quarta-feira, 4 de maio de 2011

Bin Laden: temos tantos motivos a comemorar?


Estou viajando em uma praia distante, na noite de domingo, assistindo um filme de ação, sou interrompida pelo plantão Globo com o Zeca Camargo falando da morte de Osama Bin Laden. Até nesse lugar que estou no dia seguinte só se ouvia falar sobre isso: telejornais, sites, boca a boca. As imagens dos americanos comemorando foi a que mais me marcou. Será que temos tantos motivos para isso?



Não que eu seja insensível as declarações de pais/ mães e parentes de vítimas que clamavam todos esses anos por justiça. Justiça seja feita (e foi). O que me causa o pessimismo é pensar na natureza do terrorismo, de se variar os alvos, de se matar pessoas inocentes, geralmente civis, em nome da visibilidade de uma guerra que diz contraditoriamente santa, mesmo utilizando os métodos violentos que utiliza.

O meu contato com a bibliografia do terrorismo tangencia meu tema principal, o nazismo. Suas convergências estão no modelo "extremo" que acham soluções radicais para problemas político sociais e o uso sistemático do terror como base, como doutrina. Ambos igualmente me assustam, sobre ambos ainda vejo poderosos elementos que permeiam o tecido social das complexas sociedades contemporâneas que ainda não resolveram problemas das minorias, dos nacionalismos, das desigualdades culturais, religiosas, políticas, econômicas. O terrorismo age no micro-poder foucaultiano, o nazismo na esfera do estado. Matar Bin Laden é um ponto importante no combate ao terrorismo? Matar o ícone atinge o movimento? Se sim, alcança por sua vez suas causas? Duvido.



O que fazer então? Estamos com as mãos atadas frente aos tentáculos? Será que uma política de estado, serviço de inteligência terminaria com a onda terrorista? Diminuiria as mortes de inocentes? Difícil dizer, mas importante ressaltar que devemos sempre estar atentos ao reverso das políticas globalizadas, não devemos ignorar o problema, nem festejar antes da hora.

Wellausen, em uma interesante análise sociológica, disponível aos leitores atentos pela internet, afirma, citando Norberto Bobbio:

O terrorismo, como recurso comum à violência, distingue situações diversas, conforme seu peso político. Tanto pode ser um instrumento de governo para se manter no poder, quanto de libertação nacional em nações dominadas; de uma forma ou de outra, o terrorismo é sempre a quebra da ordem imposta pelo poder dominante.

No caso dos atentados de 11 de setembro, o ataque se contra um modo de civilização, o ocidental, simbolizado na força e poderio da nação hegemônica dos Estados Unidos.


Continua o autor:
O êxito do ato terrorista, enquanto violência qualitativa, reside nas estratégias da ação pontual: o “atentado” concentra-se num ponto limitado no tempo e no espaço, apanhando de surpresa a multidão anônima e passante, e que pode ser praticado pelos indivíduos dessa mesma população.

Observem as características que especificam esse tipo de movimento: violento, quantitativo, elemento surpresa, anonimato. É uma combinação explosiva para quem quiser combater. O autor afirma também que sua esfera de atuação circunda-se na afirmação política. Vejamos como já ganhamos mais um indício no fragmentado quebra-cabeças. Carece de afirmação quem não tem identidade, ou quem age como se seu perfil identitário fosse o único?

O cultivo do ódio é feito há muitos séculos na história das civilizações. Mesmo depois do sangrento século XX, marcado pelas duas grandes guerras, me parece que ainda não encontramos seu antídoto. Tateamos ainda nas suas controvérsias.

Leia mais:
WELLAUSEN, S. O terrorismo e os atentados de 11 de setembro. Tempo Social - Revista Sociologia da USP, out. 2002.




Coordenadora da Contemporartes - Revista de Difusão Cultural

Laboratório de Estudos e Pesquisas da Contemporaneidade

Núcleo de Ciência, Tecnologia e Sociedade - UFABC

0 comentários:

Postar um comentário

Seja educado. Comentários de teor ofensivo serão deletados.