sábado, 29 de outubro de 2011

Mário de Andrade e a modernização de São Paulo



Na obra Paulicéia Desvairada, Mário de Andrade retrata as modificações pelas quais a cidade e a sociedade paulista se submeteram (ou foram submetidas?) com o advento do modernismo. Nesta obra o eu e a cidade nem sempre são retratados de maneira dissociada, existe , então, uma poesia de um poeta de vários eus, que procura se encontrar em meio a tantas mudanças. Ele retrata as alterações que ocorrem na sociedade, de maneira desvairada, na medida em que a Cidade de São Paulo foi submetida a um processo de mudança estrutural e social com certa rapidez, em um ritmo alucinado de crescimento. Como observamos na estrofe seguinte do poema “Paisagem N.4”:

Os caminhões rodando, as carroças rodando,
rápidas as ruas se desenrolando,
rumor surdo e rouco, estrépitos, estalidos...
E o largo côro de ouro das sacas de café!...
(ANDRADE,1922, p.115)

Nessa passagem do poema, podemos vislumbrar a maneira pela qual a cidade moderna cresce e se desenvolve de maneira rápida e acelerada. De maneira que o antigo (as carroças) convive com o novo (o caminhão), este faz com que a as ruas (o crescimento) rápidas se desenrolem.

No Prefácio Interessantíssimo, que acompanha a obra, o autor apresenta a maneira como escreveu seus poemas, e o que nos interessa aqui é analisá-lo por uma perspectiva de busca do social.

Inicialmente, nos é apresentado em tal prefácio a frase “Está fundado o Desvairismo” (ANDRADE, 1922, p.7). No momento em que esta frase é escrita, há uma espécie de documentação do marco inicial do desvairismo, do ritmo alucinado a que a sociedade está submetida e que agora se passa também em relação à Literatura. A sociedade e a cidade estavam se modernizando, dessa forma, o ritmo de vida se acelerava com construções, alargamentos de ruas, oferta de empregos, trânsito, industrialização dentre outros elementos que denotam progresso. Essa rapidez é retratada também no prefácio quando Mário (1922) diz “Quando sinto a impulsão lírica escrevo sem pensar tudo o que meu inconsciente grita” (ANDRADE, 1922,p.8), a escrita, então, deixou de ser um processo lento e demorado, e passou a figurar como algo que surge rapidamente como inspiração e deve ser registrado de maneira imediata.

Mário de Andrade (1922) ao dizer: “Sou passadista, confesso. Ninguém pode se libertar duma só vez das teorias-avós que bebeu” (ANDRADE, 1922, p. 9), deixa de negar o passado e passa a modificá-lo. Ou seja, acredita na transformação do passado, na utilização de formas literárias do pretérito para a construção de outras novas. Ao fazermos uma ponte entre essa ideia do autor e os acontecimentos que se davam na sociedade, poderemos observar que na sociedade passado e presente conviviam de modo a se vislumbrar o futuro. Ou seja, não se poderia descartar a cultura do passado, mas sim modificá-la de acordo com as necessidades da coletividade. 


Notamos que o fazer poético de Mário de Andrade está relacionado diretamente à idéia de fundar e estabelecer o movimento modernista no Brasil, com elementos brasileiros. Para tanto ele utilizada subjetividade do eu - lírico para retratar os sentimentos, impressões e desejos eu possui em relação ao moderno e à cidade em transformação veloz.

Por mais que se pense que a subjetividade do eu - lírico Mário-andradiano ofusque toda a objetividade da transformação poética, ambas estão internamente ligadas, já que é a visão do eu sobre o mundo. Como nos diz Adorno (2003), por mais que o autor tente fazer uma obra individualizada e individualista, sua obra é dotada de caracteres que criam vínculos universais, que por sua vez se dirigem a toda humanidade. Ele ainda nos profere que para que um autor determine o teor social de sua obra, é necessário não somente conhecê-la por dentro, mas principalmente a sociedade que fora dela está. 









Rodrigo C. M. Machado é mestrando em Letras, com ênfase em Estudos Literários, pela Universidade Federal de Viçosa. 

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