sexta-feira, 21 de outubro de 2016

ARYSTARCH KASZHUEWICZ, A ESPERANÇA EM VIDROS COLORIDOS

 

"...Do altar dessa igreja, olhando-se na direção da porta principal, Arystarch colocou no vitral um arco-íris que cobre o mundo. Beethoven cantou a alegria. Arystarch Kaszkurewicz pintou a esperança."  (Rubem Alves)
O que leva um homem que perdeu as mãos, um olho, sua pátria, a realizar obras que pareciam impossíveis? Para responder essa pergunta a Casa da Cultura Polônia Brasil e o Consulado Geral da República da Polônia em Curitiba com apoio da Sociedade Polono-Brasileira Tadeusz Kosciuszko trazem à Curitiba no dia 21 de outubro a jornalista e escritora Raquel Bueno, que juntamente com Eugenius, filho do artista polonês Arystarch Kaszhuewicz, lançou em 2004 o livro “Arystarch, o arquiteto dos Deuses”, com fotografia de Gustavo Olmos, a publicação foi patrocinada pela Eletrobrás.

Nascido em 12 de fevereiro de 1912, Kaskurewicz graduou-se em direito e obteve um doutorado em Varsóvia antes de ser incorporado ao exército polonês. Durante a Segunda Guerra Mundial, em consequência da explosão de uma granada, Arystarch perdeu as mãos e o olho esquerdo. Morou com sua família na Alemanha, e chegou ao Brasil em 1952, fixando residência em São Bernardo do Campo, passando a dedicar-se à arte sacra. Sua esposa, Ludmila, sempre o acompanhava nos trabalhos.

Retrato de Arystarch com uma de suas obras

Era um período de convulsão social em toda a Europa, e meu pai migrou para a Alemanha onde fez o curso de artes plásticas, país em que eu nasci – conta o filho de Kaskurewicz, Eugenius, que reside no Brasil.
Na Alemanha, Arystarch revelou-se um artista de grande expressão, passou a sobreviver compondo murais e vitrais para igrejas e capelas, como a igreja de Lübeck, na Alemanha. A maneira como conseguia compor sua arte, usando trapos, tintas e a tampa de uma lata de conserva, logo cativou os padres alemães, que passaram a auxiliar o artista a se evadir da perseguição aos poloneses, buscando refúgio no Brasil, onde já residia um irmão de Kaskurewicz. 
Vários pedidos foram feitos ao governo pelos padres alemães, por intermédio da Conferência Nacional Católica de Bem- Estar (National Catholic Welfare Conference), até que, em 1952, o presidente Getúlio Vargas editou um decreto concedendo autorização especial para que o artista imigrasse.

Uma das obras realizadas pelo artista polonês em São Paulo

Radicado em São Bernardo do Campo, ele passou a trabalhar como vitralista numa casa especializada de São Paulo, a Casa Conrado. O seu traço anônimo foi sendo deixado em centenas de obras espalhadas pelo Brasil. Em todos os locais deixava nos vitrais e pinturas a sua marca, incluindo símbolos e rostos que faziam com que amigos e pessoas próximas identificassem seu trabalho.
Ele precisava retratar muitos rostos, então usava os mais conhecidos. No Salão Nobre da Beneficência Portuguesa, em São Paulo, deixou seu próprio rosto imortalizado em um dos desenhos – afirma Eugenius.
Por sua deficiência, o artista chegou a ser comparado ao brasileiro “Aleijadinho”. Na maior parte anônimo, o acervo de Kaszkurevicz ainda está sendo mapeado. A surpreendente forma como usava os pulsos para fazer as obras de arte acabaram por criar um estilo inconfundível, com a predominância de formas retas. Suas obras estão espalhadas desde o interior gaúcho ao nordeste do país, como Fortaleza, São Paulo, Rio de Janeiro, Campinas, Santo André, Cuiabá, e também no Exterior, como Montevidéu, no Uruguai. Arystarch morreu em 1989, aos 77 anos, em São Bernardo do Campo.

Detalhes de obras do de Arystarch, em Igrejas espalhadas pelo Brasil

Ele não deixou que a deficiência física se transformasse em obstáculo. Tinha um projeto de vida, de marcar várias igrejas com obras e levou adiante. Era sua forma de mostrar gratidão pela forma como havia sido acolhido pelo Brasil – afirma o filho.
Entre as heranças deixadas por Kaszkurevicz, segundo Eugenius, estão o exemplo da honestidade – ele dizia que não veio para o Brasil a fim de “fazer a América”, no sentido de buscar ganhos ou vantagens – e escreveu um livro sobre sua obra, que agora será editado pelo filho. O material sobre arte monumental, ainda manuscrito, é um tesouro testemunhal em que o artista explica suas técnicas na confecção de vitrais e esculturas com esgrafito à fresco.

Estilo artístico carrega semelhanças com as formas geométricas dos Wycinanka, uma técnica artesanal muito popular na Polônia 


As obras do artista ficavam sem assinatura, mas ele deixava secretamente traços e símbolos que só os seus amigos decifravam. O vitralista Simeão Sugai trabalhou com ele por quase dez anos. Quando era inquirido sobre o significado de seus vitrais, ele respondia: “Para quê? As crianças entendem sem fazer perguntas”.

Ex-ajudante do artista diz que ele "deu muitas lições de humildade"

Raquel Bueno em seu Livro Arystarch, o arquiteto dos Deuses, conta um pouco da história do artista: “Como jornalista e escritora, tive parte de minha vida dedicada a investigar onde se encontravam as obras maravilhosas do artista polonês. Sem as duas mãos e sem um olho, Arystarch percorreu o Brasil gravando nas paredes das Igrejas, as mais belas obras. Vitrais, afrescos, mosaicos, pinturas, estão presentes em quase todos os estados brasileiros. 

Ele não gostava de mostrar que não tinha as mãos, mas seus trabalhos e os diversos estilos que criou, não o impedia de subir numa escada velha de madeira para dar vida à sua obra. Assim, registrou o processo histórico de sua vida. Continuo fotografando várias cidades para dar continuidade ao meu trabalho, porque acredito que em breve Arystarch não será mais um artista anônimo”, diz a autora.


Capa do livro de Raquel Bueno



Serviço:
Palestra“Arystarch, o arquiteto dos Deuses” com Raquel Bueno
Quando: Sexta, 21 de outubro de 2016
Local: Casa da Cultura Polônia Brasil
Rua Ébano Pereira, 502 – Centro – Curitiba/PR
Entrada: Gratuita, aberta a todos os públicos
Mais informações: contato@poloniabrasil.org.br– Fone:(41) 3088-0708
Casa da Cultura Polônia Brasil





Fontes:

                                                                      ***





Izabel Liviski é autora das Colunas Polonaises e INcontros, co-editora da Revista ContemporArtes. Professora e Fotógrafa, é doutora em Sociologia pela UFPR.









1 comentários:

Francisco Cezar de Luca Pucci disse...

Acostumados que estamos neste mundo cada vez mais material, vemos as pessoas em suas expressões externas, principalmente sociais. Somos "tocados" sempre que alguém nos mostra a expressão espiritual de alguém, que o faz UM ser, um poro por onde foge do interior do Universo a beleza para nos empolgar. Maravilhosa esta apresentação.

24 de outubro de 2016 às 17:15

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