Sou ou não sou? Eis a questão!
Por Yone Ramos Marques de Oliveira
Em 2008, Katy Perry fez grande sucesso nas paradas com um clipe super divertido sobre um caso de amor bipolar. A música "Hot n Cold" conta a história de um homem que muda de humor constantemente e nunca sabe o que quer: não sabe se vai, se fica, se casa, se termina, enfim, um transtorno para a vida da garota. Pois é, não é só a famosa que sofre com esses problemas: aposto que você, leitor, está dando risada e pensando " é, conheço alguém assim!". E confesso, eu conheço muitas pessoas assim!!! Daí, surgiu a idéia: por que não levar aos leitores um pouquinho de loucura para agitar os neurônios desse sábado?!
Ousadamente vou afirmar que, se no período Romântico, o mal do século era a depressão, o mal da nossa sociedade é a bipolaridade: até o tempo se tornou bipolar. Brincadeiras a parte, estou falando não apenas de uma realidade social como de uma estimativa para as próximas décadas. Em dados divulgados na Primeira Cúpula de Saúde Mental realizada na Grécia em 2009, a OMS (Organização Mundial da Saúde) estimou que a depressão será a doença mais comum a nível mundial até 2030, pois, enquanto as doenças fisiológicas são superadas através de tratamentos medicamentais e tecnologia, as doenças mentais resultantes da conjectura social urbanizada tendem a aumentar, principalmente para as pessoas de baixa renda. Enquanto muitas cidades rurais nem mesmo possuem clínicas psiquiátricas, o aumento considerável de clínicas nos centros urbanos indica que estamos falando de um colapso psíquico social ligado ao capital.
Isso significa dizer que, a sociedade globalizada ao dinamizar as atividades cotidianas em prol das relações comerciais e mercadológicas, prejudica as funções fisiológicas do ser humano e as relações sociais, e acaba por oferecer, no âmbito de saúde mental, uma vida estressante e propícia ao desenvolvimento de transtornos mentais relacionados à ansiedade, depressão, bipolaridade e outros.
Segundo uma Pesquisa Clínica no Brasil por Marco Antônio Zago, atualmente 30% da população adulta no Brasil têm prevalência aproximada de transtornos mentais. A mesma pesquisa aponta através do índice YLD (Year Lost for Disabilities) que 5 entre as 10 condições de maior incapacidade do mundo, são devidas a transtornos mentais. Ainda, conforme dados da OMS, aproximadamente 450 milhões de pessoas sofrem de transtornos mentais variados em todo o mundo hoje. Haja medicamento e clínica psiquiátrica!
Mas, há muito que se pensar a respeito dessas pesquisas e dos dados citados: conviver com uma pessoa bipolar é uma tarefa difícil e que requer muita habilidade. Na vida real, além da dificuldade de convivência, é muito difícil distinguir até que ponto uma pessoa com mudanças constantes de humor é mentalmente doente e necessita de acompanhamento médico, e até que ponto estamos falando de personalidade e da reação comum do ser humano às adversidades encontradas na vida. Existem vários tipos de depressão, dentre elas a monopolar (termo usual) e a bipolar (termo técnico). A bipolar é a depressão que intercala momentos de mania e hipomania com momentos de depressão. Mania e hipomania são quadros de euforia, alegria demasiada, mania de grandeza etc. Daí, minha escolha pela bipolaridade e não pela depressão. Por que, quem já leu o brilhantíssimo texto de Machado de Assis, "O Alienista", e que provavelmente morreu de rir, há de convir que o escritor fazia uma crítica à sociedade emergente (propriamente burguesa) que cria suas próprias regras e suas próprias loucuras. Daí, podemos seguir para uma conclusão textual.
De fato, quando a OMS se pronunciou sobre o assunto, ela demonstrou uma preocupação acima de tudo, econômica: pois os problemas mentais não só acarretarão redução na produção como também dimanarão dos governos altos investimentos em medicamentos e tratamentos para a população. Uma preocupação mercadológica, claro! Hoje, qualquer pessoa que passe em clínica psiquiátrica, mesmo que por esporte, sairá de lá com um medicamento, seja um calmante a base de ervas, seja um tarja preta controlado pelo governo. Isso por quê o mundo globalizado não pode parar: e você não pode sofrer a perda de um filho, você não pode odiar seu ex marido, você não pode ficar estressado por problemas financeiros. Se você sente essas coisas, você sofre de algum transtorno mental, então você é um louco! Sem contar que, sua doença mental é super lucrativa, uma consulta com psiquiatra está em torno de R$200,00 e muitos medicamentos estão pela mesma faixa de preço.
Já reivindicava a Pitty na música "Admirável Chip Novo": quem não sente nada é robô (novas tecnologias: sem comentários). Para a sociedade globalizada, os sentimentos humanos naturais são prejudiciais ao mercado e daí essa esquizofrenia social de classificar todo mundo como doentes mentais. Todo mundo passa por “bipolaridades” na vida, que são reações ao mundo externo, porém o que antigamente era considerado naturalmente pós traumático, hoje é considerado como uma doença, ainda que pós traumática.
Alto lá: não somos robôs e as emoções fazem parte do ser humano, até o desespero. O que diferencia um doente de uma pessoa com problemas naturais é a compulsividade e obsessão, e isso é algo que a sociedade precisa se conscientizar antes que todos parem no hospício. Deve ser considerado doente mental aquele que se apresenta como uma ameaça real à sociedade, e real que eu digo não é deixar de produzir, mas é quando uma pessoa pode ferir inconseqüentemente outras pessoas ou se torna incapaz da convivência em grupo, porque convenhamos: de gênio e louco, todo mundo tem um pouco!
Yone Ramos Marques de Oliveira, teóloga e historiadora, escreve aos sábados, quinzenalmente no ContemporARTES.
Yone Ramos Marques de Oliveira, teóloga e historiadora, escreve aos sábados, quinzenalmente no ContemporARTES.
5 comentários:
Belo texto,PARABÉNS - vejo que você continua "antenada" no mundo das idéias e que os "papos no metrô" (pós aulas), continuam fresco, legal afrotupiniquim!!!
5 de junho de 2010 às 15:13Campos
muito bem, yone, vc. conseguiu traduzir angústias da vida moderna, coisas que o coração sente, mas a boca não comenta. adorei as fotos e o bom humor. Vc. é mto boa nisso, continue... nada como rirmos de nós mesmos.
5 de junho de 2010 às 22:11bjs
Obrigada, quem já teve um caso de amor bipolar vai se identificar muito rs... mas: ces't la vie! Kkkkkk! Apesar que, as pressões cotidianas enlouquecem qualquer um, quem sou eu pra julgar?! O mais importante é sempre estar em busca da superação pessoal! Faz parte, faz parte rsrs...
6 de junho de 2010 às 12:36Lembrou-me de duas "frases de taverna" que eu curto:
6 de junho de 2010 às 12:40"Agora chamamos solidão de depressão, e remédio de tarja preta é um amigão"
"De gênio e de louco, todo mundo tem um porco"
Yone, seu texto é maravilhoso. Poxa, adorei ler um artigo falando de coisas complicadas de uma forma simples, sem deixar a seriedade da questão de lado, isso é maturidade emocional! rsrsrsrs, brincadeiras a parte, é reconfortante saber que podemos falar de loucura de um jeito leve. Parabéns! =)
7 de julho de 2010 às 12:35Postar um comentário
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