sábado, 12 de setembro de 2009

“Audição no Céu”

Merce Cunningham

Pina Bausch



Michael Jackson


Coluna da Aline Vilaça






Confesso que nestes 21 dias de ausência de novos comentários deliciosos de vocês, agradabilíssimos leitores assíduos da coluna, tenho me sentido um tanto quanto só. [risos]. Dramas excessivos a parte, aproveitarei o assunto para agradecer o carinho e atenção dos comentários, e-mails e críticas.
Conforme o combinado na primeira coluna, hoje farei um breve comentário sobre três expoentes da habilidade humana de “movimentar-se” criada com preocupação expressiva. Não disse Dança, porque talvez os discípulos da área desta arte erudita, sofisticada, virtuosa, técnica, privilégio de conservatórios, universidades, companhias, teatros, se sintam desconfortáveis ao verem citado junto dos seus, um artista talvez de massa, talvez apenas produto da indústria cultural, talvez despreocupado com a quase sagrada visão da Dança.
Veja minha insistência nos “talvez”, porque não vou julgar, questionar e/ou comparar o valor das obras, tampouco analisar a qualidade de cada artista citado a baixo. Só desejo homenagear, lembrar, pedir que esta audição no céu não abra mais vagas tão cedo, e dizer, sincerament,e o que observo em Merce Cunningham, Pina Bausch, e Michael Jackson que, infelizmente, faleceram este ano.
Providos de talento, dom, dedicação, paixão, entrega e devoção; partiram da mesma necessidade do fazer, da coexistência de diferentes maneiras de sentir, e das múltiplas possibilidades de ser o que é, o que se quer, o que precisa, o que o escancara, o que o esconde. Construíram seu legado, cada qual a seu modo, coerente à sua busca, à sua fuga, ao seu desespero, à sua paixão, coerentes até mesmo ao contraditório desconforto agradável e desafiante de seu estado permanente de desenquadro social.
Cunningham jogou-se no vazio da contemporânea vida esquecida, auto- flagelada, de valores distorcidos, explicitados por suas linhas no contraditório caos da incessante busca do sentir. Sentir ausente, da geração ardente do não sentimento.
Pina falou do amor, do maduro doloroso amor que pulsa e entrega o feminino ao inebriante êxtase que abre todos os poros da entrega espiritual do corpo a mercê de toda a expressão possível alojada no útero, no coração e no cérebro gerador da mulher, que com total domínio de si mesma consegue e necessita entregar-se em cena, para a cena, em si, para si, por arte.
Michael ao contrário de Pina não pode amadurecer, apurar, lapidar nem sua arte nem a si mesmo, não teve o aval, nem se permitiu. Não pode amadurecer, nem aquele menino do cabelo Black Power redondinho, do sorriso singelamente espoleta, que contagiava os Five e uma legião de meninos e meninas afro-descendentes de lá ou de cá que viam nele a possibilidade de ser mais, a possibilidade de também sorrir de forma espontânea, gostosa e pueril. É sabido que sua infância não foi assim como exige o direito, não foi de brincadeiras, travessuras, doces, escola, amiguinhos, e sim – foi de ensaios.
Foi de excesso de ensaio, de palco, de luzes, fãs, discos, dança, coreografias, canto, voz e suor. Fez assim como Pina e Cunningham entregou-se ao corpo que dança. Sem ter tempo de amadurecer nem o corpo que carregava passos, nem aquele corpo que tanto se transformou, nem o coração que tanto sentiu e sofreu, nem a psique que viu na terra do nunca seu complexo escolhido. Nem amadureceu o Pop Star, Rei do Pop que despencava em excentricidades.
Diferente dos grandes nomes da Dança saudados hoje, Michael atingiu a massa, a elite, misturou estilos, remeteu à Fosse, reverenciou o Rock ao misturado com a Soul Music e toda a música negra norte- americana, reverenciou os tambores do Pelô.
Mas, sobretudo quero dizer que mesmo cada qual com seu estilo e modo de fazer artístico, é nítido que marcaram a história, marcaram a dança e marcaram a arte. Com o desespero de quem carrega a necessidade e a incumbência de transformar seu corpo em fonte de diálogo, expressão, comunicação, e possibilidade de no real fazer o considerado impossível.

Dica para conhecer Baush:
LAMENTO DA IMPERATRIZ: A linguagem em trânsito de Pina Bausch e a
questão do espaço e a cidade na obra bauschiana. Autora: Solange Caldeira.
O livro
estará disponível na Annablume Editora e livrarias do RJ, SP, MG e SC
.


Aline Vilaça escreve quinzenalmente aos sábados no ContemporARTES.

2 comentários:

Rosana disse...

... entregou-se ao corpo que dança. Sem ter tempo de amadurecer nem o corpo que carregava passos,...
Poético demais, lindo! Vou usar.
Parabéns!

12 de setembro de 2009 às 23:02
Ana Dietrich disse...

ficou linda a nova foto... bem mais a sua "cara". O brinco em clave de sol é o toque de diva... rsrs
bjs e como vai a bahia?

18 de setembro de 2009 às 08:47

Postar um comentário

Seja educado. Comentários de teor ofensivo serão deletados.