sábado, 5 de dezembro de 2009

Somos o próprio corpo


Observando corpos na rua, vejo sobrevidas perambulando negligenciando seu corpo matéria e sufocando sua alma. Percebo que este homem imerso na contemporaneidade e refém de tudo de aprisionador que ela proporciona, permite que o que lhe determina humano, o que o levaria ao conhecimento empírico e o que lhe seria fonte inesgotável de prazer, se transforme apenas em fonte dor, sacrifício, medos e ausência.
O Merleau Ponty vai dizer que não somos apartados do corpo.

 Pois somos o próprio corpo.



Observando corpos na rua, vejo sobrevidas perambulando negligenciando seu corpo matéria e sufocando sua alma. Percebo que este homem imerso na contemporaneidade e refém de tudo de aprisionador que ela proporciona, permite que o que lhe determina humano, o que o levaria ao conhecimento empírico e o que lhe seria fonte inesgotável de prazer, se transforme apenas em fonte dor, sacrifício, medos e ausência.

Olhando o caminhar da multidão nas grandes e pequenas cidades sinto que a matéria tem sido local da ausência de si. Entendendo o corpo como território, concluo que o homem dono de seu corpo, de seu território tem esquecido de ocupá-lo, de preservá-lo e claro de conhecê-lo.

Como profissional da Dança poderia agora de maneira audaciosa, utópica e heróica apresentar a solução e trazer centenas de argumentos que levaria a convencê-lo de que a Dança e seus conhecimentos específicos seria a salvação deste corpo máquina, deste território desocupado e descuidado.

Porém, seria uma irresponsabilidade minha, e uma falta de entendimento global da área convencê-lo de tamanha façanha, embora ela pode sim ser executada.

Pois mesmo ciente dos benefícios cientificamente provados e os benefícios sensivelmente óbvios da arte e principalmente da Dança quando nosso foco é corpo, não posso esquecer do virtuosismo técnico desta arte que muito aprisiona o bailarino, e assim como o corpo objeto cotidiano, coisifica o corpo matéria deste mágico do movimento de forma apenas utilitária, e aprisiona sua alma de forma cética. 

                                                                                                                    
Assim o corpo do bailarino se torna instrumento da Dança, que deveria ser a máxima exploração da expressão corporal e a catalisadora da liberdade, fazendo com que este intérprete muitas vezes até expresse sentimentos, mas de forma tão mecânica e pré-elaborada que destrói toda a possibilidade de deixar o que ele realmente sente, o que realmente lhe arde sair. Transformando seu corpo em máquina de reproduzir emoções, fazendo uma máscara em seu entorno, uma densa couraça que o impedi de liberar, de permitir emergir tudo que lhe é próprio, tudo que compõe seu território para além de sua própria fronteira. Tudo que constrói sua alma.

Fazendo com que o corpo do bailarino se assemelhe ao corpo dos que perambulam na sobrevida, que caminham nas cidades sem rumo, sem ardor, sem vida, transformando todos em seres desconhecidos de si, em seres que não permitem a transpiração criadora da pele, que caminham nas cidades sem rumo, sem ardor, sem vida, sem entender a razão pela qual existem, sobrevivem e muito menos sem conhecer o corpo que o é.



Aline Serzedello Vilaça escreve aos sábados, quinzenalmente, no ContemporARTES

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