quarta-feira, 27 de outubro de 2010

O dengo que a nega tem


   
Hoje trazemos a colaboração de Vanessa Deguti, uma reflexão sobre a música O dengo que a nega tem. A análise foi feita durante as atividades do seminário Vozes da Globalização, módulo Reinventando Afroidentidades que se realiza aos sábados na Casa da Palavra de Santo André. No dia 9 de outubro eu e Cícero Barbosa Jr. proferimos a palestra Teu cabelo não nega: a representação da mulher negra na canção brasileira na qual houve uma oficina de interpretação de letras e música de canções da MPB relacionadas ao assunto. Vanessa sistematizou as atividades de seu grupo e traz ao Contemporartes o que se esconde atrás da linguagem afetiva e carinhosa (o tal dengo) que trata da mulher negra brasileira em canções populares.


O Dengo Que A Nega Tem


Compositor: Dorival Caymmi
É dengo, é dengo, é dengo, meu bem
É dengo que nega tem
Tem dengo no remelexo, meu bem
Tem dengo no falar também


Quando se diz que no falar tem dengo
Tem dengo, tem dengo, tem dengo tem
Quando se diz que no andar tem dengo
Tem dengo, tem dengo, tem dengo tem
Quando se diz que no sorrir tem dengo
Tem dengo, tem dengo, tem dengo tem
Quando se diz que no sambar tem dengo
Tem dengo, tem dengo, tem dengo tem

É dengo, é dengo, é dengo, meu bem
É dengo que nega tem
Tem dengo no remelexo, meu bem
Tem dengo no falar também

Quando se diz que no bulir tem dengo
Tem dengo, tem dengo, tem dengo tem
Quando se diz que no cantar tem dengo
Tem dengo, tem dengo, tem dengo tem
Quando se diz que no olhar tem dengo
Tem dengo, tem dengo, tem dengo tem

É no mexido, é no descanso, é no balanço
É no jeitinho requebrado que essa nega tem
Que todo mundo fica enfeitiçado
E atrás do dengo dessa nega todo mundo vem
E atrás do dengo dessa nega todo mundo vem




Nega, remelexo e preconceito
por Vanessa Deguti
      A mulher carrega valores na sua imagem definida pelo sexo. Tais valores são atribuídos pela sociedade desde épocas remotas. Podemos citar como exemplo, a bíblia que logo na introdução denota a surgimento da humanidade na terra como consequência do ato de uma mulher sobre o homem causando a expulsão do Paraíso.
         Nas épocas coloniais do Brasil, a negra, de teve que suportar duplamente a sua carga de sobrevivência:  por ser escrava e por ser mulher. Ou seja, além dos maus tratos em consequência da sua cor, sofria também o estigma sexual feminino que carregava.
         Retomando esses valores atribuídos às mulheres, a música “O dengo que a nega tem” denota em seus versos não a mulher intangível e virtuosa, mas ‘aquela’ cheia de dengo “no remelexo”, “no mexido”, “no balanço”, sobretudo a mulher negra, a “nega” como já se mostra desde o título. Observando também que “dengo” é uma palavra vinda do africano, especificamente do quimbundo.
         A música se inicia com o verso “É dengo, é dengo, é dengo, meu bem”, após a repetição da música do “é dengo”, que é uma afirmação ressaltada pela repetição, a frase termina com a expressão “meu bem” que pode ser interpretada de forma coloquial. Porém é interessante observar que “meu” é pronome possessivo e “bem” tem carga ambígua. A expressão pode ser tratar do advérbio de modo “bem” que denota algo de modo bom, virtude ou como o substantivo de ‘benefício’.
          Estando ligado diretamente ao pronome de posse e à ideia de que se trata de uma mulher negra,  pode também ser interpretado como ideia de “bem material” o subordinado da posse, ideia que não se distancia do contexto histórico explorado a partir da letra da música.
          A descrição da ‘nega’ expõe não sua interioridade ou intelectualidade, mas seu “remelexo” “mexido” “balanço” “jeitinho requebrado que essa nega tem”. Tal denotação traz a imagem lasciva da mulher negra, justificando o a sedução que ela causa.
          Característica atribuída ao ‘feitiço’ próprio da mulher, da ‘bruxa’, conceito dado pela sociedade à mulher por séculos que é reforçado no verso “Que todo mundo fica enfeitiçado”. Fato que historicamente foi usado como pretexto para abuso de muitas e muitas mulheres.
          Dado esse exemplo, vemos então que além da influência africana na construção sonora e rítmica, a Música Popular Brasileira carrega também essa história nas composições de suas letras.

Vanessa Deguti é estudante de Letras da Fundação Santo André prestes a se formar, ministra voluntariamente oficina sobre concepção musical através da sensibilidade por meio de contextos históricos e culturais na ELD, participou da ELL, e às vezes aparece em alguns fanzines e workshops referentes à expressão corporal.








Veja as próximas palestras do Módulo Reinventando Afroidentidades do Seminário Vozes da Globalização.

Realização: Prefeitura Municipal de Santo André.
Apoio  - ASSOCIAÇÃO CULTURAL MORRO DO QUEROSENE
Aos sábados - das 10h30 às 12h30
Casa da Palavra - 4992-7218
Praça do Carmo, 171, Santo André

Uma série de oito palestras que propõe a discussão da afroidentidade na contemporaneidade e sua interface na Literatura, na História nas Artes Plásticas e na Música. Especialistas - professores universitários e literatos - farão incursões sobre grandes problemáticas atuais, propondo uma reavaliação das representações do negro. A participação é aberta a todos. As palestras são independentes, apesar de versarem sobre temáticas semelhantes. A entrada é franca, e cada palestra dá direito a um certificado de horas culturais.

Palestra - Narrativas infantis africanas na literatura
Dia 06/11 - (sábado) das 10h30 às 12h30
Palestrante: Kiusam Oliveira


Palestra - Alternativas do escritor colonizado:
A escrita à serviço das identidades nas literaturas angolana e moçambicana
Dia 27/11 - (sábado) das 10h30 às 12h30
Palestrante: Cristiane Santana


Palestra – Solistas dissonantes: história de cantoras negras
Dia 04/12 - (sábado) das 10h30 às 12h30
Palestrante: Ricardo Santhiago


Palestra – A representação do negro no modernismo brasileiro
Dia 11/12 - (sábado) das 10h30 às 12h30
Palestrante: Renato Gilioli


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Outros assuntos:

Já estão abertas as inscrições
O evento ocorrerá entre os dias 24 e 26 de novembro de 2010, com organização do Centro Acadêmico de História.
Nota enviada pelo editor-assistente da Contemporâneos - Revista de Artes e Humanidades Antonio Gasparetto - que participa da  Comissão de Comunicação do Centro Acadêmico de História

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Ampliadas até 8 de novembro as inscrições para o simpósio acima, organizado pelo Programa de Mestrado em História da Universidade Severino Sombra (Vassouras, RJ) que se realizará nos dias 1, 2 e 3 de dezembro de 2010 na USS – Vassouras – RJ.

Mais informações pelo site: http://www.uss.br/web/page/simposiopol.asp

Junto a Rosângela Dias e Katia Peixoto (colunista da Contemporartes) estarei coordenando um Simpósio Temático sobre Cinema.


1. Cinema e História: discussões de linguagens historiográficas
Coordenação:
Katia Peixoto dos Santos (PUC-SP)
Rosangela de Oliveira Dias (USS)
Ana Maria Dietrich (UFABC/USS)
Inaugurada por Marc Ferro na década de 60, a intersecção entre as duas áreas de conhecimento Cinema e História será objeto de reflexão desse seminário temático. Pretendemos agregar pesquisas que explorem os questionamentos teóricos e metodológicos que demandam dessa discussão interdisciplinar, assim como conhecer os atuais estudos que privilegiam a análise de imagens audio-visuais e/ou a linguagem cinematográfica. O cinema enquanto narrativa específica elaborada como resultado da composição de diversos elementos fílmicos e polissêmica ao utilizar o som e a imagem também serão foco de análise.

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Encontram-se abertas as inscrições de comunicações de pesquisa. O seminário  se realizar entre os dias 30/11 e 02/12/2010 nas dependências do Instituto de Ciências Humanas da Universidade Federal de Juiz de Fora.
Serão aceitas inscrições referentes a resultados de pesquisas de pós-graduação concluídas ou em andamento, bem como resultados de projetos de iniciação científica.
PERÍODO DE INSCRIÇÕES PARA PARTICIPANTES COM APRESENTAÇÃO DE TRABALHO: 10/10 a 30/10/2010
TAXA DE INSCRIÇÃO PARA PARTICIPANTES COM APRESENTAÇÃO DE TRABALHO: R$25,00
OBSERVAÇÕES:
O pagamento poderá ser feito através de depósito bancário ou pessoalmente na Secretaria do Programa de Pós-Graduação em História (ICH – Campus da UFJF).
Caso a comunicação proposta não seja aprovada, o valor da taxa de inscrição pago não será devolvido.
O resultado dos trabalhos aceitos será divulgado no dia 20/11/2010.
MAIORES INFORMAÇÕES:
            Secretaria do Programa de Pós-Graduação em História da UFJF
            Telefone: (32) 2102-3129
Nota enviada pelo editor-assistente da Contemporâneos - Revista de Artes e Humanidades Antonio Gasparetto - que participa da  Comissão de Comunicação do Centro Acadêmico de História.



Ana Maria Dietrich é coordenadora junto a Vinicius Rennó, da Contemporartes-Revista de Difusão Cultural.
contemporartes@gmail.com

1 comentários:

Unknown disse...

Ótimo, muito bom mesmo !! Suas publicações como sempre brilhantes !! Te adoro...

27 de outubro de 2010 às 10:25

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