terça-feira, 26 de outubro de 2010

O ladrão do tempo




Por todos os cantos escuto pessoas reclamando sobre o quanto o ano passou rapidamente. Eu, entre elas, não entendo como estamos já encontrando novembro na virada da esquina.Alguns esotéricos dizem que o universo está em uma rotação diferente e que deveria haver um novo relógio. Não sei dessas coisas, só sei da minha luta diária para dar conta de tudo o que tenho por fazer. Procuro o tempo perdido e percebo que muitas vezes sou eu quem o oferece ao ladrão, que não entra pela janela usando máscaras e luvas. Ele vive na minha casa. Eu o convidei quando me apresentaram à modernidade. São tantas tentações tecnológicas e informativas hoje em dia, que se Eva vivesse agora, teria surtado e jogado a maçã na cara da serpente, dizendo que a maça que lhe dava prazer era um Apple iMac, iPhone ou  iPod Touch. Diria a Adão que estava apaixonada por Steve Jobs. Além do mais, ela nem confiaria na serpente, pois uma rápida pesquisa no Google lhe traria informações sobre o caráter da  reptilia. Sem confiar totalmente nas informações limitadas da internet, ela leria inúmeros livros:”As consequências de comer maçãs”, “Os tipos existentes de maçãs”, “Como superar a vontade de comer maçãs”, “Depressão em quem não come maçãs”, “Coma a maçã e seja feliz”, além de entrar em uma comunidade de relacionamento virtual intitulada “ EU ODEIO AMAR MAÇAS”. Depois de saciar a fome devorando informações, Eva faria uma videoconferência com as amigas para discutir o assunto. Seria convidada para dar entrevistas a jornais e revistas. Alguma jornalista feminista levantaria a questão da culpa do Adão pela obsessão de Eva por maçãs, evidentemente carência afetiva, algum advogado seria convidado para esclarecer a Eva as questões mais importantes em caso de separação do companheiro e divisão das árvores do Pomar do Éden, um psiquiatra ofereceria remédios para Eva não ter mais fome nem lembrar o que é uma maça, além de terapia para resolver o conflito com a serpente. Por fim, Eva chegaria a conclusão que a fome exagerada a tornara obesa quando substituiu a maça por hambúrguer com coca-cola e faria algumas plásticas redutoras, morrendo por infecção hospitalar causada por uma super bactéria que ataca quem não come maças. Como eu não sou Eva, tento apenas identificar onde se esconde o meu tempo. Percebo que a tecnologia é a maior culpada,consumir tanta modernidade custa tempo. É preciso estar antenado, mas é impossível assimilarmos o tsunami de informações que a internet nos oferece, os livros que são lançados, os periódicos que circulam, utilizar todos os aparelhos ofertados e seus inúmeros recursos e ainda dar conta da manutenção e consertos. Somos nós que temos o poder de escolher se aceitamos ou não a entrada do ladrão do tempo em nossas vidas. Uma vez, um amigo me disse uma frase que ficou gravada: “Uma hora na frente do computador passa voando mas uma hora em uma quadra jogando tênis demora muito para passar”. Será que mudou a rotação do universo ou nós mudamos nossas escolhas?




Simone Pedersen, formada em direito, escritora,  morou onze anos no exterior onde teve vivência multicultural e conheceu diferentes estilos linguísticos.Desde essa época já escrevia crônicas para os amigos sobre  a diversidade que vivenciava. Atualmente reside no interior de São Paulo  e, há dois anos,  participa ativamente de concursos literários,  tendo conquistado inúmeros prêmios  no Brasil e no exterior.Tem textos publicados em dezenas de antologias de contos, crônicas e poesias. É colunista do Folha de Vinhedo. Seus livros  Infantis “Vila Felina”, “Sara e os óculos mágicos”, “Conde Van Pirado” e “Vila Encantada”, "Coleção Pá-pum" e Coleção Fuá" foram lançados na Bienal de SP 2010, sendo os últimos dois livros que ensinam a desenhar, foram ilustrados pelo renomado artista plástico Paulo Branco. Além de  “Fragmentos e Estilhaços” com contos, crônicas e poemas selecionados em concursos. Todos disponíveis na Livraria Cultura. Blog:http://www.simonealvespedersen.blogspot.com


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