sábado, 9 de junho de 2012

Fado Alexandrino

          


Olá, leitores! Esta semana terminei a leitura de um romance que achei sensacional. O nome de tal obra é Fado Alexandrino, de António Lobo Antunes. Em primeiro lugar, gostaria de sublinhar que sou fã deste grande romancista português contemporâneo e conheci-o através da leitura de As Naus. Depois vieram outros livros muito especiais.

No caso do Fado Alexandrino, o enredo trata de um grupo de ex-militares portugueses que se encontra anos após a Guerra Colonial contra as ex-colônias africanas e outros acontecimentos ligados à Revolução dos Cravos – responsável pela deposição da ditadura em Portugal – como também aos desdobramentos de tal insurreição. Há uma divisão da obra em três partes, o que a torna ainda mais interessante. A parte primeira é constituída pela lembrança dos ex-militares situando-a no período anterior à revolução e ainda durante a Guerra Colonial. Nesta parte, ficam patentes as dificuldades enfrentadas pelas pessoas que vivenciaram a guerra enquanto soldados e que não encontram explicações plausíveis para esta empreitada bélica. O que resta a todos é tentar manter-se vivo e, através das lembranças, surgem também reflexões sobre esse triste período da história lusitana.

A segunda parte da narrativa trata do período referente à Revolução dos Cravos, destacando todo sentimento utópico que os portugueses experimentaram após a queda do governo totalitário. Entremeado às lembranças dos militares, Lobo Antunes injeta o seu conhecido humor ácido, demonstrando que, desde o início da revolução, as personagens já percebiam os rumos que ela tomara, consequentemente, não haveria mudanças significativas no modo de governar. Passou-se à democracia, mas o poder continuou nas mãos dos que estavam antes à frente do Estado.

A terceira parte não deixa de destacar a permanência na gestão do Estado Lusitano de pessoas que não se preocupavam tanto com o país, senão consigo mesmas. Muitos fugiram de Portugal após a revolução, mas com a constatação de que o Socialismo havia derrocado, volveram à terra pátria para continuar suas vidas. Entretanto, se o governo não mudara radicalmente quanto era almejado por grande parte da população, as consequências que a revolução acarretou, como o retorno de aproximadamente 500 mil ex-colonos das ex-colônias em África , também outros problemas econômicos e sociais, agravaram as crises existentes e isso, leitores, pode ser observado ainda hoje, em pleno ano 2012 em que ao ligarmos a TV nos deparamos com notícias sobre a crise econômica que se agrava nos países da Península Ibérica como um todo.

António Lobo Antunes, muito perspicaz na narrativa, contribui significativamente para o ato de repensar-se a forma romance, uma vez que ele cria uma narrativa que não é linear, na qual as memórias passadas das personagens se misturam com o momento presente que estão a viver. Além disso, há outros traços formais, como um recuo maior no início do parágrafo, contar a história em flashes, incluindo  rememorações em meio a parágrafos que narram o presente, entre outros que vale a pena ler a obra atentando-se aos detalhes.

 Para aqueles que gostam de uma leitura que exige e instiga a irmos, aos poucos, desvendando a história, a narrativa lobo-antuniana é super recomendada. Vale ressaltar que, ao lado de José Saramago – o único ganhador do Prêmio Nobel de Literatura em Língua Portuguesa – António Lobo Antunes é considerado um dos grandes nomes do Romance Português Contemporâneo, como também de Língua Portuguesa.


Rodrigo C. M. Machado é mestrando em Letras, com ênfase em Estudos Literários, pela Universidade Federal de Viçosa. Dedica-se ao estudo da poesia portuguesa contemporânea, com destaque para a lírica de Sophia de Mello Breyner Andresen

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