Poética do nada


Caros leitores,


Nesta sexta a reflexão perfaz as instâncias do nada. São intensos os muitos momentos em que a existência parece perder o movimento. Intensos exatamente porque, quando a vida exterior assume a sua condição de mais íntima monotonia, a sua realidade interior ganha velocidade extraordinária. No universo interior, passam então a dar-se os mais fascinantes acontecimentos, impulsionando mudanças, reordenando o todo, dando-lhe novos significados.  É especialmente essa condição de alteração, de cambio reflexivo, o que me atém ao escrever “Poética do Nada”. O nada é dotado de importância, de pertinência... Ignorar a sua intensidade é incorrer na ausência dos mergulhos interiores, os quais permitem o encontro de cada um de nós com nós mesmos.

Adriano Almeida


 Poética do nada


 As folhas em branco...
Canetas, papel e mãos.
Pensamentos em nó.



Frases insensatas.
Calor pueril...
Instintos selvagens.
Meu veneno vital.



Olhos de inquietude,
vontades não-permitidas.
Saudades não-contidas...
Os dias em transe...



Monotonia turbulenta...
Instantes de ódio, seu mais puro refrigério...
Acalentam o nada,
que por hora insiste em ser tudo.



É irritante saborear mais um dia...
De verão glacial,
de equadores hibernais...
Mais um pouco de penitência,
de culpa ou castigo.



No quarto, o silêncio...
Seu sigilo eterno,
guarda  a ânsia perturbadora,
em sua tranqüilidade voraz.



Devora-me o tempo,
Consumindo cada segundo.
Da raiva ao orgulho,
cada um dos seus limites impuros.



Ironicamente concede-me
a música...
Esta, pode ser sentida,
Mas aprisiona-me...
Ressoando-me em notas,
não vividas...





Adriano Almeida é pesquisador na área de cultura, imaginário e simbologia do espaço. Mineiro, tem se dedicado a escrever poemas, crônicas e contos. Seus escritos, de caráter introspectivo, retratam as incertezas, os conflitos, a melancolia e os encantos da existencialidade humana.






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Sorrisos e lágrimas



Há momentos para sorrir, contemplar o que nos toca e encanta, que nos fazem repensar sobre tudo o que de bom pode a vida nos oferecer. Outros são fruto do que há de sombrio, frustrante e deletério, e é nestas horas que nos perguntamos sobre qual o sentido de tudo o que se passa e sobre o real valor das coisas.

Entre sonhos, utopias, contingências e decepções, caminhamos muitas vezes sem nos dar conta de que é preciso parar, digerir os fragmentos de nosso cotidiano e buscar os traços marcantes que delinearam nossas vidas nos últimos tempos.

Mas o diabo mora nos detalhes, são eles que passam despercebidos e ocultam o que nem sempre queremos ver, ou mesmo o que nossas mentes deixam de lado para que possamos sobreviver. E é neles que podemos encontrar os nossos rastros indesejáveis, erros, perdas de sentido, olhando para cada gesto, fala, ação, como se observa uma grande obra de arte, fruir, apreender, sentir, reviver tudo aquilo que se foi mas estará para sempre marcado em nosso ser.

E não há tempo e nem limites para esse mergulho em nosso interior, apenas a necessidade de fazê-lo caso desejemos não deixar tudo passar como o vento que derruba as pétalas da rosas suavemente e destrói com ferocidade o mais sólido dos edíficios. Por mais doloroso que seja, é preciso abandonar, destruir, apagar, limpar, descarregar toda essa carga que trazemos conosco, mero entulho existencial que nos imobiliza e impede que deixemos desabroxar todas as possibilidades de uma vida significativa.

Não há de ser fácil, nem rápido demolir o que carregamos dentro de nós, objetos que se misturam ao nosso eu e em relação aos quais nem sempre sabemos nos diferenciar, se transformaram, se esconderam e se apresentam sobre novas faces. Eis a razão de se exigir um silêncio profundo e um olhar penetrante para desvendar estes enigmas. Eis o motivo pelo qual a farsante realidade consegue nos levar numa enxurrada de imagens, cores, sons e demais códigos e símbolos, sem nos darmos conta do real valor do que se nos apresenta.

Restou-nos apenas o sentir freneticamente, a espiral vibrante de impulsos, os movimentos velozes e hipnotizantes. A vida virou arte, mero objeto a ser admirado por quem passa. E é apenas passagem, não há raízes, nem profundezas, não se fica, não se perde muito tempo apreciando. Apenas o fabuloso, impactante, delirante, é que tem o poder de se aproximar de nós. A simplicidade e delicadeza das pequenas coisas passam a ser os restos das histórias de algum tempo distante.


São estes pequenos tesouros que precisamos resgatar, se ainda houver tempo e não tiverem sido saqueados pela insignificante e glamourosa vida que escolhemos viver.




Tatyane Estrela é graduanda no Bacharelado em Ciências e Humanidades e no Bacharelado e Licenciatura em Filosofia pela Universidade Federal do ABC. Participa do DEFILOTRANS - Grupo de Debates Filosóficos Transdisciplinares Para Além da Academia.

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... SÓ O ROSTO É INDECENTE ...

Só o rosto é indecente, do pescoço pra baixo poderíamos andar nus
Pós-moderna, pós-dramática ou performativa, a proposta com Falsos Pudores é a de se aproximar daquilo que o Lehmann chamou de “o teatro no ponto do desaparecimento”, espécie de movimento dos anos 80 e 90 que não pensava mais o teatro como a realização de um grande ato, num grande palco, mas que continuava, mesmo assim, sendo teatro.
Durante o processo investigativo, um encontro e várias inquietações. As inquietações davam conta da discussão acerca dos procedimentos teatrais, da fusão dos elementos significantes, do desinteresse pela complexidade psicológica da personagem ficcional e a potencialização das relações entre ator e personagens, entre personagens e linguagens. Dava conta do deslocamento da hegemonia da escrita, da revisão do papel preponderante do texto na construção do espetáculo ocidental-brasileiro-baiano e passando a tomá-lo como  um suporte de maior flexibilidade. Experimentações bastante diferentes do que havia feito em meus últimos trabalhos como em Salmo 91 e mesmo em A Alma encanatadora do Beco. E isso é fascinanate no teatro, essa capacidade de deslocamentos, de trânsitos nas esperimentações estéticas.
O encontro deu-se para uma visita à obra de Nelson Rodrigues, afinamos olhares e perspectivas, lemos, vimos e cantamos um universo que se descortinava de maneira transversal e interdisciplinar, como tinha que ter sido.
Falsos Pudores, que ficou em cartaz em Salvador até o último domingo, na Casa Preta, nasceu assim, mestiço, híbrido, enviesado. Uma dramaturgia não apenas textual, mas cênica, intertextual, citacional, inorgânica – para pensar com Burger; e performativa – para pensar com Féral.
O texto é curto, mas as imagens não, que são da Izabella Valverde e da Jô Stella.
Djalma Thürler é um artista multidisciplinar.
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Literatura Goiana: Maria Luisa Ribeiro





Nascida em Goiânia, Maria Luisa Ribeiro é formada em Direito, pela PUC-GO e pós graduada também em Direito. Também possui graduação em Letras pela UFG. Já foi premiada em diversas instâncias, recebendo, entre os títulos o diploma de “Honra ao mérito”, pela Instituto Goiano do Livro, “Personalidade Cultural do ano de 2003” pela Casa do Poeta Brasileiro e Federação Brasileira de Alternativos Culturais do Estado de Goiás, “Homenagem”, do Sindicado dos Escritores do Estado do Rio de Janeiro e Casa de Cultura Lima Barreto, entre outros.

Entre as obras publicadas, possui poesias, literatura infantil, romance e contos, além de participar de diversas antologias literárias.

Hoje, indicamos, entre suas produções o livro de contos “O senhor dos desencantos” e o romance “Os cordeiros do abismo”.


Uma boa leitura a todos!





Renato Dering é escritor, mestre em Letras (Estudos Literários) pela Universidade Federal de Viçosa (UFV), sendo graduado também em Letras pela Universidade Federal de Goiás (UFG). Atua como Professor em Literatura pela Universidade Federal de Goiás - Campus Jataí. Desenvolve pesquisas na área de Literatura e Cultura, Contística, Literatura Brasileira Contemporânea e Cinema.



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Versinhos de Criança - Córrego Leão



Versinhos de Criança - Córrego Leão


Eclode o chão
Nasce o regato
Nasce Leão

Eclode do chão
Toma curso
Nasceu então?!

Nasce o Leão,
Brotou no chão
Água! Água...

Nasce Leão!
Cadê então?
Água! Água...

Corre o leito
Procura crescer
E cresce?

Buraco, erosão
Afoga Leão!
E cresceu...

Calor, calor
E sombra não?
Queima Leão!

Afoga Leão!
Joga montão,
E é lixo!...

Lixo, lixão
Não morre não!
Capricho...

Corre solto
Corre, vai
Livre Leão!

Corre esgoto
Corre, cai
Junto ao Leão

Entre estas
E outras
Vai-se Leão!

Vinga...
Dorme...
Suicida!?

O homem
Consome
Suicida...

Foi-se o rei!
De seu rugido!
Só gemido...

Finda,
Morre,
Mata!

           

    Este texto é complementar às atividades propostas pelo projeto SOS Rio Uru (2007), do Colégio Estadual Zico Monteiro, em que uma das turmas ficou responsável por produzir sobre um dos córregos circundam o município de Uruana, o Córrego Leão. Foram organizadas várias atividades e com a poesia “Versinhos de Criança - Córrego Leão” procurei evidenciar a erosão, o desmatamento, o assoreamento, a poluição, males presentes em uma caminhada realizada dentro de todo o curso do córrego. Mais sobre este conteúdo em http://xarlles.blogspot.com.br/2011/09/corrego-leao-uruana.html.



Charles Lourenço de Bastos, graduado em matemática pela UFG - Universidade Federal de Goiás (2005), especialista em Psicopedagogia Institucional pela FINOM - Faculdade Noroeste de Minas (2009) e pós-graduando em Mídias na Educação pela UFG (2012), é professor, trabalhando na educação há 12 anos. Atualmente, é efetivo da Secretaria de Educação do Município de Uruana Goiás, tutor do curso de graduação em Informática (Polo UAB de Uruana/UEG) e professor contratado da SEE-GO. Algumas de suas publicações que evidenciam áreas de sua atuação: educação, matemática, formação continuada, mídias e inclusão, estão presentes no blog www.xarlles.blogspot.com.
xarlleslb@gmail.com

A Contemporartes agradece a publicação e avisa que seu espaço continua aberto para produções artísticas de seus leitores.

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Luzes do Norte: Desenhos e figuras do Renascimento Alemão, na Coleção Barão Edmond de Rothschield/ Louvre no Museu de Arte de São Paulo

 

Martin Schongauer, Três cabeças orientais, busto, gravura em buril com realce em guache, sem data, Coleção Barão de Rothschild/Louvre. 


Está em cartaz no Museu de Arte de São Paulo (MASP) a mostra Luzes do Norte, que se estende até 13 de janeiro de 2013.

Doado ao Museu do Louvre, de Paris, pelos herdeiros do barão, colecionador e filantropo Edmond de Rothschild, o fantástico conjunto de obras do Renascimento alemão chega a São Paulo, em mostra concebida exclusivamente para o museu. 
A atração imperdível traz 61 gravuras e desenhos sobre papel. O mais fascinante é acompanhar na seleção como os valores estéticos da época foram se desenvolvendo, da influência do chamado gótico internacional para as inovações de perspectiva herdadas pelo contato com a tradição artística do Note da Península itálica. 
Grande gênio do período, Albrecht Dürer - muitas vezes comparado a Leonardo Da Vinci no contexto das Artes plásticas  do Norte -  é mote de 3 eixos temáticos expositivos cujos destaques são as magníficas obras A Santíssima Trindade e Santo Eustáquio. Martin Schongauer aposta em tons grotescos e humorísticos em Três Cabeças Orientais. Complementam a exibição um rretrato do reformista religioso Matinho Lutero de Lucas Cranach, o Velho, e dois óleos pertencentes à instituição paulistana,  também o Retrato de Jovem Aristocrata de Lucas Cranach, o Velho, e um retrato do Poeta Henry Howard, Conde de Surrey, de Hans Holbein



A Santíssima Trindade, de Albrecht Dürer


 Albrecht Dürer, A Santíssima Trindade, sem data, de  Coleção Barão de Rothschild/Louvre. Obra em exposição no MASP



Santo Eustáquio, de Albrecht Dürer


 Albrecht Dürer, Santo Eustáquio, sem data,  Coleção Barão de Rothschild/Louvre. Obra em exposição no MASP




Retrato de Martinho Lutero com hábito de frei agostiniano, de Lucas Cranach


Lucas Cranach, Retrato de Martinho Lutero com hábito de frei agostinianoColeção Barão de Rothschild/Louvre. Obra em exposição no MASP






Lucas Cranach, o Antigo, Retrato de Jovem Aristocrata - Um Jovem Noivo da Família Rava, 1539, óleo sobre tela,  Museu de Arte de São Paulo. A obra pode ser vista na exposição Luzes do Norte





O Poeta Henry Howard, Conde de Surrey, de Hans Holbein

 Hans Holbein, O Poeta Henry Howard, Conde de Surrey, 1542, Museu de Arte de São Paulo. A obra pode ser vista na exposição Luzes do Norte




Texto de Introdução de Luzes do Norte, Museu de Arte de São Paulo




Desenho O imperador Sigismundo com o rei da Boemia e o rei da Hungria, de autor desconhecido, datada de 1450

Desenho de O imperador Sigismundo com o rei da Boemia e o rei da Hungria, de autor desconhecido, datada de 1450, Coleção Barão de Rothschild/Louvre. A obra marca os primórdios da gravura renascentista germânica. Obra em exposição no MASP




Retrato de Maximiliano I com armadura a cavalo, de Hans Burgkmair

  Hans Burgkmair, Retrato de Maximiliano I com armadura a cavalo, de Coleção Barão de Rothschild/Louvre. Obra em exposição no MASP




Mulher passando a cavalo pela porta de uma cidade, de Albrecht Altdorfer

Mulher passando a cavalo pela porta de uma cidade, de Albrecht Altdorfer, Coleção Barão de Rothschild/Louvre. Obra em Exposição no MASP


Gravura O Baile, de Mestre Mz, parte da coleção Barão Edmond de Rothschild/Museu do Louvre

Mestre Mz, O Baile, de  parte da coleção Barão Edmond de Rothschild/Museu do Louvre. Obra em Exposição no MASP



A Ressurreição, de Israhel van Meckenem

Israhel van Meckenem, A Ressurreição,  Coleção Barão de Rothschild/Louvre. Obra em exposição no MASP






Hans Baldung, O Sabbath das Bruxas,  coleção Barão Edmond de Rothschild/Museu do Louvre. Obra em exposição no MASP







Hans Wechtlin (Skull in a Renaissance context) Art Poster Print Impressão de alta qualidade

Hans Wechtlin, Crânio com moldura ornamental, coleção Barão Edmond de Rothschild/Museu do Louvre. Obra em exposição no MASP. Tema de Vanitas, a Vaidade, Motivos "Vanitas" foram comuns na arte funerária medieval, com exemplos mais duradouros em esculturas. No século XVI isso podia ser mórbido e explícito, refletindo uma intensa obsessão pela Morte e pelo apodrecimento, também vista na Ars Moriendi(A arte de morrer), na Danse Macabre (Dança da morte) e no tema superposto do Memento mori (Lembra-te que morrerás). Da Renascença, tais motivos tornaram-se gradualmente mais indiretos, e o gênero "Still-life", que se tornou popular, encontrou morada lá. Pinturas feitas no estilo "Vanitas" querem lembrar a efemeridade da vida, da futilidade de agradar, e da certeza da morte. Também forneceram uma justificativa moral para várias pinturas de objetos atrativos. Símbolos "Vanitas" geralmente incluem caveiras, lembretes da inevitabilidade da morte, e pode ser compreendida como uma alusão à insignificância da vida terrena e à efemeridade da vaidade





Lovers Surprised by Death


Hans Burgkmair, O amor surpeendido pela morte (Mulher chorando e fugindo da morte), 
coleção Barão Edmond de Rothschild/Museu do Louvre. Obra em exposição no MASP. Tema da Dança Macabra, ou Totentanz, é uma alegoria artístico-literária do final da Idade Média sobre a universalidade da morte, que expressa a ideia de que não importa o estatuto de uma pessoa em vida, a dança da morte une a todos. Há representações de Danças macabras na literatura, pintura, escultura, gravura e na música. Estas representações foram produzidas sob o impacto da Peste Negra (1348), que avivou nas pessoas a noção do quão frágeis e efêmeras eram as suas vidas e quão vãs eram as glórias da vida terrena



No Renascimento, a Europa do Norte passou por mudanças radicais : os princípios fundamentais da Igreja estavam sendo questionados. Neste contexto, os artistas produziam obras diversas e admiráveis por sua tecnicidade.
Em finais do século XV, com a cultura cívica no seu apogeu, a pintura atingiu na Alemanha uma projeção jamais vista desde desde as iluminuras dos magníficos manuscritos da época otoniana e saliana. Em contraste com a primeira parte do século, em que os artistas alemães foram ofuscados pelas realizações assombrosas dos seus contemporâneos neerlandeses, a situação de inverteu e subta e surpreendentemente de um modo ainda não explicado, quer que termos de arte quer em termos de história cultural. 

Será que a agitação criativa que germinava em território germânico no período que levou à Reforma Protestante libertou novas forças em seus respectivos centros artísticos?




Estes tempos modernos que já emergem já no século XV com a impressa de Gutenberg
(o tipo móvel) e com a gravura. Isso porque são procedimentos que revolucionaram
costumes, uma vez que permitiram a multiplicação de textos e a circulação de imagens.
Apesar de a gravura se desenvolver antes em imagens de devoção e afins
(modelos de ornamento, cartas de baralho, etc.), ela só ganha estatuto de arte autônoma
com Schongauer, Dürer, entre outros pintores e ourives.




Virgem Transtornada, um Busto, de Martin Schongauer (1450-1491)

Virgem Transtornada, um Busto, de Martin Schongauer (1450-1491), Coleção Barão de Rothschild/Louvre





Albrertch Dürer , Autorretarto com casaco de pele, 1500 óleo sobre painel de madeira, Alte Pinakothek, Munich. Esta obra não está inclusa na exposição Luzes do Norte




Têm-se, entre as obras mais antigas, representantes das escolas do norte: a
linhagem de Dürer, por exemplo, é seguida na Alemanha por Aldegrever, Pencz. Já a
Holanda tem Rembrandt, mas também Jan van Vliet e Lucas van Leiden.
Inicialmente as obras convergem por serem narrativas cristãs bem como
helenizantes, o que significa que além da simples apreciação, elas podem ter caráter
moralizante que incita à meditação.




Portanto, neste contexto, destaca-se o vulto assombroso de Albrertch Dürer (1471 - 1528), que veio a assumir enorme importância tanto em nível histórico e artístico. Dürer começou a ser influenciado pelas tradições de seus mestres, recorrendo à linha como meio de expressão fundamental, sendo a sua obra inicial consequentemente dominada pelas gravuras em madeira e em cobre.

Em 1496 e em 1506-1507, porém, realizou duas viagens à Itália, que iriam influenciar decisivamente a sua poética. Tal como Joahhann Wolfgang von Goethe (1749-1832) mais a frente, já em tempos envoltos pelas brumas da cultura romântica, Dürer experimentou na arte italiana tratamento orgânico e holístico da composição que se situa na extremidade oposta do espectro da arte dos Alpes, onde a pintura continuava sendo entendida como a combinação cumulativa de elementos individuais.

Com os venezianos, e sobretudo como Giovanni Bellini, aprendeu a modular os contornos com a cor. Finalmente, ainda reconheceu a necessidade de uma sólida abordagem teórica na representação dos objetos, que transcendia a mera intuição. A sua Madonna das Grinaldas de Rosas, A Adoração da Santíssima Trindade, -  o equivalente à Disputá de Rafael nas Estâncias do Vaticano -, assim como os seus Quatro Apóstolos constituem exemplos notáveis da fusão entre a percepção germânica e italiana da forma.




Obra O Rinoceronte, Impressão feita em 1620 por Albrecht Dürer


 O Rinoceronte, Impressão feita em 1620 por Albrecht Dürer, Coleção Barão de Rothschild/Louvre. Obra em exposição no MASP. O caso deste desenho é extremamente curioso. Dürer jamais viu um rinoceronte ao vivo. Não era comum aparecerem rinocerontes na Europa, mas em 1515 o rei Manuel I de Portugal havia trazido um da Índia (assim como um elefante), e a notícia causou grande impacto. Os dois animais foram enviados de Lisboa para Roma, de navio, como presente para o papa Leão X, mas o navio com o rinoceronte afundou, e o animal morreu. Dürer realizou seu desenho baseado em um esboço feito por um português, conseguindo apesar disso dar à figura uma aparência real, viva, tridimensional. O desenho não representa de modo totalmente correto o animal. Dürer, baseando-se em sua fonte, desenhou o corpo do animal como se fosse coberto por placas duras (um tipo de armadura) e colocou nas costas do rinoceronte um pequeno chifre que aponta para a frente, que não existe. O serrilhado na parte de trás do animal também não existe, as patas são um pouco diferentes, não possuem escamas, etc. Apesar disso, o desenho é extraordinário, e foi reproduzido como se fosse uma autêntica representação do rinoceronte, até o século XIX




Retrato de Rapaz, Albrecht Dürer

Albrecht Dürer, Retrato de Rapaz, sem data, Coleção Barão de Rothschild/Louvre. Obra em exposição no MASP



A pintura germânica à volta de 1500 atingiu um extraordinário fôlego. Se Dürer partira inicialmente para a linha, Mathias Grünewald (c. 1470-1528) centrou-se na composição cromática. O seu retábulo de Isenheim, iniciado em cerca de 1512, representa o mais importante contributo da arte germânica para a tradição da cor na arte. A questão de saber em que medida Grünewald se baseou nas novas teorias cromáticas de Leonardo e nas obras de Giorgionne é algo que merece uma investigação mais cuidada. A modulação da cor consistiu também o ponto de partida para os pintores da chamada Escola de Danúbio (abordada na esposição no MASP) e nomeadamente o jovem Lucas Cranach (1742-1553), Albretch Altdorfer (c. 1480-1538) e Wolf Huber (c. 1485-1553), em cujas mãos a pintura paisagista assumiu uma importância antes desconhecida a norte dos Alpes. Confrontados com as paisagens atmosféricas produzidas pela Escola do Danúbio, somos tentados a falar de uma primeira fase de "Romantismo" na arte germânica.



A gravura de paisagem se impõe apenas no século XVII concomitantemente
com o seu desenvolvimento em pintura. Muitos são os temas gravados: topografia de
cidades, cartografia, edificações, ruínas, marinhas, mundo mineral, flora, fauna.
Nos Países Baixos da época, a gravura logo se identifica com o ambiente exterior:
Jan van de Velde II aparece como um dos precursores da paisagística holandesa por
representar aspectos rurais outrora ignorados, no que suas águas-fortes sobressaem
pelos efeitos atmosféricos e por linhas de horizonte rebaixadas. Também ativo em
Holanda, Anthonie Waterloo se especializa em cenas à céu aberto nas quais a figura
humana é pretexto para suas visões arbóreas. Já o francês Claude Gelée se volta à
paisagem italiana representando portos imaginários, entre outros, em que os efeitos de
luzes predominam. Quanto à Callot, ele é exortado tanto por suas inovações técnicas
quanto por ser um dos primeiros artistas a se dedicar exclusivamente à gravura.

Entretanto, independente do contato direto com a arte produzida na Península Itálica, começava a fazer-se sentir na Europa uma tendência comum num sentido de formas amplas e equilibradas e da integração do real e do ideal, como é patente nas obras da maturidade do artista neerlandês Gerard David (c. 1460-1523), por exemplo. As obras de David não abrem, porém, novas sendas para o futuro, remetendo a Jan van Eyck, na sua compreensão da figura humana, enquanto volume vigorosamente modelado.


Para além da migração, quer de obras de arte de artistas, a partir de meados  do século XV surgiu um outro intercâmbio artístico. Aproximadamente na mesma altura, e de ambos os lados dos Alpes, houve duas técnicas de impressão que evoluíram para gêneros da pintura por direito próprio: a xilogravura, que se desenvolveu a norte nos Alpes em início do século XV , e - mais importante ainda - a gravura em bobre, cujas origens mergulham provavelmente também nos princípios  do século XV na prática artística ao sul do território germânicoO primeiro exemplo datado registra o ano de 1446. 


As primeiras gravuras em cobre italianas provem das oficinas de Andrea Pollaiuolo (1432-1498). As estampas proporcionam um meio inteiramente novo de difusão de ideias artísticas mesmo nos cantos mais recônditos da Europa. A xilogravura e a gravura em madeira assinalam, pois, o início do desenvolvimento dos modernos meios de comunicação visuais . Por volta de 1500, é de crer que as gravuras estivessem disponíveis em larga escala - tanto mais, na verdade, porque se torna muitas vezes difícil ajuizar se um artista se apropriou de uma nova linguagem formal na sua obra como consequência de um confronto direto ou indireto, com sua fonte.É certo que a história da Arte se faz de empréstimos culturais e de reelaboração das tradições e novas tendências. 


Por outro lado, uma tendência nova, historicamente documentada, surgiu por volta de 1510, envolvendo artistas que se deslocavam em ambos sentidos. Na sequencia da partida de Jean Gossaet (c. 1478/88 - 1533/36) para Roma em 1508, uma viagem ao território italiano passou a fazer parte da preparação de qualquer artista. Isto particularmente verdade no caso dos Romanistas do sul dos Países Baixos. A expansão do Renascimento italiano a norte dos Alpes foi, por sua vez, fomentada  por alguns importantes pintores italianos permaneceram algum tempo no estrangeiro, designadamente na corte francesa. Leonardo da Vinci, que aceitou um convite de Francisco I (1494-1547) para viver em terras francesas em 1516, foi seguido por Rosso Fiorentio (1494-1540) e, um ano mais tarde, por Francesco Primaticcio (1504-1570), de Bolonha. 


Contudo, no momento em que a arte europeia começava a experimentar um processo de internacionalização, a unidade do Renascimento estava já a se desagregar numa voragem contracorrentes. Logo os estilo renascentista de Michellangelo Buonarrotti influenciaria a arte sinuosa, afetada e sensual do Maneirismo.


A exposição Luzes do Norte no MASP vale uma visita com tempo, tempo suficiente para o espectador se deixar perder nas linhas e se absorver pela riqueza de detalhes das belas gravuras. Um bom exemplo é Adão e Eva, ou A Queda, de Dürer.







Albrecht Dürer,  Adão e Eva, 1504, Coleção Barão de Rothschild/Louvre. Obra em exposição no MASP








In Ars veritas

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Bibliografia: 


CHILVERS, Ian (Org.). Dicionário Oxford de Arte. Trad. Marcelo Brandão Cipolla. São Paulo: Martins Fontes, 2007.


O Renascimento. São Paulo: Folio, Coleção Grande História Universal,  2007.


Renascimento. História Viva, Grandes Temas, Edição Temática N° 5.


MUSEU DE ARTE DE SÃO PAULO ASSIS CHATEAUBRIAND. Luzes do Norte: Desenhos e gravuras do Renascimento alemão na Coleção Baron de Edmond Rothschild (catálogo). São Paulo: Museu de Arte de São Paulo, 2012.


WUNDRAM,  Manfred. Renascimento. Colônia, Alemanha:Taschen, 2007.


 WOLF, Norbert . Albretch Dürer.  Colônia, Alemanha:Taschen, 2007.



Para saber mais:


http://masp.art.br/masp2010/exposicoes_integra.php?id=124&periodo_menu=








Mariana Zenaro é graduada e licenciada em História pelo Centro Universitário Fundação Santo André e bacharel em Comunicação Social, com ênfase em Jornalismo, pela Universidade Metodista de São Paulo. Tem Pós-Graduação, MBA em Bens Culturais: Cultura, Economia e Gestão, pela Fundação Getúlio Vargas. Frequentou os cursos livres de História da Arte na Escola do Museu de Arte de São Paulo (MASP) por dois anos e meio. Trabalhou em Museus, Arquivos e Instituições Culturais. Foi voluntária no Centro de Documentação e Biblioteca do Museu de Arte Moderna de São Paulo. Dá cursos e palestras sobre história da arte em fundações, centros culturais. 



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