domingo, 5 de julho de 2015

Uma perspectiva da Virada Cultural.



São Paulo... a capital do Estado, a "capital" do Brasil... Como é bonita e diversa, como a gente gosta dela! Proporciona coisas e acessos impensáveis em outras partes do Brasil... 
Por outro lado, como ainda há coisas por fazer nela! Como revela , nos detalhes, este país de infraestrutura pouca, de um Estado pouco atento e com tanto por fazer que parece ser impossível cuidar de prédios e calçadas, de moradores de rua, de iluminação e limpeza.
Sabe, fui à virada cultural, mas é verdade que não cheguei a tempo de curtir todas as atrações. Cheguei a tempo apenas de pegar o fechamento, no domingo, e andar um pouco pela cidade que já se despedia do evento.
Mas deu tempo de ter algumas percepções não muito positivas com relação, não às atrações em si, mas quanto à cidade de São Paulo e, a partir dela, do Brasil em geral. A primeira delas, foi a seguinte: como a cidade tem coragem de fazer um evento desses e não liberar a catraca do metrô??? Como será que os organizadores pensam que a gente pode se locomover da Júlio Prestes à República, por exemplo, sem auxílio do metrô? Ou ninguém pensa mesmo nisso e consideram parte da atração um gasto extra com transporte, que significaria retirar do evento a tarja de gratuito, (na minha opinião)?
Esta foi a primeira constatação: como ainda falta muito para que o governo se comprometa de verdade a fazer as coisas em prol da população, se embrenhar verdadeiramente na causa, ainda que ela seja um evento cultural. Pensar todas as possibilidades, tudo o que é necessário, conectar os setores da administração, conscientemente, para cobrir todas as demandas, quando realiza um evento cultural deste porte.
Eu fui apenas da Júlio Prestes a República porque cheguei no final e já tinha visto o Caetano no Sesc Itaquera - não estava querendo repetir. E pensei ir à República, ver o que ainda estava acontecendo por lá pra matar à noite - em ocasiões anteriores, a atração de fechamento tinha acontecido lá. 
É verdade que não é tão longe e eu poderia ter ido a pé - só que não, não poderia. Tudo muito escuro e não inspirava a segurança que precisava inspirar a cidade, em meio a uma virada cultural.
E ainda que eu pudesse transitar a pé, a opção de transporte público gratuito tinha que existir num dia como esse!.... Pelo menos num dia como esse, pra possibilitar o acesso da população de um lugar para o outro, com facilidade e presteza, permitindo que se acompanhasse qualquer das atrações que acontecia simultaneamente em diversos pontos, não só apenas em uma determinada região.
Depois disso, dessa constatação quanto à falta de aliança entre os setores da administração pública, falta de visão mesmo quanto a cobrir todo o necessário para uma realização desse porte, acabei dando um rolê da República à Sé a pé mesmo, depois de ter assistido um pouco a banda de forró que encerrava o evento na República.
É claro, você, paulistano, vai dizer: pô! da República à Sé também é sacanagem - o centro velho é, sabidamente, o lixão da cidade, uma parte perigosa,  renegada, ainda que nela haja atrações turísticas possivelmente maravilhosas, como o teatro municipal, o próprio largo do Anhagabaú e a igreja da Sé.
E é por isso que não me conformo! A parte histórica da cidade está lá, há prédios maravilhosos, aquelas ruas do centro, de paralelepípedo, tão antigas quanto ricas, o prédio do Banespa, o prédio do CCBB, e tantos outros... Mas não, a gente não consegue andar por ali sem se sentir em risco e perplexo com os contrastes, a sensação de insegurança, número de indigentes, sujeira e descaso com a preservação das ruas, das calçadas, dos prédios, desinteresse pelas pessoas que se aglomeram por ali, algumas dentro de bancos 24 horas, protegendo-se do vento nas agências de luzes acesas, a passar a noite no claro, como frangos numa granja.
Tudo horripilante. Ainda que São Paulo seja capaz de promover um evento desse porte, temos que admitir que não o faz como deveria, porque na verdade há muito a ser feito em prol da cidade e das pessoas, muitas debilidades, e a cidade transpira deficiências que não escapam a um olhar mais atento.
Por mais que a gente ame São Paulo, que São Paulo possa ser equiparada às capitais do mundo em alguns quesitos, quando se tem um olhar mais crítico, a gente percebe, mesmo na alegria de uma virada cultural, a tristeza de morar num país de muita desigualdade e má administração pública e lamenta a perda de tanta coisa que poderia estar fortalecida, ser base do nosso orgulho, talvez até de turismo.
O fechamento da minha lamentação e inconformismo foi, depois de ter transitado da República até o teatro municipal, onde a Banda Ira, no telão, entretia os últimos participantes da virada neste ano por ali, descer a escada que dá pro Anhagabaú, na tentativa de acompanhar um pouco o show que acontecia lá embaixo, e vislumbrar ali uma fonte que jamais vi. Uma fonte belíssima, que podia ser nossa "fontana di Trevi", porque em Roma, ela está no meio de ruazinhas que você jamais espera, não tem um largo ou um espaço aberto como muitas outras fontes romanas... não!está encrustada na cidade e te surpreende no virar de uma esquina, bela, limpa, conservada, repleta, repleta de verdade, de turistas.

a fonte de São Paulo, em funcionamento

Fontana di Trevi, em Roma - com o prestígio que também nossos monumentos deveriam ter

E a nossa?? Como estava a fonte que nunca vi, a fonte tão bem localizada defronte ao teatro municipal, aquele prédio belíssimo e imponente da cidade maior do Brasil (economicamente falando)??? 
Um retrato de tudo o que há pra melhorar no Brasil em geral: desligada, abandonada, fedendo como um grande banheiro ao ar livre e, em volta, muitas pessoas que foram acompanhar os shows de roupa preta, mas também muitos moradores do lugar- o Anhagabaú é a decadência (que pena!).
Depois de constatar isso, dei as costas pra pequena multidão que ainda assistia os shows ali, bastante assustada porque o lugar não me inspirava confiança e da maneira que desci, subi novamente as escadas para o teatro, em direção ao que me pareceu ser a grande aventura de alcançar o metrô da Sé.
No caminho, encontrei algum policiamento, sim, nas ruas, ainda tinha um certo número de pessoas transitando na cidade por conta da Virada, e, como já disse, muitos moradores se ajeitando pro recolhimento à "casa" - hora de arrumar a cama à frente das portas fechadas do comércio, em qualquer buraco ou cantinho. - Um show pequeno ainda no calçadão, perto do Pátio do Colégio e outro acontecendo na Praça da Sé.
Na verdade, assisti quase nada por lá este ano, realmente minha estratégia de não ver o Caetano não rendeu muito, à hora que eu tinha chegado. Mas essas percepções, que eu sinto ter tido, porque gostaria de ter coisas diferentes pra falar pra vocês hoje, vieram dessa insistência em passear pela cidade mesmo que fosse o fim da virada, confiando que, ao menos naquele dia, não seria a noite do terror do Playcenter, andar pelo centro velho da cidade sem companhia.
Sonho com o dia em que o Anhagabaú seja uma praça pra gente levar as crianças sem susto, um lugar pra turista bater foto e sentar com calma, vendo a fonte que mencionei acima em atividade, logo abaixo do teatro maravilhoso da cidade e, principalmente, com o dia em que não haja na cidade, no país, tanta gente desencaixada, desiludida, desconfigurada, a morar nas ruas, a usar drogas, gente perdida, consequência de um lugar que não se responsabiliza pelo seu povo e deixa tanto, tanto a desejar, que a indigência apresenta-se como uma boa escolha para muitos. 


ouça esta canção e entenda com o coração, o que não está dit




Larissa Germano é autora de "Cinzas e Cheiros" e escreve nos blogs Palavras Apenas (naoapenaspalavras.blogspot.com) e Nunca Te Vi Sempre Te Amei (cafehparis.blogspot.com), Tem perfil no facebook e no twitter e a página Lári Prosa e Trova no facebook. É também compositora intuitiva e tem perfil no Sound Cloud e Youtube. 

9 comentários:

Anônimo disse...

Larissa, achei maravilhosa sua reflexão acerca do abandono e decadência das nossas cidades brasileiras, em especial São Paulo que você tão bem destacou em sua crônica. Realmente é de entristecer!
Esperemos que essa crise mundial não transforme todas as grandes cidades nesse 'salve-se quem puder', Deus nos livre dessa anunciada 'guerra de todos contra todos'....parabéns pelo seu texto!
Bel

5 de julho de 2015 às 10:28
Unknown disse...

Vale a pena ler.

5 de julho de 2015 às 10:43
Unknown disse...

Vale a pena ler.

5 de julho de 2015 às 10:43
Unknown disse...

Vale a pena ler.

5 de julho de 2015 às 10:43
Lari Germano disse...

pois é, Bel.... acho São Paulo tudo de bom, mas, falando sinceramente, tem muito, muito mesmo, o que melhorar, e pra mudar isso, a gente tem que encarar a realidade de que mundo afora existe muito mais comprometimento com o povo e com a função do Estado do que em nosso país e, que por mais que capitais importantes estejam em tempo de crise também, o descaso brasileiro bate recorde e está muito aquém em diversos quesitos de governabilidade... bjs e obrigada pela leitura ;)

5 de julho de 2015 às 11:20
Lari Germano disse...

Obrigada, Ritinha!!! Você é uma querida! Mesmo com todos suas atividades e projetos maravilhosos, como as terças autorais de que sou fã, tem sempre um tempinho pra prestigiar a gente!! Valeu.

5 de julho de 2015 às 11:22
Marcos Liotti disse...

Adorei o texto, por momentos, e vários, estive na virada cultural com você, percorrendo as ruas e imaginando alguns dos lugares que citou, que vivem ainda na minha vaga memória, soube dela, da virada cultural, por uma foto de uma amiga de meu face que actuava numa peça de teatro, e no decorrer da mesma, fiquei triste de saber assim, mas, enfim... Natural para alguém que só está há 3 meses em SP, de qualquer forma, não posso deixar de referir que em outras capitais do mundo, é possível encontrar as mesmas insatisfações que relata, transportes, segurança e moradores de rua, uns melhores, outros piores, mas em todos existem pontos negativos, há cidades que os escondem nestas épocas, apenas para dar uma ideia aos turistas de que não existem, os tais moradores de rua, outras nem se dão a este trabalho... De qualquer forma, adorei ir a virada com você e vê-la na sua ótica!... :)

5 de julho de 2015 às 12:56
Lari Germano disse...

Marcos, você está certo....Como disse a Bel, são problemas que encontramos em muitos lugares, mas eu considero que São Paulo, inserto que está no Brasil, ainda com tantas deficiências e desigualdades, está ainda mais atrasado. Gostaria de lembrar que é apenas uma perspectiva da virada, porque tenho certeza que aconteceram coisas magníficas, culturalmente falando, também nela ... coisas que não conferi, infelizmente, e que valem a pena ser vistas, numa próxima. Bjs e obrigada!

5 de julho de 2015 às 13:04
Marcos Liotti disse...

Lari, somos seres de expectativas, natural, também espero numa próxima estar mais atento e não perder pelo menos um dia do evento no futuro. Beijos e parabéns pelo texto e esta boa viagem... ;)

5 de julho de 2015 às 13:19

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