domingo, 14 de outubro de 2012

Juventude: abdicastes da contracultura?

          



Rebeldes, politizados, reivindicadores, assim se expressava a representatividade da juventude dos anos 1960. Protestavam por uma cultura a nós forjada/ imposta sem nosso consentimento. Longe de se adequar as normativas vigentes estes jovens buscavam o protagonismo na luta política, negando os veículos de massas domesticados pela vida moderna. Juventude combativa, juventude bandida, juventude heroica, seja qual for os rótulos vinculados a ela, não podemos rejeitar sua importância na história, principalmente, no que se refere à busca pela mudança “do aqui e do agora”. Mas onde está essa juventude? Queremos senti-la, ouvi-la. Será que ainda existe a juventude com anseio de ultrapassar o materialismo e o racionalismo a qual fomos educados na vida moderna?

Talvez a resposta para tal indagação seja possível ao analisar os novos anseios modista e fúteis a qual nos deparamos na cultura capitalista - minha calça da Bilabong, meu tênis da Nicoboco, pulseirinha da Sun Rocha, minha minissaia da W.H, meu óculos da Lang House. Minhas contemporâneas ideologias de vida. Perguntam-se, minhas ideologias de vida? Sim. Intrínseco a essas marcas estão suas ideologias de vida, a ideologia consumista. Ideologia essa que promulga o ter em detrimento do ser. De tal forma, faz-se o atual “protagonismo” alienante a qual muitos jovens se ludibriam, muitas vezes, sem perceber.
Concordo com Carlos Drummond de Andrade (1984, p. 84-85) quando argumenta sermos o “Eu, etiqueta”. Vale a pena ouvir em suas próprias palavras:


Em minha calça está grudado um nome
Que não é meu de batismo ou de cartório
Um nome... estranho.
Meu blusão traz lembrete de bebida
Que jamais pus na boca, nessa vida,
Em minha camiseta, a marca de cigarro
Que não fumo, até hoje não fumei.
Minhas meias falam de produtos
Que nunca experimentei
Mas são comunicados a meus pés.
Meu tênis é proclama colorido
De alguma coisa não provada
Por este provador de longa idade.
Meu lenço, meu relógio, meu chaveiro,
Minha gravata e cinto e escova e pente,
Meu copo, minha xícara,
Minha toalha de banho e sabonete,
Meu isso, meu aquilo.
Desde a cabeça ao bico dos sapatos,
São mensagens,
Letras falantes,
Gritos visuais,
Ordens de uso, abuso, reincidências.
Costume, hábito, permência,
Indispensabilidade,
E fazem de mim homem-anúncio itinerante,
Escravo da matéria anunciada.
Estou, estou na moda.
É duro andar na moda, ainda que a moda
Seja negar minha identidade,
Trocá-la por mil, açambarcando
Todas as marcas registradas,
Todos os logotipos do mercado.
Com que inocência demito-me de ser
Eu que antes era e me sabia
Tão diverso de outros, tão mim mesmo,
Ser pensante sentinte e solitário
Com outros seres diversos e conscientes
De sua humana, invencível condição.
Agora sou anúncio
Ora vulgar ora bizarro.
Em língua nacional ou em qualquer língua
(Qualquer principalmente.)
E nisto me comparo, tiro glória
De minha anulação.
Não sou - vê lá - anúncio contratado.
Eu é que mimosamente pago
Para anunciar, para vender
Em bares festas praias pérgulas piscinas,
E bem à vista exibo esta etiqueta
Global no corpo que desiste
De ser veste e sandália de uma essência
Tão viva, independente,
Que moda ou suborno algum a compromete.
Onde terei jogado fora
Meu gosto e capacidade de escolher,
Minhas idiossincrasias tão pessoais,
Tão minhas que no rosto se espelhavam
E cada gesto, cada olhar
Cada vinco da roupa
Sou gravado de forma universal,
Saio da estamparia, não de casa,
Da vitrine me tiram, recolocam,
Objeto pulsante mas objeto
Que se oferece como signo dos outros
Objetos estáticos, tarifados.
Por me ostentar assim, tão orgulhoso
De ser não eu, mas artigo industrial,
Peço que meu nome retifiquem.
Já não me convém o título de homem.
Meu nome novo é Coisa.
Eu sou a Coisa, coisamente.


O que é ter identidade na cultura moderna? Identidade seria reproduzir ideologias sem ao menos entendê-las? Onde está nossa identidade?, Alienamo-nos na cultura moderna, onde reina a tecnocracia e, nos esquecemos de buscar por novos valores que supervalorize o homem como ser pensante, criativo, e não como uma máquina racional burocrática. É preciso repensar os conceitos, os valores. A busca por uma cultura alternativa, ou melhor, é preciso reafirmar o movimento de contracultura. Sejamos a voz do mundo. Vamos pensar o impensável.

Referências

 ANDRADE, Carlos Drummond. Corpo. Rio de Janeiro: Record, 1984.






Taysa Silva Santos é graduanda do Curso de Serviço Social da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia – UFRB. Integrante do Núcleo de Estudos e Pesquisas Gênero, Raça e Etnia e também do Grupo de Pesquisa NATUSS, Natureza, Trabalho, Ser Social e Serviço Social da mesma universidade.


A Contemporartes agradece a publicação e avisa que seu espaço continua aberto para produções artísticas de seus leitores.

1 comentários:

Taysa Santos disse...

Referência

BRANDÃO, Antônio Carlos; DUARTE, Milton Fernande. Movimentos Culturais de Juventude. São Paulo: Moderna, 2004.

15 de agosto de 2013 às 14:50

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