quarta-feira, 27 de abril de 2016

Somos feitos de História...





Para ser sincera havia planejado escrever sobre um pequeno detalhe na paisagem urbana berlinense que eu adoro, as bombas de água. Mas depois do dia de hoje, e aqui peço desculpas pela postagem tardia, resolvi mudar. Meu dia hoje foi temático, e é sobre isso que gostaria de falar.

Hoje participei, como intérprete, de uma entrevista feita por um jornalista a um veterano da 2. Guerra Mundial. Como historiadora foi uma oportunidade fantástica, já que eles estão rareando a cada ano que passa, e há ainda um "acordo do silêncio" entre os que viveram este tempo e as gerações seguintes. Encontrar e poder conversar com um alemão que fala sobre o tema, sabendo se proteger e usando sua força de testemunho para mudanças é um privilégio. 

O tema eram os três anos e meio passados, depois do final da guerra, no campo de prisioneiros de Vladimir, na Rússia. Lá os alemães foram "aproveitados" como mão de obra especializada, ou não, para a reconstrução do país. A convivência era branda e o senhor lembrava do positivo e ressaltava sempre o quanto foi bom ter estado ali e não entre os "americanos". Ok, estávamos conversando com um cidadão da República Democrática Alemã, isto ficou claro. 
          
Assegurou ter sido uma surpresa e um desapontamento, saber o que havia acontecido com os Judeus e que, diante disso, resolveu negar toda a ideologia aprendida e quis construir uma nova Alemanha, livre do Nazismo. Virou um comunista de coração... 

E por falar em ideologias que devem ser negadas, na volta para casa passei na livraria para pegar o meu exemplar da recente edição do "Mein Kampf" ( só por encomenda!). Muito comentada e debatida aqui na Alemanha e com certeza fora dela, esta edição é um trabalho monumental e delicado, feito com um cuidado extremo por uma equipe "top" de historiadores com o intuito de alcançar o grande público. 

O livro impressiona em seu tamanho e formato. Dois volumes, cada um deles com bem mais de duas mil páginas.  O texto original literalmente foi rodeado por notas esclarecendo, contextualizando e desmitificando o seu conteúdo. Contrapondo fatos à propaganda, à ideologia e ao ódio. Mais um privilégio para esta historiadora: estar por aqui na Alemanha no momento do lançamento desta edição e poder lê-la no original. 

Enquanto isso o trabalho continua e agora é urgente em outras plagas. Estamos vendo a crescente onda do pensamento intolerante de "extrema direita" no Brasil. Do papel da mídia como meio de propaganda e do uso das meias verdades, fáceis de serem digeridas, para incitar um público agressivo, intolerante, pronto para ignorar e ferir direitos humanos e democráticos. Pensava que a frase "Aprender com a História" significava evitar repetições de erros...


Detalhe de uma bomba de água berlinense... 


Foto:
http://quarknet.de/berlin-reise.php



Ana Valéria mora a quase duas décadas em Berlim, onde estudou História Medieval e Estudos Latino Americanos. Hoje trabalha como tradutora.

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