segunda-feira, 22 de março de 2010

As Marcas de Larissa Marques!


por Altair de Oliveira.




É com estranha alegria que trago para vocês esta semana, um pouco da arte de Larissa Marques, esta goiana de 35  anos radicada em Brasília, precisamente na cidade satélite de de Sobradinho.
Larissa é poeta e escritora talentosa, além de artista plástica de mancheia, seus escritos têm uma intesidade dolorosa daqueles que parecem apenas sussurar devido às asperezas e inconveniências encontradas na vida, feito um lamento cifrado, forjado à frestas, nem por isso menos belo.

Uma moça interiorana do coração do Brasil,  que traz os sinais desta condição de mulher brasileira e do interior que teve que ir para as grandes cidades, mas que trouxe consigo seus clarões que, com certeza, abriram e abrirão caminhos. Me disse que era estranha e calada, pode ser... Mas seus escritos falam alto, quase gritam, por mais sussurados que se tente oferecer. Por isso a sua poesia vem, pouco a pouco, conquistando lugares de destaque nos parcos espaços que a poesia brasileira ainda tem. Seus poemas estão espalhados em vários sites e blogs da internet e também em alguns jornais importantes do país.

Como poeta, a goiana se diz aprendiz de grandes mulheres marcadas pela poesia e pela militância da libertação da mulher como, por exemplo: Lou Andreas Salomé, Anäis Ninn, Silvia Plath, Virginia Woolf e Hilda Hilst. Quem conhece estas autoras e lê Larissa saberá que ela traz esta "marca da pantera" sim. Mas traz também a marcas de grandes poetas ditos malditos ou mal-lidos, como Rimbaud, Baudelaire, and so on.

Como escritora, seus textos curtos são violentos, longe daquela ternura bomocista que normalmente bordam as prosas das prendadas moças de família, estão mais para autores como Rubem Fonseca e Charles Bukowski, eu diria. Mas ainda assim é prosa gostosa de moça!

Não sei quem nasceu primeiro, se a artista plástica  ou a escritora Larissa Marques, mas em ambas observamos um olhar intenso e felino que sabe muito bem traduzir com beleza, inda que machucada, os intensos sentimentos de dor ou de prazer que a vida teima em oferecer-lhe.


Quem é Larissa Marques



Larissa Pinto Marques Braga, poeta, escritora, artista plástica, autodidata, mãe, esposa, é uma entre tantas iguais. Nasceu em 1974, na cidade de Itumbiara, interior de Goiás, residente em Sobradinho, Distrito Federal. Como tantas outras mulheres percebe o mundo e a dureza das coisas mais simples da vida, com um olhar mais terno e não menos agressivo. Diz ter compreendido melhor sua existência através de Sartre, Heidegger, Kierkegaard que abriram muitas portas e que depois deles se encara melhor nos espelhos de si mesma. Confessa-se ainda aprendiz eterna de Virgínia Woolf, Simone de Beauvouir, Sylvia Plath, Hilda Hilst, Lou Salomé e Anaïs Nin. Com elas entendeu o essencial sobre a sua feminilidade. Traz em sua escrita o tom existencialista que a acompanha desde muito jovem. A consternação, o confrontamento, o inconformismo fazem parte de sua personalidade. Sua voz feminina, de descontentamento é a marca registrada de seus   trabalhos. Já escreve há mais de dez anos e expõe sua obra na internet, em jornais impressos especializados em literatura e revistas voltadas para arte.

Um Microconto de Larissa Marques:

Peixe Morto

Já te pedi algumas vezes para que não me olhasse assim, esse seu jeito quase me dói, mas sabe de meus defeitos, não ouso enganar ninguém.
Hoje posso ficar mais um pouco só pra te agradar, vir deitar mais cedo, encher seus ouvidos de sonhos e seu corpo de amor. Vou deixar o sol dormir um pouco mais e sustentar seus medos entre meus seios, sem promessas posteriores.
É mais fácil amar de verdade no passado do que no presente. Lá no passado, como lembrança trancafiada em algum canto escuro, o amor é garantido por ser pretérito.
Ontem deparei-me com vários olhos como os seus boiando na lagoa Rodrigo de Freitas.


Três Poemas



limítrofe

devotei-me à traição
e amo-te em mosaicos conflitantes
resisto ao seu querer
e persisto dissociada
em dúvidas e orgias ficcionais
extremos passionais

soul-te inteira
sem limites tênues
errante e impulsiva
idealizo tudo
a crença utópica
do endeusar pagão
dilacero-te e peço-te
não me deixe morrer só!

                Larissa Marques


Meu olho esquerdo


Não repare
Não me olhe muito
Pois percebi agora
Que meu olho esquerdo
É enorme
Mais permissivo
Mais revelador
Menos punitivo
Menos constrangedor
Quem me dera tivesse
Dois olhos esquerdos
Para ver apenas um lado
Para perceber melhor os outros
Pois meu olho direito
Só inflama
Só me reprime
Só me engana.

                Larissa Marques


Goteira

escorreguei gotejando feito
chuva nas pedras do incompreendido
vãos entremeios do ignorar

há cura para o cansaço
é o sussurro seu no meu ouvido
é a mentira que me conta

já não corro da chuva, da nuvem cinza
nem da esperança que me cega
ainda tenho olhos esbugalhados

eles passam entre seus dedos
como as contas do rosário
de minha avó em devoção

lembro-me ainda do choro
de meu reflexo no seu olho
conjugações não me emocionam
só as gotas

distante me faz ler poesias
e tento reescrevê-las num ato falho
as lágrimas amargas falham em face vazia

jamais tentei o distanciamento
e até orei meu abismo aos bárbaros
que caçoaram de mim

e se consegue ver-me em seus olhos
fure-os na ira da gota
não estou pronta para nós.

                Larissa Marques


Para ler mais poemas de Larissa:
http://www.larissamarquespoeta.blogspot.com/

Para ler mais prosa de Larissa:
http://www.calamidadevisceral.blogspot.com/


Ilustrações: fotos dos trabalhos da artista-plástica Larissa Marques.


Altair de Oliveira (poesia.comentada@gmail.com), poeta, escreve às segundas-feiras no ContemporARTES. Contará com a colaboração de Marilda Confortin (Sul),  Rodolpho Saraiva (RJ / Leste) e Patrícia Amaral (SP/Centro Sul).

2 comentários:

Larissa Marques - LM@rq disse...

Obrigada, Altair!
Sou calada de mim, até que sou falante em vivência social.
Me senti desnuda, muito bom isso, mais uma vez, obrigada!

22 de março de 2010 às 14:28
Cinthia Kriemler disse...

Então,Larissa está derramando por aqui, agora, a ousadia de aceitar o que a vida lhe dá (deu) em tom maior... Tom de poesia. Tom de "não tenho medo de você, vida!". Tom de mulher. Larissa é uma lareira: crepitante, intensa, brilhante, perigosa. Que bom! Ganhamos nós que a lemos por aqui, por lá e por aí. Beijo, menina! - "Adorei o Peixe morto"!

22 de março de 2010 às 20:51

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