quarta-feira, 23 de julho de 2014

A ARTE ZEN DE DANIEL ESCUDERO



“Sem sair de casa pode-se conhecer o mundo.
Sem olhar pela janela pode se ver o caminho do céu.
quanto mais longe se vai [se divaga] tanto menos se sabe.
Por isso, o Sábio:
Sem caminhar, alcança sua meta,  [sabe tudo]
Sem ver, tudo observa,
Sem agir, tudo realiza”. (Fragmento do poema 47 do TAO TE KING)

Na edição de hoje, trazemos a trajetória e o trabalho artístico de Daniel Escudero, sua pesquisa e a guinada radical em direção à pintura. Ao responder à nossa entrevista em suas falas abaixo, ladeando algumas imagens de sua autoria, é possível conhecer um pouco mais desse artista em plena ascensão. 

Atelier do artista, 2014

"Não tenho qualquer 'primeiro trabalho'. Da infância lembro de tia Maria me ensinando os primeiros desenhos e com poucas linhas fazia um gato, um rato, uma casa, como qualquer criança de 3 anos faz. Não faço ideia qual foi meu primeiro trabalho como profissional, até porque, desenho e pinto desde a infância até hoje.

Agora me sinto uma criança de três anos! (risos) Minha atividade não é trabalho, nem lazer, sem deixar de ser ambos.


Detalhe do trabalho em curso
A pintura é parte essencial na vida que me toca levar – é tão essencial que, não saberia dizer ao certo se vivo para ela, ou se ela me faz viver. Não afirmo que a amo, mas não paro de olhar para ela.

Indiretamente e sem ser o foco principal, termino pesquisando traduções de filosofia chinesa do século III a.C, especificamente Tao, que são a inspiração e o embasamento teórico da série de pinturas que desenvolvo agora em 2014.

A caligrafia chinesa me intimidou no começo, ainda não entrou formalmente no roteiro, mas não tenho como fugir dela. Suponho que a “curiosidade” que essencial para todo artista. Sou curioso sim – não do tipo curioso-perguntão, mas curioso-observador.

“O Caminho gera. A Vida alimenta. O ambiente molda. As influências aperfeiçoam.” (Lao Zi, cerca do século 3 a.C)

R. Emiliano Perneta, nº 0
Na China, a palavra Tao quer dizer “caminho” se bem que, para os efeitos desta matéria, poderia ser traduzido como “carreira profissional”. Sempre há influências e o ambiente certamente molda.

Aos 50, após 35 anos trabalhando no ramo de farmácia magistral, abandonei as boticas (ou elas me abandonaram) 'na boa' e sem mágoas, em paz e harmonia. Saiu a farmácia entrou a arte como profissão.

Uma transição arriscada, planejada e executada no pequeno mercado de arte curitibano – Isso é uma escolha desejável? E no caso de não ser desejável, é uma escolha? 

Não sei a respostas a estas perguntas, e aos 50 anos nem sabia da existência das próprias perguntas. Foi o que na ocasião pude fazer e fiz. A dedicação exclusiva à arte fez o resto.

Durante alguns anos de escassos recursos, me propus imaginar tanto o modus vivendi, quanto o modus operandi dos grandes mestres da renascença.

Esquina das ruas Marechais

Se comparado com o tempo atual, aqueles artistas também contavam com poucos recursos, mas mesmo assim fizeram a maravilha que fizeram. Suponho que se eles vivessem na atualidade, não pintariam reis nem madonas mas, como eles fariam sua arte, com os recursos que nós temos na atualidade? É isso que então me propus imaginar.

Making of, o desenho antes da pintura
E ante circunstâncias desfavoráveis, o lápis de grafite tornou-se peça chave e insubstituível em meu trabalho. Ele é barato e um dos pigmentos mais estáveis e ecologicamente corretos na face da terra. 

De ruim, e dependendo do artista, pode fazer um 'sujeirão', ou uma controlável sujeirinha na tela. E não lhe conheço qualquer outro defeito. Mas de bom tem 'um monte'!

Há milênios a humanidade desenha com lápis, é algo natural, inerente à gente. E veja só, os mestres clássicos também desenhavam 'um monte' antes de concluir suas pinturas.

Às vezes suas obras eram mesmo mais trabalho de desenho do que de pintura, aplicada mormente na forma de veladuras, como meus trabalhos dos últimos dez anos, se bem que espontaneamente faço veladura acrílica desde a década de 1980.


R. Marechal Floriano, 566, 2012. Acrílica sobre tela
Em 2014, com mais recursos para a nova série, o lápis começa e ser substituído parcialmente por nanquim e outros materiais alternativos.

Mesmo assim, ninguém me tira o lucro de ter desenhado tanto com lápis, na época mais difícil à qual sou grato, por ter me permitido o grande desenvolvimento técnico de meu trabalho, com tão diferenciada característica estética.

Sempre afirmo que meu melhor trabalho é aquele que estou pintando. Para mim, o gratificante é a ação de estar pintando ou desenhando. Quando a pintura fica pronta empilho ela junto às outras, que vai para alguma galeria ou exposição, e sai do âmbito de minha curtição.

Tao Te King 16



Neste momento não saberia falar de “um” trabalho gratificante, mas de um conjunto. Certamente a série hiper-realista de As Pedras do Caminho, cujo tema central, são as calçadas e o asfalto de Curitiba.

A recente série de O Muro Transparente que expus no ano passado em Assunção, no Paraguai em uma das melhores exposições individuais que eu já apresentei, até o momento. E a série atual o Projeto Tao Te — Caminho da Virtude, que é um desdobramento natural de O Muro Transparente.

Tao Te King 33

Já abri mão do que gostava e do que queria, não foi pouca coisa não, até arriscaria dizer foram (quase) todos os sonhos da juventude. Depois disso me concentrei no que podia, e foi assim que entrei em uma dimensão diferente. 

E fiquei maravilhado porque, abrindo mão do que outrora eu queria ou gostaria, encontrei “o que posso”, que até parece melhor. Agora posso fazer o que faço, a inspiração vem de dentro fluindo sem cessar. E transformá-la numa pintura depende unicamente de mim, a responsabilidade é toda minha.

Falando de meu trabalho, ainda não conheço o limite do que posso, portanto continuo aprendendo e crescendo tecnicamente em um continuum que parece não ter fim, e isso me satisfaz. Quero e gosto de sentir a satisfação diária de fazer o que (dentro de minhas limitações) posso fazer.

No passado tive a sensação de que abri mão de muita coisa que era importante, e agora não tenho certeza se realmente eram importantes. Mas na atualidade não há uma separação entre a arte e o que é pessoal. Como se arte e viver fossem a mesma coisa. Me parece inconcebível abrir mão da expressão artística e permanecer vivo.

Assinatura de Escudero

Por volta de 1985, li pela primeira vez a inspiração da atual série de pinturas o Tao Te King de Lao Zi, e imediatamente me apaixonei por seu conteúdo.

Tao Te King 43
Com o tempo fui colecionando versões traduzidas por diferentes pensadores, com a nebulosa intenção de compará-las e redigir minha versão pessoal. Até que recentemente acordei para a realidade de não ser escritor. 

Então perguntei-me, porque não pintar o Tao Te King ao invés de escrevê-lo? E foi assim que começou o projeto Tao Te — Caminho da Virtude.

Paradoxalmente, depois de comparar tantas versões por causa do texto escrito nas pinturas desta série, achei apropriado redigir meu próprio “texto oficial” de cada poema do livro, associando-o à pintura da qual foi inspiração.

E assim, quando desisti do velho projeto de escrever minha versão do Tao Te King, foi o mesmo instante em que comecei a escrevê-la de verdade, porém indiretamente e através da pintura."





Daniel Escudero

Artista plástico e designer.
Nascido em Caseros, Argentina, em 1955. Reside e trabalha em Curitiba, Pr.

Exposições Individuais:
         2013
"El Muro Transparente". Espaço Cultural PharmaArte, Asunção Paraguai.
         2012
“Endereços (In)Certos”. Espaço Cultural BRDE - Palacete dos Leões, Curitiba PR

“Equilíbrio Cromático”. Hotel Blue Tree Towers, Curitiba PR

2011
“China’s Winds”. Espaço VITA Cultural, Curitiba - PR
2010
“Irrealidades Híbridas”. Espaço Jayabujamra/ Hotel Mabu, Curitiba - PR
2009
“As Pedras do Caminho”. Na galeria da Cohapar, Curitiba - PR
“Cores Sutis”, no Folha Seca Bar, Curitiba - PR
2008
“A Figura Humana”, nas Livrarias Curitiba do Shopping Estação, Curitiba PR
1993
“Trabalhos Recentes”, na Fundación Banco Cooperativo de Caseros. Argentina.
1992
“Trabalhos Recentes”, no Dansk Klub de Buenos Aires, Argentina.
1987
“Oscilações”, na Casa da Cultura de Cruzeiro – SP.
1986
“Oscilações”, na Casa de Chá Jasmim. São Paulo.
1985
Exposição sem nome, no Espaço Cultural Manduri. São Paulo.




        Participação em Salões / Exposições Coletivas:

2013
"Alegria", no Espaço Saint Michel, Curitiba PR.

"1º Salão de Arte Contemporânea e Novas Tecnologias de Ponta Grossa"

2012
“Exposição Pinheiros" no Solar do Rosário, Curitiba PR.

6º Salão de Artes Plásticas de Ponta Grossa 2012 “José Daros”

1º Salão de Arte da Associação Amigas da Mama do Paraná.

2011
XIII Salão Graciosa de Artes Plásticas. Curitiba, PR

5º Salão de Artes da Ponta Grossa”. Ponta Grossa, PR. (Prêmio aquisição)

Pequenos Formatos. Galeria Ponto de Fuga, Curitiba, PR.

VIII Salão de Artes Unimed Ponta Grossa – PR

10ª Mostra Artefacto Curitiba 2011.

“Moira”. Espaço de Arte Jayabujamra/ Hotel Mabu. Curitiba, PR.

2010
XII Salão Graciosa de Artes Plásticas. Curitiba, PR (Primeiro prêmio)

VII Salão de Artes Unimed Ponta Grossa – PR

Exposição “Chácara São Rafael das Laranjeiras”. Solar do Rosário, Curitiba PR

9ª Mostra Artefacto Curitiba 2010.

2009
XI Salão Graciosa de Artes Plásticas 2009. Curitiba, PR. Em junho.

VI Muestra Internacional de Arte Postal Ciudad de Ceuta, Ceuta, Espanha. Em junho.

VI Salão de Artes Unimed Ponta Grossa - PR

Pinheiro do Paraná – Da Natureza às Telas, na Galeria Solar do Rosário, Curitiba. Em junho.

Curitiba Contemporânea, no Salão de Arte da Cohapar, Curitiba. Em junho.

“Arte em 10 x 10”. Centro de Artes e Criatividade Iracema T. Ribeiro, Guarapuava – PR Em maio.

Artistas Contemporâneos Curitibanos 2009, no Shopping Curitiba

“Arte em 10 x 10”, no Espaço de Arte Jayabujamra.

“Arte em 10 x 10”, na Galeria de Arte Solar do Rosário, Curitiba-PR. Em dezembro.

2008
“Arte em 10 x 10”, na Galeria de Arte Solar do Rosário, Curitiba-PR. Em dezembro.

Brasil-Japão - 100 Anos de Imigração Japonesa. Câmara Municipal de Ponta Grossa, PR

Contemporâneos em Preto e Branco, no Espaço de Arte e Cultura Brasil Telecom.

Entre o Sol e a Terra, na Câmara Municipal de Ponta Grossa, PR

IX Salão Graciosa de Artes Plásticas, no Graciosa Country Club, Curitiba, PR

VI Salão de Artes da Câmara Municipal de Ponta Grossa – PR.

1992
Exposição coletiva no Clube Dinamarquês de Buenos Aires, Argentina.
1987
“I Concurso Acrilex de Pintura”. MASP - Museu de Arte de São Paulo.
1986
“Melhores Exposições de 1986” – Casa de Chá Jasmim, São Paulo.
1985
“II Prêmio Pirelli Pintura Jovem”. MASP - Museu de Arte de São Paulo.
1983
“I Prêmio Pirelli Pintura Jovem”. MASP - Museu de Arte de São Paulo.

   
Prêmios:

2012
Menção honrosa na 4ª Mostra de Artes de Paranaguá
2011
Prêmio aquisição no 5º Salão de Artes da Ponta Grossa.

Terceiro prêmio no VIII Salão de Artes Unimed de Ponta Grossa

Prêmio Município de Cascavel, na 19ª Mostra Cascavelense de Artes Plásticas
2010
Prêmio Graciosa Country Club no Salão Graciosa de Artes Plásticas 2010.
2009
Menção honrosa no Salão de Artes Unimed de Ponta Grossa, PR –
2008
Terceiro prêmio no VI Salão de Artes da Câmara Municipal de Ponta Grossa, PR.

 Obras em Acervos e Instituições Culturais:
2011
Centro de Cultura Cidade de Ponta Grossa

 Videos & Entrevistas na TV:
2009
www.margaritasemcensura.com/blog/wp.../escudero_cohapar09.pps
2010
TV Sinal, programa Ciranda Cultural. Entrevista de 30 minutos. Sexta-feira 12 de março de 2010, 18:30 e 20h.
2009
http://www.youtube.com/watch?v=Bvdvdx0bdXE = Alexandre Rodrigues entrevista Daniel Escudero, durante a inauguração da exposição “Artistas Contemporâneos Curitibanos 2009” no Shopping Curitiba.
TV Paraná Educativa, programa “Museus”. Sábado 7 e 14, e domingo 8 e 15 de novembro de 2009, 14:30 h
2008
TV Paraná Educativa, programa “Enfoque”, dia 08 de abril às 21 h.


Agenda:
As pinturas da série do Tao Te King estão sendo feitas especialmente para uma exposição no Centro Cultural do Citibank em Assunção, Paraguai, agendada para setembro de 2014. 


Contato: dg.escudero@gmail.com
http://www.facebook.com/dg.escudero



                                 *************




Izabel Liviski, é fotógrafa e doutoranda em Sociologia pela UFPR. Pesquisa História da Arte, Literatura e Artes Visuais. Escreve na revista ContemporArtes desde 2009, editando a coluna INCONTROS. 

Contato: <izabel.liviski@gmail.com>







0 comentários:

Postar um comentário

Seja educado. Comentários de teor ofensivo serão deletados.