segunda-feira, 14 de maio de 2012

Marianazinha




Hoje tomei a liberdade, ainda que não devida, ou indevidamente necessária, para trazer ao leitor algo diferente. Um pouco deste comovido colunista. Para reflexão, proponho o conto de minha autoria chamado "Marianazinha", ainda, trago para uma quadrinho de Calvin, para que possamos realizar o diálogo entre ambos os textos.

O conto, que surgiu de inúmeras impressões pessoais acerca do cuidado e dos desejos de cada indivíduo, tenta ponderar dois pontos em uma relação entre mãe e filha. A literatura nos permite que façamos essas considerações e que possamos perceber esses enlaces da vida.

O endereço eletrônico de meu blog pessoal, para quem quiser conhecer um pouco mais de meus textos, é renatodering.blogspot.com. O blog já existe há mais de 5 anos, e conta com muitos dos meus escritos.




MARIANAZINHA




Era a hora de jantar e Marianazinha não descia do quarto. A mãe, depois de chamar várias e várias vezes, perdeu a paciência. Onde estaria Marianazinha? A janta era a comida preferida dela, sopa de letrinhas. Cada letrinha com uma cor diferente, menos a cor verde, ela não gostava... sabia que era de legumes. Passava das nove horas, e nove horas era a hora da janta. Onde está Marianazinha?

Sua mãe gritava, e gritava, pela filha no pé da escada. Escada essa que Marianazinha sempre brincou como sendo a entrada da casa de princesa de filmes da Disney. Quando cresceu um pouco mais, desistiu dessa brincadeira. Cansava subir e descer as escadas sozinha. Uma coisa parecia certa, Marianazinha não parecia estar no quarto, ou não ouvia sua mãe gritar. Onde estará Marianazinha?

Cansada de gritar, sua mãe subiu as escadas para ir ao quarto ver o que acontecia com Marianazinha. Eram nove e dez, e nada de a filha vir jantar, como pode? Um passo, dois degraus. Dois passos quatro degraus. Três passos, cinco degraus. A escada nem era assim, de princesa... era a imaginação de Marianazinha que a fazia. Aliás, era a imaginação de Marianazinha que dava àquela casa um tom de azul celeste, misturado ao rosa claro, cor de edredon preferido da mãe meninazinha, não dela.

A porta do quarto estava entreaberta, não mais trancada. O quarto, intacto. Marianazinha ali não estava. Não jantaria em casa de novo, assim como não jantou noite passada, assim como não jantou semana passada, assim como não jantava há alguns anos. Marianazinha já era Mariana. E sua mãe, ainda era... bem... ela não tinha imaginação. Era muito limitada para Marianazinha, digo, Mariana.

Daqui uns tempos, quem sabe, Mariana não volte para casa. Quando a casa tiver mais degraus, talvez, ou a mente de sua mãe ter um pouco mais de espaço, para poder entender que Marianazinha agora era Mariana. Pode ser que Laura esteja mudando, hoje já se deu nome e sempre deixa a porta entreaberta, caso a filha volte. Amanhã poderá tirar o edredon rosa claro da cama... Só restaria os degraus... Laura precisa aprender a usar a imaginação e subir mais alguns.




Renato Dering é escritor, mestrando em Letras (Estudos Literários) pela Universidade Federal de Viçosa (UFV), sendo graduado também em Letras pela Universidade Federal de Goiás (UFG). Realizou estágio como roteirista na TV UFG e em seu Trabalho de Conclusão de Curso, desenvolveu pesquisa acerca da contística brasileira e roteirização fílmica. Atualmente também pesquisa a Literatura e Cultura de massa.
Contato: renatodering@gmail.com

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