Fado Alexandrino
Olá,
leitores! Esta semana terminei a leitura de um romance que achei sensacional. O
nome de tal obra é Fado Alexandrino,
de António Lobo Antunes. Em primeiro lugar, gostaria de sublinhar que sou fã
deste grande romancista português contemporâneo e conheci-o através da leitura
de As Naus. Depois vieram outros
livros muito especiais.
No
caso do Fado Alexandrino, o enredo
trata de um grupo de ex-militares portugueses que se encontra anos após a Guerra
Colonial contra as ex-colônias africanas e outros acontecimentos ligados à
Revolução dos Cravos – responsável pela deposição da ditadura em Portugal –
como também aos desdobramentos de tal insurreição. Há uma divisão da obra em
três partes, o que a torna ainda mais interessante. A parte primeira é
constituída pela lembrança dos ex-militares situando-a no período anterior à
revolução e ainda durante a Guerra Colonial. Nesta parte, ficam patentes as
dificuldades enfrentadas pelas pessoas que vivenciaram a guerra enquanto
soldados e que não encontram explicações plausíveis para esta empreitada
bélica. O que resta a todos é tentar manter-se vivo e, através das lembranças,
surgem também reflexões sobre esse triste período da história lusitana.
A
segunda parte da narrativa trata do período referente à Revolução dos Cravos,
destacando todo sentimento utópico que os portugueses experimentaram após a
queda do governo totalitário. Entremeado às lembranças dos militares, Lobo
Antunes injeta o seu conhecido humor ácido, demonstrando que, desde o início da
revolução, as personagens já percebiam os rumos que ela tomara,
consequentemente, não haveria mudanças significativas no modo de governar.
Passou-se à democracia, mas o poder continuou nas mãos dos que estavam antes à
frente do Estado.
A
terceira parte não deixa de destacar a permanência na gestão do Estado Lusitano
de pessoas que não se preocupavam tanto com o país, senão consigo mesmas.
Muitos fugiram de Portugal após a revolução, mas com a constatação de que o Socialismo
havia derrocado, volveram à terra pátria para continuar suas vidas. Entretanto,
se o governo não mudara radicalmente quanto era almejado por grande parte da
população, as consequências que a revolução acarretou, como o retorno de
aproximadamente 500 mil ex-colonos das ex-colônias em África , também outros problemas
econômicos e sociais, agravaram as crises existentes e isso, leitores, pode ser
observado ainda hoje, em pleno ano 2012 em que ao ligarmos a TV nos deparamos
com notícias sobre a crise econômica que se agrava nos países da Península
Ibérica como um todo.
António
Lobo Antunes, muito perspicaz na narrativa, contribui significativamente para o
ato de repensar-se a forma romance, uma vez que ele cria uma narrativa que não
é linear, na qual as memórias passadas das personagens se misturam com o
momento presente que estão a viver. Além disso, há outros traços formais, como
um recuo maior no início do parágrafo, contar a história em flashes,
incluindo rememorações em meio a
parágrafos que narram o presente, entre outros que vale a pena ler a obra
atentando-se aos detalhes.
Para aqueles que gostam de uma leitura que
exige e instiga a irmos, aos poucos, desvendando a história, a narrativa
lobo-antuniana é super recomendada. Vale ressaltar que, ao lado de José
Saramago – o único ganhador do Prêmio Nobel de Literatura em Língua Portuguesa –
António Lobo Antunes é considerado um dos grandes nomes do Romance Português
Contemporâneo, como também de Língua Portuguesa.
Rodrigo C. M. Machado é mestrando em Letras, com ênfase em Estudos Literários, pela Universidade Federal de Viçosa. Dedica-se ao estudo da poesia portuguesa contemporânea, com destaque para a lírica de Sophia de Mello Breyner Andresen