Preconceito, xenofobia pós-eleições e torneio de gordas
Acontecimentos que marcaram o Brasil nas últimas semanas mostraram uma face obscura relacionada a nosso país. Preconceitos foram exacerbados, argumentos de extrema-direita utilizados. A máscara reacionária foi vestida por muitos brasileiros. O ponto que marcou o desvelar dessas ideias foram as eleições presidenciais. Logo depois da vitória de Dilma Roussef, primeira mulher eleita em nosso regime republicano e segunda mulher a ocupar o primeiro posto do governo depois da Princesa Izabel, observou-se uma onda de xenofobia na Rede de relacionamento Twitter com muitas postagens contra os nordestinos, algumas das quais se referiam ao Bolsa Família, acreditando que o programa governamental servia para os paulistas "sustentaram" a população nordestina que não trabalha.
Muitos brasileiros expressaram sua revolta por considerar que a vitória deveu-se ao fato de os eleitores do Nordeste terem votado em massa em Dilma. Brados de Morra nordestinos foram a tônica das postagens, que entre outras coisas, defendiam que São Paulo deveria se separar do restante do País. Foi até esboçado a organização de um movimento que nada deixa a desejar para movimentos políticos explicitamente racistas e segregadores, o Orgulho Paulista.
Defender publicamente essas ideias preconceituosas - e sites da internet são considerados publicações - significa perante nossa legislação, racismo - CRIME imprescritível e inafiançável. Mal avisadas, tais pessoas não esconderam seu ranço, mas rapidamente houve manisfestações que algumas delas poderiam pegar entre 2 a 5 anos de prisão. Algumas voltaram atrás, deleteram suas postagens ou pediram desculpas publicamente. Tarde demais, a ventilação de tais ideias gerou uma grande repercussão nacional e internacional.
O Ministério Público Federal está investigando o caso. A primeira pessoa passível de ser punida é a estudante de direito Mayara Petruso, que, segundo a OAB de Pernambuco, foi quem tudo começou.
Segundo o site do Yahoo:
"Vários usuários se manifestaram de forma ofensiva ao povo nordestino, mas, segundo a assessoria de imprensa da OAB-PE, a ação será concentrada em Mayara "porque foi ela quem começou". Dentre vários posts ofensivos, Mayara escreveu: "'Nordestisto' não é gente. Faça um favor a SP: mate um nordestino afogado" (sic) .
Caberá ao Ministério Público Federal investigar o caso, e decidir se Mayara é passível de punição. A garota será alvo de duas ações: uma por racismo e outra por "incitação pública ao ato delituoso". A primeira estipula pena de 2 a 5 anos de detenção, e a segunda, de 3 a 6 meses de reclusão ou multa. O crime de racismo é imprescritível e inafiançável".
Paralelamente, entre os dias 9 e 12 de outubro, a cidade interiorana de Araraquara (SP) promovia o InterUnesp 2010, jogos universitários. Segundo o site da Folha de São Paulo, o evento que foi anunciado como o maior do país do gênero esportivo e cultural, reuniu 15 mil universitários de 23 campi da Unesp. O InterUnesp nada lembrou do histórico de luta do movimento estudantil no País, que teve movimentos expressivos principalmente na luta contra o regime autoritário da Ditadura Militar (1964-1984). Atos muito desabonadores foram realizados, por exemplo, o chamado Bundão de Franca, que nada mais é do que meninas que se enfileiram nas arquibancadas, viram de costas e baixam as calças ou levantam as saias e ficam rebolando para a plateia mostrando suas calcinhas. Um papel lastimável para nossas jovens mulheres estudantes.
Mas, esse ano tais manifestações foram mais longe. Foi criado o torneio das gordas, promovido pelo orkut com inscrições e premiações. A ideia do torneio era premiar quem conseguisse ficar mais tempo domando garotas obesas presentes no evento, tal qual se faz com cavalos e touros em torneios. A violência gratuita contra mulheres e mulheres obsesas foi considerada por muitos uma espécie de bullying, mas os organizadores classificaram o torneio como mera "brincadeira". Lembramos que desculpas semelhantes são sempre usadas quando se quer desabonar, desvalorizar grupos identitários como mulheres, negros, homossexuais. O humor muitas vezes expresso por piadas é uma violência sutil mas intensa que se faz correntemente.
Também sobre esse episódio pipocaram manifestações contra seus autores e também indagações, se nossos jovens universitários, que em tese seriam um grupo bastante esclarecido da população, defendem ideias como essa, onde podemos parar?
Acredito que esses sinais de fumaça significam áreas de sombra na nossa jovem democracia. Refletir sobre eles e tomar medidas justas de punição contra os culpados seria o melhor caminho. Tais acontecimentos mostram que o exercício da verdadeira cidadania é algo que deve ser pensado com toda a seriedade no rol de nossas políticas públicas. Ainda temos um longo caminho pela frente.
Saiba mais
Site Diga não a Xenofobia
Sobre bullying ver artigo na Contemporâneos - Revista de Artes e Humanidades
Do espetáculo à rotina, o terror e suas faces de Emílio de Andrade et. al.
Ana Maria Dietrich, historiadora, é coordenadora da Contemporartes. Suas pesquisas atuais versam sobre os temas Nazismo, Memória, Racismo e Preconceito.
Muitos brasileiros expressaram sua revolta por considerar que a vitória deveu-se ao fato de os eleitores do Nordeste terem votado em massa em Dilma. Brados de Morra nordestinos foram a tônica das postagens, que entre outras coisas, defendiam que São Paulo deveria se separar do restante do País. Foi até esboçado a organização de um movimento que nada deixa a desejar para movimentos políticos explicitamente racistas e segregadores, o Orgulho Paulista.
Defender publicamente essas ideias preconceituosas - e sites da internet são considerados publicações - significa perante nossa legislação, racismo - CRIME imprescritível e inafiançável. Mal avisadas, tais pessoas não esconderam seu ranço, mas rapidamente houve manisfestações que algumas delas poderiam pegar entre 2 a 5 anos de prisão. Algumas voltaram atrás, deleteram suas postagens ou pediram desculpas publicamente. Tarde demais, a ventilação de tais ideias gerou uma grande repercussão nacional e internacional.
O Ministério Público Federal está investigando o caso. A primeira pessoa passível de ser punida é a estudante de direito Mayara Petruso, que, segundo a OAB de Pernambuco, foi quem tudo começou.
Segundo o site do Yahoo:
"Vários usuários se manifestaram de forma ofensiva ao povo nordestino, mas, segundo a assessoria de imprensa da OAB-PE, a ação será concentrada em Mayara "porque foi ela quem começou". Dentre vários posts ofensivos, Mayara escreveu: "'Nordestisto' não é gente. Faça um favor a SP: mate um nordestino afogado" (sic) .
Caberá ao Ministério Público Federal investigar o caso, e decidir se Mayara é passível de punição. A garota será alvo de duas ações: uma por racismo e outra por "incitação pública ao ato delituoso". A primeira estipula pena de 2 a 5 anos de detenção, e a segunda, de 3 a 6 meses de reclusão ou multa. O crime de racismo é imprescritível e inafiançável".
Paralelamente, entre os dias 9 e 12 de outubro, a cidade interiorana de Araraquara (SP) promovia o InterUnesp 2010, jogos universitários. Segundo o site da Folha de São Paulo, o evento que foi anunciado como o maior do país do gênero esportivo e cultural, reuniu 15 mil universitários de 23 campi da Unesp. O InterUnesp nada lembrou do histórico de luta do movimento estudantil no País, que teve movimentos expressivos principalmente na luta contra o regime autoritário da Ditadura Militar (1964-1984). Atos muito desabonadores foram realizados, por exemplo, o chamado Bundão de Franca, que nada mais é do que meninas que se enfileiram nas arquibancadas, viram de costas e baixam as calças ou levantam as saias e ficam rebolando para a plateia mostrando suas calcinhas. Um papel lastimável para nossas jovens mulheres estudantes.
Mas, esse ano tais manifestações foram mais longe. Foi criado o torneio das gordas, promovido pelo orkut com inscrições e premiações. A ideia do torneio era premiar quem conseguisse ficar mais tempo domando garotas obesas presentes no evento, tal qual se faz com cavalos e touros em torneios. A violência gratuita contra mulheres e mulheres obsesas foi considerada por muitos uma espécie de bullying, mas os organizadores classificaram o torneio como mera "brincadeira". Lembramos que desculpas semelhantes são sempre usadas quando se quer desabonar, desvalorizar grupos identitários como mulheres, negros, homossexuais. O humor muitas vezes expresso por piadas é uma violência sutil mas intensa que se faz correntemente.
Também sobre esse episódio pipocaram manifestações contra seus autores e também indagações, se nossos jovens universitários, que em tese seriam um grupo bastante esclarecido da população, defendem ideias como essa, onde podemos parar?
Acredito que esses sinais de fumaça significam áreas de sombra na nossa jovem democracia. Refletir sobre eles e tomar medidas justas de punição contra os culpados seria o melhor caminho. Tais acontecimentos mostram que o exercício da verdadeira cidadania é algo que deve ser pensado com toda a seriedade no rol de nossas políticas públicas. Ainda temos um longo caminho pela frente.
Saiba mais
Site Diga não a Xenofobia
Sobre bullying ver artigo na Contemporâneos - Revista de Artes e Humanidades
Do espetáculo à rotina, o terror e suas faces de Emílio de Andrade et. al.
Ana Maria Dietrich, historiadora, é coordenadora da Contemporartes. Suas pesquisas atuais versam sobre os temas Nazismo, Memória, Racismo e Preconceito.
2 comentários:
Há algum tempo estudei Hannah Arendt e aprendi algumas coisas essenciais que também dão sentido à minha vida.
10 de novembro de 2010 às 13:34O que mais me fez pensar sobre nossa existência humana foi sua forma de tratar a questão da identidade.
De uma forma bem simples, uma de suas defesas ideológicas, é de que "eu apenas existo quando me vejo no outro". Algo bem próximo daquele mandamento cristão "amai ao próximo como a ti mesmo".
Quando vejo tais manifestações de preconceitos, no primeiro momento fico revoltada, com vontade de fazer com que essas pessoas sejam literalmente colocadas no lugar daquelas que ofenderam.
E depois fico me questionando como algumas pessoas ainda não entenderem o que significa viver em sociedade...
É tão mínimo o esforço que precisamos fazer antes de dizer certas coisas. Basta pensar! Pensar como ser humano! Pensar com as próprias capacidades! Pensar que alguns conceitos ou melhor preconceitos devem ser questionados!
O pensamento parece uma coisa a toa, mas é quando se pode imaginar como reagiria ou se sentiria se sofresse determinadas ofensas.
Nos dias de hoje não precisamos sofrer calados as violências sofridas. Conquistamos, inclusive, leis que defendem os direitos da minoria (os grupos sociais que sofrem algum tipo de exclusão).
E também por isso é melhor pensar bem antes de proferir palavras que comprovam excesso de "liberdade" e falta de respeito com o "outro". Porque se o Estado e a Justiça hoje atendem e entendem tais necessidades, é sinal que a própria sociedade as exigiu.
Pensem meus caros amigos. É uma atividade gratificante.
Identifiquem-se com seu próximo. Ser brasileiro é o mais puro exemplo de que somos diversos iguais, o que apenas enriquece nossa cultura.
isso é lamentável Ana, infelizmente é verdade.. importante é mostrar que existem pessoas como nós que não concordam com isso! um grande bjo e parabéns!
11 de novembro de 2010 às 11:12Postar um comentário
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