terça-feira, 17 de maio de 2011

O outro e eu mesmo



Assisti na TV que existem no Brasil 27 mil Josés Pereira da Silva e que destes 813 tem mães chamadas Maria José da Silva. A reportagem explicava que o levantamento existe por causa da previdência social, que precisa certificar-se da existência real de seus beneficiados. Em caso de homônimos a previdência usa para diferenciar o nome da mãe.

Impossível não ouvir a reportagem, pelo menos impossível para quem estuda literatura brasileira, e não se recordar do início do auto de natal pernambucano: “Morte e vida Severina”, de João Cabal de Melo Neto. Eu, entretanto, lembrei-me também de um episódio bem particular, pessoal. Afinal, onde se encontrar outro Abilio ou outro Pacheco, outro Abilio Pacheco então...

Mas tem, e não tão poucos como eu pensara. Fui advertido por uma aluna quando eu lecionava na Escola Tenente Rego Barros. Uma aluna da sétima série. Quando cheguei à sala no primeiro dia de aula e fui me apresentar, a menina espigoita já havia dado uma googada no meu nome e foi emendando os “abilio pachecos” que ela encontrou na web. Eu ainda não tinha um site pessoal, mas não foi difícil para ela reconhecer qual era o “abilio pacheco” que entraria em sala. Não repito todos aqui, pois não vou privar o leitor da curiosidade e do trabalho de ir também ao Google (se o desejar, é claro!) e lá encontrar um rol de homônimos meus.

Um deles eu já conhecia de nome. Opa! Conhecer de nome é estranho. Digamos que um deles eu já havia dado de acordo que existia. E confesso que tive dificuldade de assimilar que aquele que eu via na TV tinha o mesmo nome que eu. Devia me sentir como as crianças que ao se depararem com alguém com o mesmo nome demoram a aceitar que isso seja possível.

Eu ainda morava em Marabá e cursava o mestrado em Belém. Colocava sempre a televisão para despertar por volta das cinco e meia. Assim eu poderia acordar bem cedo para ler, estudar e – raramente no hotel – escrever. Não sei precisar quanto tempo depois da televisão ligada, ele apareceu num programa sobre agricultura. Sei bem que ainda deitado, em vigília, eu ouvi: “Abilio Pacheco, da Embrapa, nos fala mais sobre...”.

“Abilio Pacheco”!? Saí dos lençóis, pus pés ágeis no chão, erguido cruzei os braços e fiquei olhando para aquele que não era eu, mas tinha meu nome. Ora, mal havia saído do sono. Estava letárgico e o Abilio Pacheco, pesquisador da Embrapa, nem de longe se parecia com o que eu via no espelho, nem de longe falava de literatura e estava explicando algo sobre cuidados com solo e plantis – temas que, confesso, não me agradam ou nem me atraem.

Quando lancei meu mosaico primevo fiquei com vontade de saber o endereço dele e para lhe mandar um exemplar autografado: “de Abilio Pacheco para Abilio Pacheco”, mas não encontrei, talvez não tenha me empenhado muito nisso. Ano retrassado quando Rui Baiano entrevistou-me na feira do livro, por ocasião do lançamento dos três volumes da Antologia Literária Cidade (vídeo) e do meu Riscos no Barro, fui ao youtube procurar pelas entrevistas e lá encontrei meu xará novamente falando sobre Silvicultura.

Existem outros episódios interessantes entre eu e os outros “abilios pachecos” ou apenas entre eu e algum outro Abilio. Ainda bem que estou longe 27 mil Josés Pereira da Silva o que reduz quase a zero a possibilidade de ter um homônimo com mães homônimas. Pelo menos nisso sei que não terei problemas com Previdência.


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