terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Crônica Antropofágica

Bar ContemporARTES










...palavras on the rocks, bacos e apolos, poetas e prosadores, anjos e demônios fazem encontros marcados para essa conversa de bar virtual. Sempre às 3a. feiras no ContemporARTES







Causou de certo dia eu me ver conversando com uma bela papoula quando me veio como um raio cego e sem luz o pensamento sombrio de arrancar do solo com violência minha interlocutora. Coisa horrenda, homem horrendo sou eu, preferi afastar de mim mais uma vez os pensamentos de homicídio e prosseguir com o caloroso debate.

Caríssima, perguntei alegre, por que és capaz de provocar aos homens o sentimento da alegria mesmo nos momentos de tristeza? Já neste momento parecia eu mesmo estar inspirando o ar saturado de alucinógenos, mas toquei em frente a conversa, era interessante. Ora, respondeu-me bem-humorada, como se sua gargalhada fizesse a minha dançar, eu amo o ser humano como nenhum outro seu igual é capaz de amar. Amo, amo, amo, várias vezes e sempre mais, como uma noiva que corre até o altar pedindo logo ao vigário que apresse o momento do “aceito” para que tudo se consume em um alto bolo e em uma longa noite de núpcias...



Assustei-me, claro, a cor-de-rosa petalada era demais inconseqüente, e também o era eu, conversar com uma flor hilariante era algo hilário por si só. Via-me triste em vários momentos do passado, momentos em que estive sozinho e choroso sem sequer conhecer as maravilhas da minha amiga e amante, fonte de alegrias... Quase matei-me, oh esposa cruel entorpecente, por tua ausência nas noites chuvosas! Agora ri-se em minha frente, despreocupada, e faz-me rir, como se eu fosse feliz?! Faz-me soltar gaitadas como uma ave, impregnando-me com a essência do riso, iludindo-me com idéias inatas de uma vida com sentido?!

Mato-te agora então, Desdêmona, antes que me transformes de Otelo em escravo de Moria e de escravo de Moria em filho do Hades, eu mesmo assumo o papel do Mefistófeles, e malvisto arranco-te e como-te, sem ter sequer em minhas mãos uma gota de sangue!


Foi o que fiz. Cansado de conversar com a pequena, degluti-a, um canibal que voraz devora sua amante após o himeneu. Piscou diante dos meus olhos o Universo, e abri a boca em risos tão altos que eram capazes de engolir toda a cidade e ensurdecer todo o ouvido animal. Cores de laranja meio-azeda cheiravam o áspero ainda atordoante da enxaqueca lacrimosa, já eu viajava novamente em tapetes de açúcar antigo, mastigando as pétalas púrpuras da papoula pressionada contra o palato, o paladar perdendo-se pouco-a-pouco nos devaneios da mente que atingia a velocidade da luz.

Ali adormeci, no meio da praça, estava realmente mal. Mas estava sorrindo.


Nascido em Curitiba a 03/08/1992 (Leão, asc. Peixes, lun. Libra), Thiago E. Luzzi Galvão passou a interessar-se pela literatura ao ter contato com “O Alienista” de Machado de Assis. Aos 13 anos, participou da primeira antologia de poemas, publicada pelo Colégio Militar de Curitiba, onde estudava. Ao final de 2008, transferiu-se para Araraquara, interior do estado de São Paulo, onde começou a concorrer em concursos literários; por um imprevisto, nova mudança de cidade se deu em Julho de 2009, mês no qual passou a residir na capital do estado. O interesse profundo por Filosofia, Sociologia e Psicologia não se afastou em nenhum momento do apreço pelo estilo literário, formando uniões estáveis de modo que as áreas sejam sempre influentes na construção de seus textos.

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