sexta-feira, 22 de junho de 2012

Zuzu Angel: Breve reflexão sobre as manifestações socioculturais na Ditadura Militar



Dando continuidade aos textos escritos pelos alunos da disciplina Cultura Popular,  da Faculdade de Música da FAC FITO,  Michel Lima, arranjador e pianista, escreve sobre a vida de Zuzu Angel e de sua ligação com a música de Chico Buarque de Hollanda. 
Interessante notar que as observaçoes de Michel foram motivadas pelo filme biográfico de Sérgio Rezende,"Zuzu Angel", 2006. Segundo Michel, este filme o levou a  entender o conceito de engajamento musical, o desejo de alguns artistas de fazer música para pensar questões politicas e sociais, cantando alto e em bom-tom as dores e mazelas da nossa sociedade. Vamos ficar com a letra da música de Chico Buarque e o texto de Michel Lima. Boa leitura!

Cena do filme de Rezende
Cena do filme de Sérgio Rezende, "Zuzu Angel"
Quem é essa mulher / que canta sempre esse estribilho / só queria embalar meu filho / que mora na escuridão do mar / Quem é essa mulher / que canta sempre esse lamento / só queria lembrar o tormento / que fez o meu filho suspirar / Quem é essa mulher / que canta sempre o mesmo arranjo / só queria agasalhar meu anjo / e deixar seu corpo descansar / Quem é essa mulher / que canta como dobra um sino / queria cantar por meu menino / que ele já não pode mais cantar

“Angélica”, música que Chico Buarque compôs para a estilista Zuzu Angel um ano após sua morte.



Michel Lima¹

Essa é uma breve reflexão sobre a vida de uma mulher brasileira, que passou grande parte dos seus dias, em busca de respostas sobre o paradeiro de seu filho. (Zuleika Angel Jones).

Zuleika Angel Jones, mais conhecida como Zuzu Angel, (5 de junho de 1921 — Rio de Janeiro, 14 de abril de 1976) foi uma estilista brasileira,  mãe do militante político Stuart Angel Jones e da jornalista Hildegard Angel.  Nascida no interior de Minas Gerais mudou-se quando criança para Belo Horizonte, onde começou a costurar e criar modelos, fazendo roupas para sua família, mudando-se depois para a Bahia, onde passou a juventude. A cultura e cores desse Estado influenciaram significativamente o estilo das suas criações. Pioneira na moda brasileira fez sucesso com seu estilo em todo o mundo, principalmente nos Estados Unidos. Em uma das viagens a trabalho nos Estados Unidos conheceu o americano Norman Jones, com quem iniciou um relacionamento. Após alguns anos juntos, voltaram para o Rio de Janeiro e se casaram, mudando-se depois para Salvador, onde viveram muitos anos. Lá, Zuzu engravidou e deu à luz seu filho, chamado Stuart Edgar.
Zuzu Angel - foto de Zuzu 
Na virada dos anos de 1960 para os anos de 1970, Stuart Edgar, filho de Zuzu estudante de economia, passou a integrar as organizações que combatiam a ditadura militar instalada no país desde 1964, filiando-se ao MR-8, grupo guerrilheiro do Rio de Janeiro, que combatiam e confrontavam a ditadura. Preso em 14 de abril de 1971, Stuart foi torturado e morto pelo serviço de inteligência da Aeronáutica (CISA) no aeroporto do Galeão e dado como desaparecido pelas autoridades. A partir desse ponto Zuzu Angel entraria em guerra a procura de respostas sobre o paradeiro de seu filho, como sua arte havia sido exposta em muitos países, consequentemente criou-se um vínculo de amizade com várias personalidades artística da época, entre eles, Francisco Buarque de Hollanda,( Chico Buarque).


Zuzu Angel buscou sem cessar recursos para descobrir os assassinos de seu filho, inclusive na embaixada do Brasil nos Estados Unidos. A angústia e desespero de uma mãe ao perder o que Deus a concebeu de mais valioso o levará a tomar atitudes diante das leis brigando pelos seus direitos como cidadã, Zuzu Angel só queria ver o seu filho, ou, o enterra-lo não como indigente.
A busca sem sucesso a conduziria a escrever uma carta, onde relatava sua vida turbulenta, e uma frase nos chama atenção: "Se eu aparecer morta, por acidente ou outro meio, terá sido obra dos assassinos do meu amado filho". (frase retirada do filme: Zuzu Angel, 2006).
Essa carta foi entregue pela própria Zuzu Angel ao seu amigo Chico Buarque uma semana antes da sua morte.

A morte de Zuzu Angel em 1976 foi declarada acidental. Chico Buarque distribuiu 60 cópias da declaração de Zuzu a personalidades e imprensa. Nenhum jornal a publicou. Vinte e dois anos depois, a comissão dos mortos e desaparecidos políticos constituída pelo governo brasileiro, depois de uma perícia irrefutável e uma testemunha ocular, concluiu que Zuzu Angel foi assassinada. Em 1993 Hidelgard e Ana Cristina Angel fundaram o instituto Zuzu Angel para preservar a memória de Zuzu e Stuart. (Filme: Zuzu Angel, 2006).

Depois de sua morte, Zuzu foi homenageada em livros, música e filme. O mesmo Chico Buarque compôs, sobre melodia de Miltinho (MPB4), a música Angélica, em 1977, em homenagem à estilista. Em 1988, o escritor José Louzeiro escreveu o romance "Em carne viva", com personagens e situações que lembram o drama de Zuzu Angel.

Conclusão
“Essa história representa de fato a vida de diversas mulheres brasileiras que perderam seus filhos, talvez lutando por um futuro melhor, ou até mesmo assassinado, por uma “bala” perdida. Perdida? Sem rumo? Essa mãe brasileira que luta, trabalha leva o sustento para casa, ela é pai, ela é mãe, ela é da Silva, é de Oliveira, é dos Santos. Assim, segue sua humilde vida, agora segue sem o tormento, segue com o lamento... O lamento, de quem fez o seu filho suspirar...”
Michel Lima.


1- Michel Lima – Produtor Musical, pianista e arranjador, iniciou seus estudos aos 8 anos de idade tendo cursado o Conservatório Dramático e Musical de Tatuí e a Universidade Livre de Música de São Paulo, faz parte do corpo discente da Faculdade de Música FAC-FITO (Osasco). Atua na área acadêmica e fonográfica tendo atuações em produções do meio gospel e secular. Em todo seu trabalho destacamos a cantora Soraya Moraes com quem trabalhou durante 9 anos, tendo alcançado a premiação do Grammy Latino em 2008.
                                             (michellimapiano@gmail.com)


Kátia Peixoto é doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP. Mestre em Cinema pela ECA - USP onde realizou pesquisas em cinema italiano principalmente em Federico Fellini nas manifestações teatrais, clowns e mambembe de alguns de seus filmes. Fotógrafa por 6 anos do Jornal Argumento. Formada em piano e dança pelo Conservatório musical Villa Lobos. Atualmente leciona no Curso Superior de de Música da FAC-FITO e na UNIP nos Cursos de Comunicação e é integrante do grupo Adriana Rodrigues de Dança Flamenca sob a direção de Antônio Benega.

1 comentários:

Anônimo disse...

Parabéns Michel e Kátia por este trabalho. Tem certos acontecimentos que necessitam ser sempre lembrados para que nunca mais se repitam e nada como a genialidade e a sensibilidade do Chico para nos ajudar nesta tarefa.

25 de junho de 2012 às 23:58

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