terça-feira, 16 de março de 2010

O TAPETE MÁGICO


Hoje é um daqueles dias que acordei com a alma pequena. A imensidão da noite infinita quase sufocou-me. Não fosse a melodia das maritacas lembrando-me adolescentes felizes, eu continuaria deitada. A fuga é dormir, procurar no mundo dos sonhos o pote de ouro no fim do arco-íris.Acordada, procuro no mundo dos homens o pote de esperança a cada dia.Mas só encontro solidão. Pessoas vivendo em mundos pessoais onde impera o egoísmo acima do bem-comum. Nesses dias, dentro de mim cai uma nevasca que congela sentidos e cobre a paisagem. A vida transforma-se em filme em preto e branco e as pessoas caminham em slow motion. Os pensamentos ecoam tão alto no vazio da desumanidade, que a dor dilacera meus versos. Apesar das lágrimas de neve, buscarei algo.Não sei o que, nem onde.

Já passei da idade em que sufocamos as mágoas com compras inúteis. Será que se me aproximar da felicidade alheia serei contagiada, como por um sarampo inoportuno? Saio em busca de bom tempo.Meu refúgio são os livros, as pessoas de papel e letras.Entro em uma livraria e observo as pessoas solitárias. Concentradas em livros, não estão tristes. Caminho pelas vielas cheias de desconhecidos. Sinto o frio londrino do ar condicionado.
Percebo que o silêncio é diferente do silêncio em minha vida. Presto atenção e escuto crianças na área infantil.De repente, uma gargalhada depois de um eletrônico “múúú”.Fecho os olhos e sinto o calor de uma fogueira e cheiro de café quente. Passeio entre os departamentos, como se estivesse viajando por terras antigas. Um índio, sentado em uma poltrona, gargalha com textos de Arnaldo Jabor. Em pé, a idosa molha um livro de Lygia Telles com líquida emoção. Sim, estou viajando além da minha ilha, onde tão sozinha vivo. Decido escolher obras literárias diversas. A dois não existe solidão nem desesperança. O livro, o companheiro, o amigo, aquece minhas mãos com imagens e acaricia meu coração com exemplos imortalizados de Gandhi, Mandela, Thereza de Calcutá.
Sobre o tapete mágico sobrevoo o vazio que amanheceu em mim. Hoje, anoitecerei nas alturas macias e verterei lágrimas novamente, mas serão por Capitu. Adormecerei segurando as mãos de Pablo Neruda, sussurrando lindos poemas para mim e voarei por um céu iluminado por boas almas.


Simone Pedersen, escritora, morou onze anos no exterior onde teve vivência multicultural e conheceu diferentes estilos linguísticos.Desde essa época já escrevia crônicas para os amigos sobre a diversidade que vivenciava. Atualmente reside no interior de São Paulo e, há dois anos, participa ativamente de concursos literários, tendo conquistado inúmeros prêmios no Brasil e no exterior.Tem textos publicados em dezenas de antologias de contos, crônicas e poesias. É colunista do Folha de Vinhedo.



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