O QUE É A BELEZA?
Definir o que é a beleza parece tão difícil quanto definir o que é a verdade, ou o que é a arte; dizendo
de outro modo, é tarefa quase impossível. Essa polêmica se estabeleceu desde que o
homem adquiriu consciência de si e do mundo que o rodeia e passou a
questionar-se e ao próprio mundo.
Antes de
mais nada, é preciso entender que o sentimento de beleza pertence a todos os homens e mulheres e que esses homens e mulheres estão sujeitos a todas as vicissitudes da vida.
Michel
Ribon, em Arte e Natureza, tratando do belo natural e do belo artístico, estabelece
uma triangulação baseada em três questões fundamentais sobre o tema:
- De onde vem o sentimento natural de beleza que
experimentamos?
- De que forma a concepção do belo, na natureza,
introduz uma certa idéia de beleza
artística?
- Como formular a
questão da primazia de uma sobre a outra?
Essa
triangulação estabelece o problema da relação
existente entre arte e natureza, que por sua vez cria outra triangulação: a arte é o espelho
da natureza ou a natureza é o espelho da
arte, ou ambas seriam reflexo do espírito?
Essa
questão permanece insolúvel até hoje,
pois é impossível separar o homem
do meio em que vive, isto é, a própria natureza, e assim como o homem interfere na natureza e a modifica, esteticamente,
para melhor ou para pior (?), também é
certo que a beleza que emana do mundo natural sempre vai
influir em qualquer conceito abstrato que o homem sobre ela estabeleça.
No Oriente (China, Japão, Índia, etc.) como a arte se
caracteriza como meditação filosófica
sobre a natureza e o mundo, onde
entram valores e simbologias complicados e de difícil compreensão para a
mente ocidental, existem poucos indícios de
preocupação crítica e teórica sobre
arte e beleza, o que se percebe é que
os orientais nunca chegaram a conceber a arte pela arte como no
Ocidente, isto é, a arte é sempre concebida em função da vida, da totalidade e
do significado da existência, o que me parece muito mais lógico e coerente.
No Ocidente, a questão se dividiu durante séculos
entre os que tentam fundamentar a objetividade da arte e da beleza ( Platão,
Aristóteles, Plotino, Tomás de Aquino) e os que defendem seu caráter subjetivo, como os empiristas (David
Hume). Para Tomás de Aquino o belo é um dos aspectos fundamentais do ser,
juntamente com o bem e a verdade, por isso estabeleceu o estudo do ser em uma trilogia: estética, ética e metafísica.
No século XVII, Baumgarten inaugura oficialmente a disciplina filosófica
estética”, conceituando-a como “ciência do belo e da arte”. Kant consolida essa
tripartição, elaborando seu sistema crítico
através de três obras: Crítica da Razão Pura; Crítica da Razão Prática e
a Crítica da Faculdade do Juízo, que investiga a experiência estética do belo
como atitude contemplativa, desinteressada e não-conceitual, das faculdades
humanas.
Mas a polêmica
persiste e passa pelo idealismo alemão
de Schelling e Hegel (auto-superação do espírito em busca do absoluto),
por Nietzsche (arte como estimulante
vital contra o pessimismo da decadência platônico-cristã). Heidegger rompe
definitivamente com a tripartição da questão ontológica, conduzindo o problema
da arte para a questão da verdade e
não para a do belo, conforme os
tradicionais estudos da estética.
Essa independência da obra de arte tanto em relação à intenção do autor
quanto a valores e propósitos não propriamente estéticos vai caracterizar a produção do século XX.
A função da arte deixa de ser
representar
naturalisticamente o mundo ou
promover valores, sejam eles sociais, morais, religiosos ou políticos. Sua
especificidade a partir desse momento é
ser promotora da experiência estética. Ao lado disso, encontramos o repúdio à
estética sistemática e o ceticismo em relação às possibilidades de se definir a
beleza. A nova atitude estética é a
valorização das características individuais de cada forma de arte, o que
possibilita a cada um
experimentações na busca da sua
linguagem específica e característica. Com a dissolução da atitude naturalista,
os artistas passam a menosprezar o assunto ou o tema das suas obras para
valorizar o fazer a obra de arte. Qualquer assunto serve, ou mesmo nenhum
assunto, como é o caso da arte abstrata e da música atonal. Assim a obra de
arte adquire um estatuto próprio de obra, isto é, ela não tem por função
representar nenhum aspecto da realidade exterior, pois ela é a própria
realidade. Realidade especial, diferente da
realidade do nosso cotidiano, realidade de obra de arte.
Hoje em dia, de uma perspectiva fenomenológica, consideramos o belo como
uma qualidade de certos objetos singulares que nos são dados à percepção.
Beleza é , também, a imanência total de
um sentido ao sensível. O objeto é belo porque realiza seu destino, é
autêntico, é verdadeiramente segundo seu modo de ser, isto é, um objeto
singular, sensível, que carrega um significado que só pode ser percebido na
experiência estética. Não existe mais
a idéia de um único valor estético a
partir do qual julgamos todas as obras. Cada objeto singular estabelece seu
próprio tipo de beleza.
Importante é saber que todo aquele que estuda a arte com seriedade
deve compreender o seguinte: seja qual for seu sentimento ou conceito particular de beleza, deve estar
disposto a admitir que há no reino da
arte manifestações genuínas desse sentimento em outras pessoas, em outros
períodos. Arte primitiva, clássica, gótica ou contemporânea apresentam para ele
igual interesse, sua preocupação principal deve ser não a de avaliar os méritos relativos de tais
manifestações periódicas do sentimento de beleza, mas distinguir o que é
genuíno e o que é falso em todos os períodos.
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