A literatura da internet: a poesia de Rodrigo Damacena
Hoje, para nossa coluna, tencionei a trazer algo
contemporâneo, para que possamos verificar como anda a literatura nas suas faces
escondidas, isto é, trago um autor provindo de blogs. Pouco conhecido entre muitos, até por ser proveniente da internet, ele possui uma poesia de
extremo estilo e trabalha as palavras de forma cuidadosa.
Rodrigo Damacena é um goiano com seus “vinte e
poucos anos” – como já dizia a música que marca sua época – e professor na área
de Letras. Possui uma veia artística muito forte, o que fez com que seu blog, intitulado “Primeiro Gole”,
obtivesse um tom literário que poucos artistas contemporâneos, inclusive no meio
digital, conseguiram transpor.
É importante que não nos limitemos a busca de artistas,
e dar devidos valores àqueles que estão à margem do cânone, por razões
diversas. Se hoje existem meios de difundir a arte, por que não fazermos? Nos
apropriemos deles para que façamos arte!
Antonio era poeta,
Antonio era poeta,
Mas
há três meses não escrevia nada.
João
estava desempregado.
Luis
escreveu o poema “Desodorante”
E
postou em sua página na internet.
Antonio
culpava Maria,
Que
o abandonou depois de mais de três anos.
Maria
cansou de sustentar o poeta,
Que
para seu pai, não passava de um vagabundo.
João
continua desempregado.
Luis
conheceu Fernanda,
Mas
na verdade ela se chamava Catarina.
Catarina
não gostava de seu nome,
Mas
na internet podia ser qualquer pessoa.
Antonio
começou a beber, delirava ótimos versos,
Mas
andava deprimido demais para escrever.
João
saiu para procurar emprego.
Luis
publicou um poema de Neruda em seu novo blog,
E
assinou como se fosse seu.
Fernanda
estava completamente apaixonada,
Rabiscava
os versos de Luis em guardanapos.
"Saudade
é amar um passado que ainda não passou"
Antonio
já nem saia de casa, nem pensava em escrever mais,
Sem
dinheiro, começou a beber cachaça.
João
ainda não voltou, e continua sem emprego.
Luis
marcou um encontro com Fernanda,
Mas
achou Catarina feia.
Antonio
morreu aos 27 anos sem ter publicado nada,
Mas
querem fazer um filme de sua vida – morte?
Maria
casou-se novamente no mesmo dia que recebeu o inesperado seguro.
Foi
passar a lua de mel em Recife.
João
virou assaltante, e
Pela
primeira vez ganhou dois versos.
Luis
perdeu espaço para blogs de escritores anônimos.
Fernanda
agora se chama Valéria,
Mas
continua iludindo jovens internautas.
Desacordar
Me
estacionei num esquecimento
Numa
falta de trânsito,
Na
incerteza da dúvida,
Num
desquerer de tudo
Não
preciso mais acordar às seis
Mas
nem durmo
Nem
desacordo.
Soneto I para Teresa
Teresa é
o desejo de um gole,
O
primeiro gole
E todos os
outros possíveis!
E Teresa
é eufemismo,
De um
vazio da presença que falta
Ao meu
lado na fotografia,
Pois
Teresa não é só uma poesia,
Mas
Teresa poderia era ser só soneto,
Quem dera
Teresa ser só sonho,
Que acaba
quando se acorda, mas
Teresa
não termina quando eu acordo
Ela me
espera sexta-feira,
E me
arranha de longe,
E me
beija no sonho.
- E o Primeiro Gole resiste em
minha Teresa...
Primeiro Gole é fazer com que cada momento além de
único, além de novo, que seja SEMPRE!
Para
quem quer tomar mais um gole literário, acesse ao blog de Rodrigo Damacena: http://primeiro-gole.blogspot.com.br/
Renato Dering é escritor, mestrando em Letras (Estudos Literários) pela Universidade Federal de Viçosa (UFV), sendo graduado também em Letras (Português) pela Universidade Federal de Goiás (UFG). Realizou estágio como roteirista na TV UFG e em seu Trabalho de Conclusão de Curso, desenvolveu pesquisa acerca da contística brasileira e roteirização fílmica. Atualmente também pesquisa a Literatura e Cultura de massa. É idealizador e administrador do site EFFI, que divulga o cinema e conteúdos audiovisuais. Contato: renatodering@gmail.com | @rdering
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