segunda-feira, 3 de maio de 2010

Apresentando ANAIR WEIRICH


 
QUEM É A SACOLEIRA DOS SONHOS

                 por Marilda Confortin

Durante a infância pobre no interior de Santa Catarina, no início da década de sessenta, Anair  Weirich,  já encarava os palcos improvisados nas escolas e no coreto da praça recitando poemas nas datas comemorativas da pequena cidade de Chapecó.

Na adolescência, mesmo sem nunca ter assistido a um show, já que não tinha televisão em sua casa, a loirinha Anair, se vestia de Wanderléia e divertia os amigos, cantando “...Essa é uma prova de fogo, você vai dizer se gosta de mim”.

A desinibição, a vocação artística, o gosto pela poesia, a alegria e a habilidade com as palavras, foram completamente abafadas na fase adulta, ao casar-se com um homem que não permitia que sua esposa, “exibisse suas emoções por aí”. Por muito tempo, desempenhou o papel da mulher submissa que só servia para lavar roupas, criar filhos, aceitar as bebedeiras e maus tratos do marido, ser traída e sufocar todos os seus sonhos e sentimentos.

Um dia, encorajou-se e interrompeu o caminho do suicídio. Pegou seus dois filhos e abandonou a casa. Começou tudo de novo. Para sustentar a família, passou a vender produtos de beleza e potinhos de plástico de casa em casa. Para conquistar as clientes, Anair recitava poesias de amor e motivacionais.

Como a estratégia de venda estava dando certo, a empresa de perfumaria patrocinou seu primeiro livro de poesias. Com o lucro, Anair produziu mais um livro, depois outro e mais outro.

Naquele tempo, os textos de auto-ajuda ainda não estavam em moda. Mas, a história da Anair e sua determinação em sobreviver da poesia, por si só já era uma poesia motivacional. A clientela feminina daquela época, composta na maioria por donas de casa, adorava seus textos eróticos, seus poemas de amor em linguagem simples e coloquial e suas mensagens que elevavam a auto-estima feminina. Percebendo esse mercado,  Anair  deixou de oferecer produtos que embelezavam só o rosto. Passou a oferecer produtos que embelezavam principalmente a alma. Além dos livros, produziu artesanalmente vários tipos de recipientes que continham poesias e mensagens motivacionais em seu interior. Verdadeiros mimos como por exemplo: potinhos de vidro decorados, caixinhas de fósforo,  cestinhos de poesia, livrinhos em formato de pacote de presente, etc.

LIMIAR DO TEMPO

“Amar é...
Te encontrar, como agora.
Só que na velhice, de bengala,
E ainda assim, sentir a mesma emoção
Que estou sentindo nessa hora!


Colocava tudo em sua enorme mala, pegava um ônibus e viajava pelo sul do Brasil, vendendo seus produtos poéticos de porta em porta. No retorno, trazia muitos livros usados que ganhava, comprava ou trocava pelos seus.

Casou-se novamente e Cláudio passou ajudá-la, incentivando-a como escritora e até investiu no negócio, abrindo um sebo chamado Panacéia, que atualmente é gerenciado pela filha Deny. A palavra uniu a família novamente.

Com uma ajudinha de um famoso apresentador de televisão, Anair ficou conhecida como “sacoleira dos sonhos” por percorrer diariamente as estradas do sul do Brasil recitando poesias e oferecendo livros em escolas, creches, teatros, universidades, postos de gasolina, livrarias, papelarias, banquinhas, mercados, açougues, fila de banco, fila de ônibus e onde lhe desse na telha. 

Essa mulher já publicou 23 livros, tem outros cinco no prelo, participou de mais de 20 antologias, seu pequenino livro “Mensagens para um dia melhor” vendeu mais de 80 mil exemplares que somados aos demais livros de sua autoria, atinge a fabulosa marca de  cento e cinqüenta mil exemplares vendidos de porta em porta por esse Brasil afora.

Tinha tudo para dar errado: pobreza, descriminação, falta de oportunidade de estudo, solidão, abandono, mas ela deu a volta por cima. Perguntei  à Anair:


PC- Afinal, você abriu os olhos e encarou a vida, ou você fechou os olhos e mergulhou?  Ela me respondeu assim:

AW- Bom, eu mergulhei de olhos fechados, confiando no instinto. Quando voltei à  superfície, abri meus olhos, respirei fundo e percebi que queria mergulhar outra vez. Gostei de viver perigosamente. 

PC- Você escreve livros que valorizam o otimismo, a perseverança, a esperança. Você se considera uma escritora de auto-ajuda?  Como você encara as críticas dos que dizem que auto-ajuda não é poesia?

- Eu divido minha literatura assim: Tenho os livros do coração, que escrevo por puro prazer. São os livros de poesia. Esses não vendem quase nada porque as pessoas preferem ler romances e auto ajuda.  E tenho os livros que dão o sustento do corpo e da alma, que são os motivacionais.  Amo a poesia mas sou muito grata aos meus livros de mensagens, pois eles sustentam minha família, fazem bem às pessoas e eu me emociono cada vez que alguém me diz o quanto eles lhe fazem bem.

LEMA DE VIDA

Topas ir ao topo?
Mas tem que ser
Escolado em escalar!
Tem que ter tenacidade
Como escopo...
Ninguém chega ao topo
Sem suar!




PC- A emocionante história da Anair, está registrada no livro “Como consegui” que logo, logo  estará nas bancas. Li uma primeira versão e lembro de uma história onde você foi confundida com uma vendedora de livros e pediram para você se retirar do local. Isso continua acontecendo? Como você reage?

AW- Esse livro mudou de título. Agora chama-se: A VENDEDORA DE LIVROS. Na verdade é o que eu sou: Uma vendedora de livros. Assumi.  Ser a própria autora ajuda, mas o que adianta ser autora, se não consigo vender? Por isso, me tornei uma boa vendedora. Resisti muito à esse título,  mas acabei aceitando. Minha estratégia e minha arma de sedução são os diferenciais:  Ao oferecer meus livros, eu recito uma poesia.  Quando os olhos brilham emocionados, eu sei que conquistei meu cliente e plantei a semente da leitura. É claro que tem muito coração duro, que não se comove com nada.

Outro diferencial que conquista em meus livros, são os marcadores de páginas ecológicos, que se transformam em bijuterias de pescoço artesanais, feitos pelo meu marido. E também perfumo meus livros com óleo de rosas. É uma delícia ver como eles se surpreendem e cheiram, cheiram e cheiram! Esses atrativos conquistam o público e tornam meu trabalho mais emocionante, um delicioso desafio.

Em SC eu represento autores catarinenses, mas, vendo em maior quantidade mesmo os  meus livros, pois as pessoas se sensibilizam ao ver o próprio autor oferecendo seu produto. Cria um laço entre o escritor e o leitor. E olhe que tem muito café no bule escondido em gavetas e armários, é de cortar o coração. Eu ofereço, faço minha parte, mas..., tenho pena desses autores que não sabem vender e nem têm uma editora ou distribuidora trabalhando por eles. Deveria existir um incentivo bem maior por parte do governo para os pequenos autores. É dolorido chegar nas bibliotecas e livrarias e ver um percentual bem maior de livros estrangeiros ou que a grande mídia promove, na maioria traduções, enquanto os escritores locais ficam cada vez mais anônimos. Deveria existir uma cooperativa de pequenos autores e uma mídia que os promovesse. Os vendedores acham bem mais fácil oferecer o que já está bem divulgado, que não precisa de convencimento. Eles não se dão ao trabalho de ler para saber do que se trata o livro.  

PC- Anair teve um livro inteiro que foi “pirateado”. Ela conta como isso aconteceu: 

AW-  Foi assim: No ano 2000, mandei imprimir numa gráfica do Rio Grande do Sul,  dez mil exemplares do meu livro “Mensagem para um dia melhor”. A gráfica entregou-se a encomenda e  imprimiu por conta, sem a minha autorização, mais uma quantidade que não consegui determinar e colocou nas livrarias por um preço bem menor do que eu paguei para imprimir. Abri um processo contra a gráfica. Mas na hora de testemunhar a meu favor, os próprios livreiros que me avisaram que isso estava acontecendo, caíram fora, argumentando que não poderiam deixar suas livrarias para ir testemunhar, que teriam despesas de viagem, alimentação e hospedagem, que não queriam se expor, que eles já tinham feito muito em me avisar. E a corda arrebentou do lado mais fraco: o meu.

Mas em tudo se tira uma lição. Se essa gráfica não tivesse feito isso, eu não teria criado o “Livro Lúdico das Cores”. Foi um livro gerado na hora da raiva, da indignação. Eu sabia que tinha que criar algo diferente. Hoje é o carro chefe dos meus livros. Cada vez que o pego nas mãos, um sentimento de gratidão muito grande me invade, pois é dele que vem tudo que precisamos e permite que possamos viajar e conhecer tantos lugares diferentes daqui do sul, enquanto trabalhamos.  

PC- A escritora Anair ministra palestras, oficinas e recitais em escolas. Sua poesia infantil é muito bem aceita nesse meio: 


PACIÊNCIA

Quem já viu algo funcionar
aos tapas e empurrões?
Nada mesmo dá certo,
quando é feito aos trambolhões!

Mas, se formos com jeitinho,
(como diz sempre a ciência...)
com amor e com carinho
tudo conseguiremos!

- Isso se chama PACIENCIA!

(do livro infantil Doce Jeito de Ser Criança)


A EMOÇÃO DE LER

- Passarinho, passarinho!
Eu também queria voar
E conhecer outros mundos...
Mas não tenho asas, nem dinheiro.

-Menininho, menininho!
Você deixe de bobagem.
Quem lê viaja ao mundo inteiro,
Sem ter que pagar passagem.



PC- Falando sobre a literatura catarinense, Anair desabafou: 

AW- Falta incentivo, sim, e muito! Existe uma lei chamada Cocali, que está só no papel, e quando funciona, é pra meia dúzia de uma panelinha que existe na capital.

Tem muita gente boa na nossa terra. A Urda Alice Klüeger, por exemplo, historiadora e romancista, é a escritora de maior projeção de SC, teve muitos livros adotados para o vestibular catarinense e paulista e mesmo assim, em algumas escolas os professores dizem que nunca leram nada dela.

Tem o Norberto Pontel, de Planalto SC, que é um romancista cujos temas são os “sem terra”. São romances que mostram como é o lado de lá, cheios de emoção. Pontel é tão bom no que escreve, que até eu, que condeno invasões de terra, acabo me comovendo com a vida e a história dessa gente.

Tem o Afonso Martini, que escreveu A FAVELA ENCANTADA, eleito o “Romance do Ano 2008” pela Academia Catarinense de Letras.

 O  Miguel Russowsky, de Joaçaba, é o sonetista mais premiado do Brasil, mas poucas pessoas sabem disso.

Eu fico indignada com a falta de divulgação dos autores catarinenses! Mas também vibro de alegria, quando algo acontece de bom.. Um prêmio ou uma homenagem são comemorados com festa! E choro quando perdemos alguns deles, como o Reinaldo Corona, poeta de Chapecó, e o Miguel, citado à pouco.




AMIGOS
 
Amigos vêm e vão.   
Amigos são uma nação
de corações leais.
Amigos são demais!
Amigos são trigos ao sol.
São cama e lençol
para deitar-se tranqüilo.
Amigos são aquilo
de tudo o que contas.
Amigos são contas
de um colar de diamantes.
São vogais e consoantes
do alfabeto do amor.
Amigos são abrigos
da maldade e da dor.
São a segurança das pontes,
e a água das fontes!
Amigos são artigos de luxo.
Amigos são bruxos
da distância e do tempo.
Amigos são o elemento
que conta na hora H...
Amigos são maná!
São faróis no nevoeiro.
São arco e arqueiro
na precisão do alvo.
Amigos estão a salvo
das tempestades da vida.
Amigos são guarida
nas horas incautas.
Amigos são flautas
que anunciam companheirismo.
Amigos são o muro seguro
que nos protege do abismo.

(Do livro Melodias do Coração 2008)


Para conhecer mais sobre Anair Weirich,  comprar seus livros ou fazer contato, acesse o site: www.literaturacatarinense.com.br e seu blog: http://anairweirich.blogspot.com/

Ilustrações: foto da poeta Anair Weirich; foto de declamação na E. E. professor Giovani Trentini em Rio dos Cedros - SC; foto de sessão de autógrafos na E.E. Tancredo Neves em Chapecó - SC e foto da capa do livro "Estrela Mensageira".
Altair de Oliveira (poesia.comentada@gmail.com), poeta, escreve às segundas-feiras no ContemporARTES. Contará com a colaboração de Marilda Confortin (Sul),  Rodolpho Saraiva (RJ / Leste) e Patrícia Amaral (SP/Centro Sul).
 

5 comentários:

NEIDA ROCHA disse...

Querida Anair...
És uma batalhadora.
Admiro tua garra.
Venha tomar um café comigo em Canoas/RS.
Neida Rocha
(Escritora e Poetisa)

3 de maio de 2010 às 18:56
Altair de Oliveira disse...

Marilda, é muito muito interessante esta tua matéria! Esta poeta Anair deve ser uma figurinha e tanto! Uma grande guerreira que, com criatividade, perseverança e poesia vai empurrando a nave da vida! E parece que ela faz um trabalho valioso para a formação de leitores por onde passa, que benza-a Deus! Parabéns, Anair! Quem tem emoção bonita tem que mostrar mesmo, ué!!!

3 de maio de 2010 às 18:56
marilda disse...

Sim, a Anair é uma guerreira. Admiro-a como pessoa e como escritora. As vezes, me canso de ir a uma escola da periferia da minha cidade para falar sobre poesia e fico com raiva quando me criticam... daí penso nela que faz isso todos os dias, percorrendo todo o sul do Brasil, recebendo criticas, nem sempre sendo bem recebida.
Devemos muito à esses escritores que lavram pessoalmente o duro solo da palavra e plantam a semente da leitura.

4 de maio de 2010 às 16:31
Rosana disse...

Quando ouço como é difícil entender poesia, gostaria de ter almas como a de Anair, ao meu lado e apresentá-la, heis poesia.
Parabéns, Altair e Marilda por dividir esta prosa em versos conosco -,leitores.

8 de maio de 2010 às 20:26
Anônimo disse...

Bom, Marilda como ninguém sabe conduzir uma entrevista Com um toque de jornalista e uma grande sensibilidade de poeta Marilda descreve a trajetória de Anair com perfeição. Anair é tudo isso que Marilda diz e mais um pouco.

Claudio

15 de maio de 2010 às 22:04

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