domingo, 18 de setembro de 2011

Ficção e realidade: a arte como representação da vida



“A boa ficção tem mais peso do que a modesta realidade”. A frase dita por Maria Luíza de Queiroz (1998), irmã da escritora Rachel de Queiroz, mostra-se muito significativa para a literatura, pois nos faz refletir sobre a linha divisória entre a realidade e a arte.

Seria possível separar, absolutamente, dois elementos tão entrelaçados, tão dependentes um do outro? Seria possível conceber a arte sem que houvesse experiências reais, concretas? Ou melhor, haveria a possibilidade de entender a origem do processo de criação literária, sem considerar a própria realidade?

Se considerarmos o fato de que a literatura possui a inconfundível função de exprimir condições de alegria, de indignação, certezas e dúvidas do homem diante do mundo e da realidade que o cerca, veremos que as experiências reais se confundem e se misturam, num processo de criação e descoberta da própria vida. É assim em Eça de Queiroz, com seus personagens (ainda que fictícios) constituídos de tantos caracteres reais, como as ambições, o desejo, a vulnerabilidade, a vingança; assim como é também recorrente em Jorge Amado, Erico Veríssimo e tantos outros escritores que, consagrados ou não (apoiados ou não), souberam utilizar elementos das mazelas sociais, para transformá-los em matéria de conhecimento, em objeto de valor (ou não), dependendo dos olhos de quem lê.

A relação entre a linguagem e o mundo, ora dura, ríspida, concreta, ora suave, sensível, fluída, mostra-nos o quanto é pequena a distância que separa as coisas, da própria palavra. E a literatura, enquanto representação do real, fornece ao leitor não um retrato fiel e idêntico daquilo que lhe é corriqueiro, mas a possibilidade de, a partir do comum, transformar-se em múltiplos significados.

Deveríamos, então, enquanto leitores que somos, degustar a literatura para entendermos a vida? Ou a própria vida é inspirada e baseada na arte?  É exatamente nesse jogo de avanços e recuos que a literatura se manifesta, em sua forma às vezes transcendente, às vezes radical. E digo radical, porque nem sempre a literatura vem para confirmar o conhecido; ela permite também, o confronto, o desajuste com aquilo que nos é naturalmente compartilhado.

Ao mesmo tempo em que cola o homem às coisas, diminuindo o espaço entre o nome e o objeto nomeado, a literatura dá a medida do artificial e do provisório da relação. Sugere o arbitrário da significação, a fragilidade da aliança e, no limite, a irredutibilidade de cada ser. É, pois, esta linguagem instauradora de realidades e fundante de sentidos a linguagem de que se tece a literatura (LAJOLO, 1985, p.37).


E, talvez, a frase iniciada por Maria Luíza de Queiroz (1998), seja mesmo muito significativa, porque remete ao verdadeiro caráter do objeto literário: o de considerar que aquilo que é vivido, costumeiramente, pode adquirir outros significados, e outras proporções de valores; tudo depende das experiências e das expectativas de quem lê. Se a vida imita a arte, não se sabe. O que se pode dizer é que, definitivamente, a arte se inspira na vida; não transmite nada, cria; não diz nada, sugere. E assim, o mundo da literatura, como o da própria linguagem, é o mundo da possibilidade.


Referência Bibliográfica

Blog Literatura em mente. Acesso em 11 de julho de 2011. Disponível em: http://literaturaemmente.blogspot.com/2010/04/literatura-nos-torna-mais-compreensivos.html.

LAJOLO, Marisa. O que é Literatura. Editora Brasiliense, 6ª edição. São Paulo-SP, 1985.

Revista CULT. Acesso em 11 de julho de 2011. Disponível em: http://revistacult.uol.com.br/home/2010/07/premio-sesc-de-literatura.

ZELMAR. Literatura Brasileira no século 21. Acesso em 11 de julho de 2011, disponível em: http://zelmar.blogspot.com/2010/04/literatura-brasileira-no-seculo-21.html







Thaís Fernanda da Silva é mestranda do Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal de Viçosa. Estuda feminismo e questões de gênero na Literatura.
E-mail: thaisfsilva@ymail.com




A Contemporartes agradece a publicação e avisa que seu espaço continua aberto para produções artísticas de seus leitores.

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