Cabelo, cabeleira, cabeluda, descabelada.
Cresci ouvindo falar do meu cabelo, quase sempre pejorativamente. Os amigos do meu pai chamavam-me de Biro-biro; na escola, os colegas, de miojinho, esponjinha, Globetrotters e outros tantos mais que provavelmente esqueci. Nos primeiros anos de escola, se eu usava o cabelo solto, os meninos brincavam de esconder coisas dentro dele, lápis, borracha e eu, pra não ficar pior a situação, aderia à brincadeira, inserindo também objetos na minha cabeleira crespa e rindo da minha própria condição de portadora de cabelo ruim, como cabe a qualquer pessoa inteligente que seja vítima de apelido ou motivo de piada (se não pode vencê-los, junte-se a eles).
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Eu, com dois aninhos. |
Não guardo mágoas desse período não, porque superei essas dificuldades e outras, conduzida também, acredito eu, por esse esforço inicial. Acho que se o bullying que todos da minha época de alguma forma sofreram, se por um lado atrasa o desenvolvimento e emperra algumas pessoas de desenvolver as possibilidades de mundo para um ser humano (infinitas), por outro lado, a mim, adiantou o dom de lidar com frustrações e superar condições externas impostas, fazendo com que, a partir do momento em que soube enfrentá-las e não me rendi aos rótulos, eu desenvolvesse muito cedo forças que me são essenciais hoje e que me permitiram amadurecer antes.
Não que eu ache que as crianças tenham que passar por isso, nem que bullying seja algo parte de nós, nada disso. Acho que a partir do momento que tivermos uma educação pra habilitar a humanidade e não apenas as utilidades do aprender, essas práticas serão cada vez mais raras. E acho, inclusive, que já estamos nesse caminho, à medida em que, hoje, o cabelo enrolado, o cabelo crespo, o cabelo afro, o carapinha, o cabelo qualquer que ele seja, não tem aval pra ser tachado de "cabelo ruim".

Há alguns anos, depois do surgimento da chapinha e das escovas progressivas e definitivas, pelas quais também passei, em data não muito remota, o crespo está voltando com tudo. E as pessoas se unem pra cultivá-lo, saber cuidar dele e empoderar-se na prática de assumir-se e à diversidade. Há grupos na internet e em redes sociais de que produtos usar, como usar, qual creme pode, qual cabeleireiro ir, que cortes e etc., recursos que antes não tínhamos, e isso é maravilhoso.
Além das escovas e pentes: instrumentos de tortura usados para endireitar o cabelo (geralmente a partir das próprias mães), o que mais doía era que esse tratamento nos dizia que havia algo de errado em nós, algo de que se envergonhar.


Ouça esta canção e entenda com o coração o que não está dito.
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Observação: as fotos usadas neste post foram encontradas aleatoriamente, na rede.
1 comentários:
Adoro, o texto, seu cabelo natural (acho que já tinha dito) e todos como são, a diferença faz toda a diferença!
24 de julho de 2016 às 15:00Postar um comentário
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