A Desguetificação da cultura Guei
Na primeira semana de novembro estarei no Rio de Janeiro participando do I Encontro FUNARTE de Políticas para as Artes, falarei sobre a cultura guei e , aqui, começo a esboçar algumas reflexões. Começo com uma frase que pode parecer polêmica: a cultura brasileira é heteronormativa. Para tentar esclarecer o adjetivo gostaria de lembrar das palavras de uma das principais referências dos estudos de gênero na contemporaneidade, Judith Butler. Para a autora norte-americana, por heteronormatividade entende-se a legitimação do modelo heterossexual como norma regulatória das relações sexuais e de gênero na sociedade ocidental contemporânea. A base para sua legitimação está na idéia de que a sexualidade é orientada por aspectos biológicos e, como conseqüência disso, a associação entre heterossexualidade e reprodução é concebida como natural e irremediável, como diz BUTLER. Segundo Miskolci, Professor da UFSCAR, a heteronormatividade expressa expectativas, obrigações e demandas sociais resultantes do pressuposto de uma heterossexualidade natural e compulsória.
Em outras palavras, a heteronormatividade é um conceito diferente de heterossexualidade. Uma das diferenças mais notáveis entre os dois termos é que a heteronormatividade não tem um conceito paralelo como ocorre com a heterossexualidade, a qual organiza a homossexualidade como seu oposto. Dado que a homossexualidade não pode jamais usufruir da correção tácita e invisível para a formação social da qual a heterossexualidade usufrui, não seria possível falar de “homonormatividade” no mesmo sentido.
Falar em cultura guei pode ser uma estratégia reducionista porque, quase sempre, acaba por revelar-se uma armadilha, correndo o risco de produzir e reproduzir discursos rasos e sem reflexão sobre o que se é feito. Mais arriscado ainda é associar Cultura guei somente à práticas guetificadas, como a de drag queens, gogo boys, homoerotismo e shows de transformismo. Evidentemente que tratam de expressões artísticas de relação imediata e significativa à Cultura guei, sim, mas não são seus únicos indicadores.
O sentido de Cultura não está relacionado somente à Arte. Muito menos significa somente conhecimento e superioridade sobre determinado assunto. O pensar sobre os significados de Cultura guei deve atravessar o conceito ampliado de Cultura e ser relacionado à realidade a qual estamos inseridos, para possivelmente, termos uma indicação de caminho para seu entendimento.
Djalma Thürler é Cientista da Arte (UFF-2000), Professor do Programa de Pós-Graduação Multidisciplinar em Cultura e Sociedade e Professor Adjunto do Instituto de Humanidades, Artes e Ciências da UFBA. Carioca, ator, Bacharel em Direção Teatral e Pesquisador Pleno do CULT (Centro de Estudos Multidisciplinares em Cultura). Atualmente desenvolve estágio de Pós-Doutorado intitulado “Cartografias do desejo e novas sexualidades: a dramaturgia brasileira contemporânea dos anos 90 e depois”.
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