Balões Coloridos
Um jovem casal teve seu primeiro filho – muito doente, com reduzidas chances de sobreviver. Os pais receberam a notícia logo após o nascimento. Poucos meses, talvez semanas ou dias apenas, teriam a oportunidade de conviver com o pequeno Gabriel, que foi esperado com tanto amor.
Sabendo de seus dias contados, os dois pediram licença do trabalho e dividiram as vinte e quatro horas do dia de forma que ambos ficassem com o bebê, e eles – apenas eles – cuidassem do frágil recém-nascido. Com muita dificuldade para mamar, o pequeno precisava ser alimentado a cada hora do dia e da noite, com apenas alguns poucos mililitros do leite materno que a mãe produzia e, cuidadosamente, retirava e armazenava, num processo doloroso e demorado, pois ele não tinha forças nem para mamar suas gotas de vida...
Em nenhum momento os pais reclamaram de cansaço. Em nenhum momento brigaram sobre quem teria que trocar a próxima fralda ou dar a próxima mamadeira. Nem discutiram quem se levantaria no meio da noite. Muitas mães sentiram-se péssimas, por reclamarem que o filho, saudável, já queria mamar de novo, ou porque a criança derrubou a chupeta no chão... Fez-me lembrar de todos os momentos em que me sinto irritada com os tantos afazeres que a maternidade nos transfere, os familiares exigem e os amigos esperam. Nós valorizamos o que não merece, como um carro quebrado ou o desejo por um novo computador, e nos esquecemos de agradecer o que realmente é uma dádiva. Reclamamos das nossas tarefas diárias com os pequenos como se fossem fardos e nos esquecemos daqueles que não tem um teto, comida na geladeira ou roupas para aquecer os filhos no inverno impiedoso.
A história do jovem casal também me mostrou que tudo na vida é passageiro e rapidamente desaparece se nós não atentarmos a cada segundo e não vivê-los intensamente. E que, no final da vida, não adiantará mais ter aprendido essa importante lição, pois o tempo passado é tempo vivido, ou tempo perdido. Não existe meio-termo. Não se vive mais ou menos. Não se arrepende mais ou menos. Ou estamos presentes, inteiros, naquele momento, ou nunca mais poderemos alcançá-lo.
No dia do velório do anjo que repousava no pequeno caixão branco, os pais não estavam desolados. Estavam tristes, mas tranquilos. Estavam conscientes de que haviam feito o melhor que lhes era possível. Haviam amado cada segundo, cada suspiro, cada lágrima e cada sorriso daquele frágil ser. Cada dia de vida foi uma vitória, resultado de total dedicação. E soltaram 99 balões coloridos, um para cada dia de vida do bebezinho, com quem tiveram o privilégio de conviver naqueles poucos meses. Todos os presentes olharam para o céu, refletindo sobre o quanto a vida é frágil e o nosso destino pode mudar num piscar de olhos.
E – como o passado – os balões ficaram inacessíveis, desaparecendo no céu azul, levando a alma do pequenino Gabriel para além das nuvens. Lindos, se foram e nunca mais foram vistos. Restou apenas a lembrança de um misterioso céu, imprevisível como só a vida pode ser, e de balões que representavam cada dia vivido no amor incondicional.
Simone Alves Pedersen nasceu em São Caetano do Sul e hoje mora em Vinhedo, SP. Formada em Direito, participa há três anos de concursos literários, tendo conquistado inúmeros prêmios no Brasil e no exterior. Tem textos publicados em dezenas de antologias de contos, crônicas e poesias. Escreve para jornal, revista e diversos blogs literários. Escreveu o primeiro livro infantil em 2008, o “Vila felina” seguido de Conde Van Pirado, Vila Encantada, Sara e os óculos mágicos, Coleção Pápum e Coleção Fuá. Para adultos lançou “Fragmentos & Estilhaços” e “Colcha de Retalhos” com poemas, crônicas e contos: http://www.simonealvespedersen.blogspot.com
1 comentários:
Simone, como é a vida... Em 2008 meu irmão e cunhada tiveram o João Gabriel, que viveu poucos dias também... Sem palavras... Em 2010, nasceu a Gabriela, de 7 meses, que preocupou muito a família, mas hoje está com 1 ano e 2 meses, linda, saudável e superamada. Beijo do amigo
27 de julho de 2011 às 10:55Postar um comentário
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