MADE IN OSAKA 2
Dando sequência à série que
apresenta “osaquenses” ilustres, nesta coluna gostaria de falar um pouco sobre
a vida e a obra de mais um cidadão “made in Osaka”. Como mencionei na última
coluna, trata-se do arquiteto Tadao Ando
(1941). No entanto, quando nos referimos aos arquitetos nipônicos, o primeiro
nome que nos ocorre é o do também “osaquense” Kenzo Tange (1913-2005), a quem,
por ser uma referência mundial, podemos considerar o “Oscar Niemeyer
japonês”. Duas trajetórias de vida e
estilos diferentes de arquitetura, mas com a mesma origem, Osaka.
No
caso de Ando san, as opiniões sobre a estética das suas obras (essencialmente
aço+concreto+vidro) divergem: alguns “entendidos” as acham sóbrias (feias?)
demais, outros as consideram funcionais, representantes do ethos nipônico,
em suas linhas, e apropriadas ao modus vivendi japonês. Estas
divergências, porém, não são o principal ponto que gostaria de apresentar, e sim
a interessante trajetória de vida de Ando san e como suas obras interagem no
universo urbano de Osaka. Para ser sincero, quando iniciei o rascunho desta
coluna havia visto, in loco, apenas uma obra de Ando san por aqui, o
Suntory Museum, inaugurado em 1994, próximo ao Kayukan (Aquário de Osaka, um
dos maiores do Japão). Não entramos no museu, pois nosso interesse era o
aquário, depois li que o museu havia encerrado suas atividades completamente em
dezembro de 2010. Triste, não? No interior da obra de Ando san, funcionavam,
além das galerias de arte, um
restaurante, um cinema e lojas. Na área de Tempozan (Baía de Osaka), a
estrutura cônica criada por Ando san perdeu sua funcionalidade, mas continua inspirando
arquitetos pela sua estética em forma de cone.
Aqui perto de
casa, na cidade de Ibaraki, encontra-se uma das obras icônicas de Ando
san, a “Igreja da Luz” ( jap. 茨木春日丘教会, ingl. Ibaraki
Kasugaoka Church), igreja protestante inaugurada em 1989. A obra pode ser
considerada uma representação ideal da estética do arquiteto japonês: sóbria,
funcional, retílinea, toda em concreto, uma igreja em forma de “caixa”. A
grande sacada é o “crucifixo” no altar, criado a partir de duas aberturas (ou
feixes) que se cruzam, possibilitando a entrada de luz natural, de modo a enformar
uma “cruz de luz”, o que resulta numa atmosfera muito mais de contemplação do
que celebração. A comparação dessa imagem com a de uma câmara escura (fotográfica)
é imediata! Uma pena que, para visitar a “Igreja da Luz”, deve-se marcar hora
com antecedência e preencher um formulário (chotto
mendokusai...), pois o local não é considerado “turístico”, mas sim um local de culto religioso.
No site sobre os ganhadores do
prêmio Pritzker, há uma breve e interessante autobiografia do arquiteto, onde
descobri que Ando san nunca se considerou um bom estudante, preferindo aprender
sozinho, observando e analisando as coisas que lhe interessavam, ao invés de
ficar assistindo a aulas. Na adolescência, desenvolveu suas habilidades em
carpintaria, trabalhou como motorista e foi aspirante a lutador de boxe
profissional, logo depois de terminar o ensino formal, aos dezoito anos. Nessa
mesma época, ele começou a visitar periodicamente casas de chá, templos
budistas e santuários xintoístas na área de Kansai, especialmente em Quioto e
Nara, analisando suas linhas tradicionais e lendo muito sobre arquitetura:
“During my school days I wasn’t a good student. I always preferred
learning things on my own outside of class. When I was about 18, I started to
visit temples, shrines and tea houses in Kyoto and Nara. There's a lot of great
traditional architecture in the area. I was studying architecture by going to
see actual building, and reading books about them.”
Um fato deveras interessante: o
jovem Ando descobriu, em um sebo no centro de Osaka, um livro sobre o arquiteto
francês (e gênio) Le Corbusier, após algum tempo economizando dinheiro para
comprar a tão desejada obra, Ando san devorou o opúsculo, que veio a se tornar
sua referência inicial e inspiração para seus futuros projetos. O
arquiteto assim se recorda destes anos de formação:
“I traced the drawings of his
early period so many times that all the pages turned black. In my mind, I quite
often wonder how Le Corbusier would have thought about this project or that.”
Movido por essa grande inspiração
europeia, pelo universo arquitetônico tradicional japonês e pelo desejo de ser
arquiteto, Ando san passou a fazer, por correspondência, cursos de desenho de
interiores e assistir a classes noturnas de desenho técnico, mas sem jamais
cursar uma universidade de Arquitetura. Juntou uma “grana” e foi para a Europa,
visitar in loco as obras que tanto
admirava e lhe serviam de inspiração. Em 1968 voltou ao Japão e, no ano
seguinte, abriu seu próprio escritório de arquitetura. O resto são histórias...
Ando san alcançou fama mundial
na década de 1990 ao receber o renomado prêmio Pritzker (1995), passando a
produzir obras fora do território japonês e a receber vários outros prêmios e
títulos. Alguns sites creditam o projeto (design) original da Skytree de Tóquio
- desde 2012 a mais alta torre do mundo - a Ando san; no
entanto, seu nome não aparece nos créditos finais da obra... Desde 2003 ele é
professor emérito da prestigiadíssima Universidade de Tóquio. Nada mal para
alguém que construiu sua carreira profissional fora dos muros da Academia, não?
Mata ne!! Até
mais!
Todas as imagens publicadas na coluna possuem direitos
autorais: Copyright ©2014AkitiDezem
Links
interessantes:
Rogerio
Akiti Dezem é professor visitante de língua portuguesa e
cultura brasileira da Universidade de Osaka, no Japão. Mestre em História
Social pela Universidade de São Paulo (USP), é autor de Matizes
do Amarelo - A gênese dos discursos sobre os orientais no Brasil (Humanitas,
2005) entre outros livros. Além da História, sua outra grande paixão é a Fotografia: http://akitidezemphotowalker.zenfolio.com/
0 comentários:
Postar um comentário
Seja educado. Comentários de teor ofensivo serão deletados.