande mestre André de Miranda, é que gravura é a arte de gravar, sulcar, marcar a matriz de madeira ou metal. O artista grava, isto é, faz sulcos, marcas na placa ou chapa que vai ser impressa depois, o que resulta numa estampa onde a imagem aparece invertida. Portanto, o artista que grava só pode ser gravador. O termo gravurista, para eles, não caracteriza adequadamente esse ato de gravar, sulcar ou marcar a chapa ou placa. Parece termo frouxo, mais conveniente a quem coleciona ou aprecia gravura, ou àquele que faz cópias em xerox ou por outro meio fotomecânico de pinturas ou desenhos. Não representa, portanto, o artista que faz gravura.
Acontece que termos e expressões linguísticas não
levam em conta argumentos, mesmo sendo legítimos. É o uso corrente que
faz com que se popularizem ou sejam erradicados da língua e nem sempre o
mais adequado predomina. Às vezes permanece em uso aquele que mais chama
a atenção ou que tem pronúncia e escrita mais fáceis. Os livros
especializados de gravura que pesquisei utilizam
invariavelmente o termo gravador. Por outro lado, os textos
de jornalistas, comentaristas, marchands e escritores em geral referem-se aos
artistas da gravura, quase sempre, como gravuristas. Na internet,
o termo gravurista aparece com
destaque para denominar quem pratica o ofício da gravura. No Wikipédia, por
exemplo, assim que se digita o termo gravador, aparece a
seguinte nota: Se procura o artista que
faz gravuras, veja Gravurista. O Gravador é
um dispositivo eletrônico, criado para registrar e reproduzir sons em uma fita magnética. No
conhecido e apreciado livro A Gravura, de autoria de Jordi
Catafal e Clara Oliva, da Editora Estampa, de Lisboa, edição 2003, na
página 11, que trata da definição de gravura e estampa original, o termo gravador aparece
na 1ª linha: “Quando o gravador concebe e
realiza a gravura”; e,
ainda, na 5ª e 6ª linhas : “… executada pelo mesmo gravador”. O excelente manual
Gravura em metal,
organizado por Marco Buti e Ana Letycia , da Editora Edusp, ed. 2002, na
página 16 registra: “… o gravador trabalha com
probabilidades, e não com certezas”. Também o pequeno mas importante
livro A gravura, de Iberê Camargo, mestre
dos mestres de gravura, registra na página 13 o termo gravador: “… para um
gravador o que importa é examinar a obra dos mestres…”. O termo é citado ainda
na coletânea Gravura brasileira hoje – Depoimentos, volume III, da Oficina
de Gravura Sesc – Tijuca – RJ, pág. 14, no Informativo
do Núcleo de Gravura do Rio Grande do Sul, Ano III, nº 9, agosto
2003, pág. 3, e no livro A arte maior da gravura, de Orlando da Silva, pág. 18, e
ainda na Coletânea
Brasileira na Coleção Mônica e George Kornis, edição
da Caixa Cultural, ano 2008. Vários outros livros e manuais de gravura
registram o termo ( a relação completa ficaria por demais extensa e cansativa),
mas o fato denota que os profissionais da área preferem o termo gravador, pelo motivo exposto no início deste texto.
Quanto aos dicionários, consultei os mais
utilizados na atualidade. Apenas dois não registram o termo gravurista: o Dicionário Michaelis – Moderno Dic. Da
Língua Portuguesa, Edit. Melhoramentos, ano 2002, pág. 1052,
registra apenas gravador: adj. (lat gravatore). Que grava. S.m. 1 Aquele que grava em madeira, aço,
cobre, prata etc; o Dicionário
Brasileiro da Língua Contemporânea Caldas Aulete, volume III, da
Edit. Delta, 5ª ed., ano 1986, pág. 956, também registra somente o termo gravador, na mesma acepção. O Dicionário Aurelio da Língua Portuguesa,
Ed. Positivo, 5ª ed. , ano 2010, registra gravador, pág. 1051, e gravurista, pág. 1053:[de gravura +
ista]S. 2g. "Pessoa
que exerce a arte da gravura", e abona o uso com a seguinte citação
da jornalista Marília Martins, do Jornal do Brasil, em 14.04.1992: “A
retrospectiva da gravura brasileira parte dos anos 30 e percorre os anos
seguintes marcados pela regionalização dos núcleos de gravuristas.” Isso
significa que a abonação foi dada por pessoa leiga no assunto. O Dicionário
Houaiss da Língua Portuguesa, Edit. Objetiva, 1ª ed., 2009, pág.
988, registra os dois termos citados, apresentando gravurista como
substantivo de dois gêneros, no sentido de “artista especializado nos processos
de gravura”. Já o termo gravador, na pág. 987, é apresentado com um verbete bem
mais específico e de acordo com a atividade de gravar em placa ou chapa de
matéria dura. O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa,
da Academia Brasileira de Letras, Edit. Global, 5ª ed. 2009, pág. 411, registra
os dois citados termos como de uso corrente na língua. Por fim, encontrei ainda
registros dos dois termos no Dicionário de Usos do Português do Brasil,
Edit. Ática, 1ª ed., 2002, de Francisco S. Borba.
As consultas referidas anteriormente apontam
a preferência clara do meio artístico pelo termo gravador, nos manuais, livros de gravura, coletâneas, apostilas
etc., enquanto os dicionários reforçam a questão do uso
corrente da língua, demonstrado pelos registros de ambos os termos em verbetes,
abonando tanto um quanto outro. A Arte abrange um círculo
social muito vasto, a nomenclatura artística não é veiculada apenas
por artistas, atinge também o público aficionado por arte, admiradores,
galeristas, marchands, colunistas etc. Esse
vasto universo de pessoas é que dita o uso dos termos linguísticos,
no tempo e no espaço. Por mais que artistas prefiram usar gravador na fala cotidiana e em seus
escritos, essa preferência não é suficiente para fazer com que o
termo gravurista perca
espaço e deixe de ser usado.
A polêmica é fruto da natureza humana, e no meio artístico não
é diferente: artistas são temperamentais e às vezes os ânimos se acirram.
Nessa disputa, acredito que só o tempo vai mostrar qual
dos termos permanecerá em uso no futuro. O provável é que
permaneçam os dois. Mas, para os artistas, o que importa não é serem
chamados gravadores ou gravuristas: o importante para nós artistas é
continuarmos a fazer gravuras.
Thelmo Olisar Silveira
Thelmo Olisar, natural de Porto União-SC, é graduado em Letras, bacharel em Gravura pela EMBAP e pós-graduado em Arte-Educação. Foi ilustrador gráfico e revisor de textos do Departamento de Ensino da SME de Curitiba-PR. Como artista plástico, participou de coletivas, individuais e salões, com premiações. Como professor, atuou em colégios particulares de Curitiba e S. Paulo e na rede pública estadual do Paraná e da Prefeitura Municipal de Curitiba-PR. Foi revisor do jornal O Estado de S. Paulo e redator do BCN-SP. Atualmente, desempenha funções de consultor gramatical do serviço de Telegramática, da Prefeitura Municipal de Curitiba-PR.
1 comentários:
Muito bom! Obrigado!!
7 de dezembro de 2020 às 22:08Postar um comentário
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