terça-feira, 3 de agosto de 2010

Algumas tendências da Literatura Brasileira Contemporânea



Leitores, na última semana eu discuti com alguns amigos sobre a Literatura Brasileira Contemporânea e algo que me chama muita atenção, que é a tendência contemporânea de se falar em guerra, droga, doenças, tráfico, loucura, enfim, que se fale sempre na realidade como uma fatalidade. Essas idéias vieram à minha mente após a leitura, principalmente, da obra O Quarto Fechado, de Lya Luft, mas eu já havia observado em Nove Noites, de Bernardo Carvalho, Onde Andará Dulce Veiga?, de Caio Fernando Abreu, Resumo de Ana, de Modesto Carone, entre outros.


Coincidentemente, iniciei a leitura de uma obra chamada Altas Literaturas: escolha e valor na obra crítica de escritores modernos, elaborada por uma estudiosa da literatura chamada Leyla Perrone-Moisés. Em um dos capítulos do livro desta estudiosa me deparei com o título “A literatura na era da globalização” que discute um pouco a literatura produzida na contemporaneidade e compara esta à produção elaborada no Modernismo. Esse capítulo me ajudou a entender a escrita de hoje e suas tendências. Por isso, eu gostaria de compartilhar e discutir com vocês alguns apontamentos importantes feitos por esta autora.

Leyla Perrone-Moisés aponta que o capitalismo, juntamente com a globalização, são delineadores da escrita contemporânea, de maneira que impera a produção que visa à cultura de massa, ou seja, uma produção industrial, que fornece produtos padronizados correspondentes a uma demanda de baixa qualidade estética. O mais interessante é que esta estudiosa não descarta a relação entre literatura e cultura de massa em outros tempos. Ela assinala que, por exemplo, a relação entre os escritores modernos e a cultura de massa era explorada qualitativamente, de modo que os escritores “exploravam, em equivalências de linguagem verbal, as possibilidades imaginárias e estéticas do cinema e da televisão nascente” (PERRONE-MOISÉS, 1998, p. 203). Enquanto os escritores contemporâneos apenas reproduzem o baixo teor de informação vinculado por estes meios de comunicação ou se conformam com a lógica mercadológica de tais meios, escrevem tendo em vista a passagem da literatura para, por exemplo, filmes, novelas, minisséries.

Um dos problemas dos escritos elaborados na contemporaneidade, apontados por Leyla Perrone-Moisés, é o reforçar o realismo, de modo a aceitar e proclamar o fim das utopias. Sem a utopia, o que se vê é aceitar a história como uma fatalidade, reforçar esta realidade. Neste ponto muitos se perguntarão: a literatura do romance de 30 no Brasil também não reproduzia a realidade? A estudiosa nos esclarece esta dúvida de maneira categórica, ao dizer que a literatura moderna, em vez de indicar soluções, buscou dizer não à realidade inaceitável, sugerindo a possibilidade de outras histórias. Havia nas obras modernas o culto da tradição, de um projeto futuro, utópico, “indispensável para que a cultura – os homens – não avance às cegas. Eles acreditavam em coisas que a grande literatura nos pode dar: ampliação do imaginário, encontro com o outro e autoconhecimento, capacidade de impressão e de expressão, visão crítica do real (...)” (PERRONE-MOISÉS, 1998, p. 214).

Discutir uma literatura que está por se fazer é difícil, negar que os textos se modificaram e a grande maioria vai de encontro com a ótica capitalista de produção para a cultura de massa, é impossível. Um grande exemplo de escritor que escreve para a “massa” é, a meu ver, Paulo Coelho. A literatura deste autor se encaixa em muitos pontos apontados acima como produção para o mercado editorial com vistas à venda, por isso, ele é tido como um dos autores que tem mais livros vendidos no mundo (segundo o site www.Paulocoelho.com.br ele vendeu mais de 135 milhões de cópias, com obras traduzidas para 67 idiomas em mais de 150 países), além disso, teve uma obra adaptada para o cinema, Veronika decide Morrer, em 2009.
Eu não estou julgando nenhum autor ou obra, apenas quero mostrar a vocês algumas tendências da literatura contemporânea produzida. Como leitor, a literatura moderna me chama muito mais atenção, acho realmente que esteticamente ela é muito mais rica e ideologicamente é mais engajada com o desejo de se mudar a realidade. No entanto, como essa coluna que escrevo é dedicada a uma discussão, lanço uma pergunta que espero que fique latente no interior de cada um de vocês: A literatura brasileira contemporânea está mais preocupada com vendas, adaptações do que realmente com o artefato literário, com a imaginação, com a estética e com a luta por um mundo melhor?

Cabe a cada um pensar, meditar e, principalmente, LER para responder a este questionamento. Muitos podem concordar com os apontamentos feitos por mim, outros podem discordar. Podemos fazer uma saudável discussão, que pode ou não chegar a um consenso, mas que com certeza enriquecerá nossa visão crítica em relação, inicialmente, à Literatura brasileira, mas que pode ser estendida a grande parte da literatura em geral.












Rodrigo C. M. Machado é Graduando em Letras pela Universidade Federal de Viçosa e, neste momento, pesquisa a representação dos corpos na poesia de António Botto.

4 comentários:

Sheila Duarte disse...

Sobre esta discussão me vem uma reflexão a de que estamos numa sociedade do aqui e agora e sob a ditadura do ter. Vc é aquilo que acumulou e se não acumula ou não acumulou, sua crítica soa como despeito ou frustração. Este imediatismo e superficilaidade acaba refletindo na literatura porque estamos imersos nesta realidade ou porque já somos parte dela, estamos impregnados desse olhar, nos perdemos e estamos nos distanciando de valores existenciais, de projetos pessoais e sociais, perdendo conteúdo e ficando cliches. Você escreve para o mercado porque passa a ser lógico que o que se escreve é mercadológico, e como mercadoria tem que atender às necessidades do público, que na verdade se funde com a necessidade do autor. Enfim, o autor parece não transcender sobre si mesmo e o que deveria ser a sua obra. A maldição do sinal dos tempos??!!

4 de agosto de 2010 às 09:21
Rodrigo Machado disse...

Cara Sheila,outro problema que ocorre nos tempos contemporâneos é a cultura ser moldada pela sociedade (pela massa) e não o contrário. Na verdade, acho que cultura e sociedade deveriam se influenciar mutuamente,porém, com a sobreposição de uma em relação à outra, encontramos um desequilíbrio.
A sociedade quer bens de fácil consumo, descartáveis, simplistas e o pior que é isso que a cultura de hoje está a oferecer. Talvez se os bens culturais fosem um pouco mais elaborados, a sociedade mudaria sua forma de visão sobre o mundo para compreendê-los. Hoje, não há formação do sujeito crítico, nem mesmo nas escolas, por isso, muitas vezes nos deparamos com pessoas que agem de maneira passiva no tocante às informações, músicas, propagandas. Alguém que não consegue dizer não ao imposto pela TV, pelo cinema, por exemplo.

9 de agosto de 2010 às 08:29
J. P. V. Brito disse...

Acho que o debate poderia sair do discurso superficial de dizer que a literatura contemporânea é produzida de forma a atender "apenas" a interesses comerciais. Colocar esta visão como paradigma é, no mínimo, reduzir a produção atual a interpretações rasas. Vale lembrar que a literatura contemporânea começa mais ou menos na década de 60, com Rubem Fonseca entre um de seus maiores expoentes.

É claro que o caos urbano, a pulsação da metrópole, e a abordagem das experiências humanas como processos vazios de sentido, de uma certa forma, acabaram pautando a temática das produções recentes. Talvez, o realismo tenha realmente se convertido na grande escola literária do Brasil do século XX (agora sem o viés escatológico das produções de 1800), mas acho que os argumentos apresentados neste ensaio carecem de maior aprofundamento.

Colocar a produção dos autores contemporâneos num plano homogêneo é partir de uma ideia, no mínimo, equivocada.

24 de junho de 2012 às 20:00
Rodrigo Machado disse...

Acredito que por estarmos vivendo na contemporaneidade seja difícil estabelecer uma opinião que não seja contestável. Óbvio que nem tudo se adéqua ao que foi falado no artigo anterior, mas, no caso das obras citadas,acredito que seja verdadeiro.
Quanto aos interesses comercias, acho que a maioria das obras, hoje, é voltada sim para interesses comerciais, basta ver a maioria das listas de livros "Mais vendidos" que estão em sites e revistas. A própria forma Romance surgiu a fim de atender ás exigências da burguesia em ascensão...
Sua opinião e a minha não estão certas ou erradas, são discussões que devem pautar o contemporâneo exatamente por ele ainda estar em formação.

24 de junho de 2012 às 22:12

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