segunda-feira, 21 de junho de 2010

O Poeta Fernando Righi

Um Mineiro Lítero-Musical
por Altair de Oliveira


Conheci o Fernando Righi em Belo Horizonte, na época do lançamento de meu último livro lá. Para mim que já conhecia um pouco da obra do poeta, foi uma grande oportunidade de conversarmos e de saber mais sobre ele e sobre suas atividades literárias.

Geminiano e poeta pré-tenso como eu, Fernando inicialmente pareceu-me tímido ao compartilhar comigo a primeira cerveja. Sem que percebêssemos, logo depois já estávamos com a boca cheia de palavras.

Fernando trabalha como jornalista, mas esteve envolvido com a música desde a adolescência, época em que decidiu participar de bandas de rock para trair sua vocação de infância de um dia tornar-se um astrônomo. Mas durante todo o tempo ele esteve disfarçadamente garimpando poemas. Com estes reunidos e publicados recentemente, cometeu uma espécie de traição à sua primeira traição. Um destraidor distraído? Ironicamente ele confessou-me: “Sabe, eu decidi publicar meus poemas para ganhar dinheiro, já que como jornalista ou como roqueiro eu não tive chances...”

Criado na atmosfera de uma romântica e cultural Beagá (a mesma que nos conta seus grandes escritores como Fernando Sabino, Roberto Drummond, Ziraldo e Oswaldo França Junior ), numa época de transformações que permitiram que surgissem movimentos importantes como “O Clube da Esquina”, o poeta pode participar de uma infância urbana e rica em referências às brincadeiras de ruas, de quintais, de leituras e cantigas e, mais tarde, ser iniciado na vida boêmia da cidade. Com seus botecos e seus tragos de boa música, Belo Horizonte é hoje chamada de “capital dos botecos” – palcos também de grande manifestações culturais - daí saíram grandes grupos musicais como “Sepultura”, “Skank”, “J-Quest”, “Pato Fu”, etc. A poesia de Fernando Righi não ficou imune a este clima, ela é parte desta modernidade urbana mineira, que é sem dúvida uma marcante característica cultural brasileira dos nossos dias.

Com uma forte musicalidade, a poesia de Fernando descreve o cotidiano urbano desta cidade que, apesar de moderna (com todas boas e más características de nossas metrópoles), traz a nostalgia de uma cidade de um ambiente manso e promissor onde infâncias felizes podiam ser muito bem desenhadas, antes de caírem na vida. Mas fala também das transformações que vieram depois. O seu livro “Cinco Impressões de meu tempo”, dividido em partes (A Cidade; Haicais para caber em pequenos apartamentos; As Cores e os dias; Você e eu: todos nós e A Poesia) é uma espécie de documentário poético destas transformações. E é também um testemunho de que a poesia pode ser preservada, ainda que em pequenos e poucos frascos, guardados e resguardados nos nossos apertados apartamentos.

Sobre o Poeta.

Nascido numa fria sexta-feira de junho de 1964 em Belo Horizonte, Fernando Righi Marco, como um geminiano típico, convive muito bem com as características extrovertidas do povo italiano, do qual é descendente, e também com a introspecção própria povo mineiro. Não foi à-toa que escolheu o discreto contrabaixo como instrumento de ofício nas dezenas de bandas em que atua desde a década de 1980, época em que também se iniciou no jornalismo.

O trabalho coletivo na música e a construção de imagens alheias nas assessorias de imprensa, entretanto, não lhe permitem o mesmo prazer que a poesia. “Na poesia posso ser eu mesmo, quebrando as regras ou acolhendo o saudosismo das rimas. Por meio do jogo de palavras, cada qual de meus contraditórios defende sua crença, seu valor e seu ponto-de-vista sem temer o maldito politicamente correto que nos assola”, diz.

Suas primeiras e marcantes influências são das mais variadas: na biblioteca legada pelo pai, despertou para a força das palavras de Castros Alves, Bandeira e Augusto dos Anjos; na coleção de discos dos irmãos, enxergou a transcendência dos Beatles e de Beethoven; na televisão, digeriu as ilusões dos seriados e filmes; e, na cozinha, compreendeu a musicalidade dos velhos sucessos bregas e caipira. “Tudo isso se amiga na minha alma e minha poesia, às vezes, costura uma conexão dessas coisas tantas”, resume

No entanto, há uma unidade em sua obra poética formada pelos publicados “Estrelas nos olhos, vaga-lumes na cabeça” (2005), “Cinco Impressão de meu Tempo” (2008) e “Bestiário Mínimo & Outras Poesofias (2009) e pelos milhares poemas inéditos que ainda abarrotam suas gavetas — a morte, a vida, a cor, a inadequação e a contemporaneidade. Sobre o lançamento de “Cinco Impressões de Meu Tempo”, registrava o crítico Alécio Cunha: “O ofício da poesia ganha o esmalte da crônica, não a frágil e iluminada substância vítrea, mas algo fluído (...) que navega no sangue”


Fernando Righi, por ele mesmo

"Aos 45 anos, já fiz de tudo nesta vida: comerciante, bebum profissional, astrôlogo e, atualmente, caço o sentido na vida depois que Gilmau Mendes determinou que todo mundo pode ser jornalista. Mesmo assim, sou um desses pobres coitados abnegados com especialização em marketing político e também músico, exercendo ambas as atividades ativamente desde os anos oitenta. Sem vocação para poeta maldito ou honras póstumas estou na lida para divulgar meus trabalhos poéticos: "Estrelas nos Ohos, vaga-lumes na cabeça" (2005), "Cinco Impressões de Meu Tempo" (2008) e "Bestiário Mínimo & Outras Poesofias" (2009), todos trabalhos independentes com um tema recorrente — a memória, a contemporaneidade e a dialética da vida."



Os Poemas




CABEÇA DE VIDRO -I-

Cavo nas fundas cavas de meu crânio
e encontro esqueletos esquecidos
rostos descarnados de gente que amei
sempre com o mesmo sorriso cínico.

Escavo nestas minhas fundas cavas
cheias de sangue, história, terra, pó
desenterro muitos tesouros perdidos
moedas valiosa à prova de ladrões

Adentro em grutas, reviro pensamentos
tantos eus soterrados, cheios de gemidos
escuros cantos onde germina meu futuro
às vezes são o nada, às vezes são o tudo.



CABEÇA DE VIDRO -II-

Cabeça de vidro, crânio de cristal
prisma de tantas luzes, sobrenatural
Lá estão todos mundos do universo
estão princípio e fim, o Verbo, o verso!


Fernando Righi, In: "Estrelas nos Olhos, Vaga-lumes na Cabeça”


3 TOQUES NA MADEIRA

Temo os dias tranquilos
prelúdios d' alguma tragédia
esse passear dos dias perfeitos
que desconsidera a brida e a rédea

Temo o brilhar dos sorrisos
abertos, seguros, alvíssimos
como o diabo encarnando em homens
ladrões e soldados competentíssimos.

Temo a passividade dos domingos
sempre a explodir em violência
dramas familiares, términos de amor
rodoviárias cheias de complacências

Temo - Um temor profundo
Incerto... premonição de invejas
recaindo sobre entregadores de pizza
famílias de ungidos a sair das igrejas.


Fernando Righi, In: "Estrelas nos Olhos, Vaga-lumes na Cabeça”

***

MINHAS MINAS

Minas sem mar - minas em mim
rupestre a rodar, de cavera em caverna
de montanha em montanha sem fim.

E mina a vontade que acorda para dentro
e tem o seu sentido de liberdade eterna
guardada a sete chaves da ação do tempo.

Minas sem mar nunca dantes navegado
no sobe e desce de tanta ladeira
de polidez e sombra no casarão mofado.

De janelas que encerram o calado berro
entre uma missa e a infame sexta-feira
de pedras no caminho, de ouro e de ferro.

Sou minas de rotinas, riquezas e ruínas.


Fernando Righi, In: "Cinco Impressões de meu Tempo”.


***



POEMA ELÉTRICO

A vida na cidade
tão cheia de ansiedade
como se o extraordinário
fosse insurgir da esquina
contra o dragão da maldade.

Um correr perdulário
movido a cafeína e gasolina
transbordando a necessidade
de surgir a cada esquina
a tão sonhada felicidade.

A vida na cidade
tem seu quê de saudade
dos bons tempos idos
que jamais foram vividos
por nossa urgente precariedade.



Fernando Righi: "Cinco Impressões de meu Tempo".



Para ler mais: http://www.germinaliteratura.com.br/2009/fernando_righi.htm
Site da banda Low-Fi: http://www.low-fi.com.br/
Contato com o poeta: ferrighi@hotmail.com



Ilustrações: 1: o poeta Fernando Righi; 2- o roqueiro Fernando Righi; 3- Capas dos livros do poeta; 4- "Noturna Elétrica", do pintor mineiro Gilberto Abreu.


Altair de Oliveira (poesia.comentada@gmail.com), poeta, escreve às segundas-feiras no ContemporARTES. Contará com a colaboração de Marilda Confortin (Sul), Rodolpho Saraiva (RJ / Leste) e Patrícia Amaral (SP/Centro Sul).

6 comentários:

Adriana Godoy disse...

Righi é um desses caras que valem a pena. Já bebi muitas com ele e compartilhei noites,poesia e cigarros. Sou fã de seus poemas e admiro o seu trabalho. Parbénspelo texto, muito bom. Ele merece.

29 de junho de 2010 às 19:02
Anônimo disse...

Fernando Righi é um sujeito tão interessante que é até difícil saber o que é melhor: conversar com ele, ler suas poesias ou ouvi-lo tocando contrabaixo. Talvez um pouco de tudo...
Renata Pereira.

29 de junho de 2010 às 20:51
Unknown disse...

Grande Righi,
Trabalhamos juntos, e com ele aprendi muito de jornalismo, música e vida. Camarada bacana, de cabeça boa! Parabéns pelo texto, retrata muito bem o Fernando!
Abraço,
Daniel Seabra

30 de junho de 2010 às 09:58
Fernando Righi disse...

Puxa vida, gente, muito obrigado pelos elogios. Mas saibam que sou um batalhão: 600 e tantos eus!

"qual homem do batalhão
de meus eus haverá, então
de renunciar a luz? Preparado
para desertar da diária luta?

quem será esse abençoado
cordeiro de Deus? Filho-da-puta?
apostador no cumprimento
da danação ou do monumento"

9 de julho de 2010 às 16:29
Edelways Campos disse...

Parabéns, Righi!!!
Suas poesias são mesmo cheias de sensibilidade e conteúdo!!
Venha nos visitar mais e quem sabe fazer uma outra Roda da Leitura... precisamos mostrar aos nossos meninos o que estão perdendo!
Grande abraço.

25 de julho de 2014 às 10:07
Anônimo disse...

Inacreditavelmente ruim como toda falsa poesia modernista. Sua prosa poética também é detestável. Suas publicações no Facebook deixam claro que sanidade não é o forte dele. Mais um maluco que acha que é artista.

18 de setembro de 2023 às 23:17

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