ROBERT FRANK, O FOTÓGRAFO BEAT
“Robert Frank extraiu da América um poema triste diretamente para a película, cravando seu nome entre os grandes poetas trágicos do mundo”. (Jack Kerouac no prefácio da primeira edição do livro The Americans em 1959).
Fotografia e Sociologia nasceram quase ao mesmo tempo no século XIX, e embora percorrendo trajetórias distintas, têm grande relação entre si, pois a fotografia serviu de ferramenta de análise social desde cedo, nas mãos dos primeiros fotógrafos que construíram a sua história.
Temos Lee Frielander e Garry Winogrand que fotografaram comportamentos no espaço público como exemplos de fotógrafos que se dedicaram a abordar algumas das grandes questões da Sociologia, tratados nas obras de Georg Simmel e de Erving Goffman.
Também Robert Frank usou sua câmera no projeto de conhecimento da sociedade norte-americana, contribuindo para a visão “fraturada da sociedade americana”. Frank viajou pelos EUA entre 1955 e 1956, retratando as suas mais profundas contradições como discriminações raciais e desigualdades sócio-econômicas contrastando com os símbolos do patriotismo americano. Obviamente seu trabalho foi muito mal recebido pelos norte-americanos, já que colocava a nu as questões mais candentes da sua sociedade. Em seu projeto, o fotógrafo refletiu as influências dos trabalhos de Tocqueville, Margaret Mead e Ruth Benedict.
Filho de judeus, Frank nasceu em 1924 em Zurique, na Suíça. Seu pai se tornou sem pátria após a Primeira Guerra Mundial e teve de lutar para conseguir cidadania suíça para Robert e seu irmão, Mandred. Apesar da família estar em segurança durante a Segunda Guerra Mundial, a ameaça nazista afetou Frank profundamente — e seu interesse por fotografia nasceu da vontade de expressar este sentimento. Para escapar do foco em negócios característico de sua família, treinou com alguns fotógrafos e designers até criar seu primeiro livro de imagens feito à mão, 40 fotos (1946).
Um ano depois, Frank emigrou para os Estados Unidos. Foi morar em Nova Iorque, onde conseguiu um emprego como fotógrafo na Harper’s Bazaar, que logo deixou para viajar pelos continentes europeu e sul-americano. Retornou aos EUA em 1950, ano em que conheceu Edward Steichen participou da exposição coletiva 51 American Photographers no Museu de Arte Moderna de Nova Iorque (MoMA) e se casou com a artista Mary Frank (antes Mary Lockspeiser), com quem teve dois filhos, Andrea e Pablo.
Ainda que sua visão inicial da sociedade e da cultura norte-americana fosse otimista, sua perspectiva mudou quando entrou em confronto com o acelerado ritmo de vida do país — o que interpretou como uma valorização exagerada do dinheiro. Frustrado, também, com o controle exagerado dos editores sobre seu trabalho, ele passou a ver os Estados Unidos como um lugar triste e solitário, o que se tornou evidente em sua fotografia.
Permaneceu viajando, mudou-se com sua família para Paris por um breve período e, em 1953, começou a trabalhar como jornalista freelancer para revistas como Vogue, Fortune e McCall. Sua união com fotógrafos como Saul Leiter e Diane Arbus fez com que se tornasse parte do movimento de vanguarda que a curadora Jane Livingston classificaria como The New York School.
Permaneceu viajando, mudou-se com sua família para Paris por um breve período e, em 1953, começou a trabalhar como jornalista freelancer para revistas como Vogue, Fortune e McCall. Sua união com fotógrafos como Saul Leiter e Diane Arbus fez com que se tornasse parte do movimento de vanguarda que a curadora Jane Livingston classificaria como The New York School.
Em 1955, sob influência do fotógrafo americano Walker Evans, que registrou os efeitos da Grande Depressão de 1929 no país, Frank conseguiu uma bolsa para viajar pelos Estados Unidos e fotografar todos os estratos de sua sociedade. Visitou cidades como Detroit, Miami, Reno, Utah e Chicago, quase sempre acompanhado de sua família. Ao longo de dois anos, e sempre de carro, tirou mais de 28 mil fotos. Oitenta e três delas foram selecionados para The Americans.
Com a publicação, Frank se tornou um dos principais artistas visuais a documentar a cultura Beat. No retorno a Nova Iorque, conheceu Kerouac e Allen Ginsberg, afinado com seu interesse em registrar as tensões entre o otimismo da década e a realidade norte-americana, cheia de contrastes como as diferenças entre classes e as tensões raciais. Frank captou essa ironia com imagens contrastadas e enquadramentos e focos pouco tradicionais.
Na época do lançamento da obra, Frank abandonou a fotografia para se concentrar em fazer vídeos. Em seu portfólio está o curta Pull My Daisy (1959), escrito e narrado por Kerouac e estrelado por Ginsberg e outros poetas. Seu filme mais famoso é Cocksucker Blues, um documentário sobre a turnê mundial dos Rolling Stones de 1972. Quando viu o resultado, Mick Jagger falou: “É um filme muito bom, Robert, mas se você mostrá-lo nos Estados Unidos, nunca mais vai poder entrar no país novamente”.
O fotógrafo e curador Jim Casper fez o seguinte comentário sobre a frase de Kerouac que abre a coluna desta semana: “O texto do mais icônico escritor da Geração Beat complementa perfeitamente as imagens, ainda que forte e poderoso, é triste e inocente, como o Jazz dos anos 1950.”
“É sempre a reação instantânea a si mesmo que produz uma fotografia.” (R.F.)
Referências:
Ferro, Lígia (2005), “Ao encontro da sociologia visual” in Sociologia, Revista da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, n.º 15, pp. 373-398.
Izabel Liviski é Fotógrafa e Professora, doutora em Sociologia pela UFPR. Pesquisadora de História da Arte, Sociologia da Imagem e da Cultura, e Linguagens Visuais. Escreve a coluna INcontros desde 2009 e é também co-editora da Revista ContemporArtes.
6 comentários:
A frase de Casper definiu muito bem o "espírito" norte-americano naquela época. Após da Grande Depressão, a Grande Guerra. Nos anos 50 o povo norte-americano ainda estava "lambendo as feridas". Tudo era Blue. As fotos acima refletem isso de forma admirável. Nenhuma mostra desgraça, ainda assim todas são profundamente tristes.
10 de maio de 2012 às 16:35Parabéns pelo texto.
Super bacana, parbens pelas fotos, pelo texto ...maravilhoso ...
10 de maio de 2012 às 17:16Parabens, sem comentario esta maravilhoso, que voce não esquece de nos isto sabemos, pois nos também não esquecemos de voce, lá se vão 20 anos, de pura amizade Beijos
10 de maio de 2012 às 21:49ATT:
Rubia
Adoro o seu trabalho, parabens!
11 de maio de 2012 às 18:37Mensagem recebida por e-mail:
12 de maio de 2012 às 15:03Gostei muito de ler o seu artigo, em especial da conjugação que fez entre texto e imagens.
Fico muito honrada pela citação de meu trabalho.
Parabéns pelo seu trabalho!
Atenciosamente,
Lígia Ferro
Mensagem recebida pelo Facebook:
13 de maio de 2012 às 03:28"Acabei de ler o seu artigo, gostei muito, bela união e conhecimento aprimorado de socio e foto." Luiz Domakosky.
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