sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Adeus forró, vou ouvir Arautos do Rei: Identidade Cultural, Música e Religião


Katia  Peixoto dos Santos/ Fernanda Vidal .
Como é difícil para nós brasileiros, pensarmos nossa identidade cultural. Se fizermos um recorte nesta história toda, temos, para começo de conversa, grandes influências de várias etnias que fizeram parte no nosso processo de colonização. Nossos antepassados  imprimiram traços fortes na nossa forma de agir, pensar, vestir, etc. Porém, a todo instante novas influências surgem, acentuadas pelos processos de êxodos ocorridos no decorrer dos tempos, pelas imigrações e migrações oriundas de inúmeras motivações, pelas mídias e pela ampliação das Redes Sociais, You Tube, Google...  São tantas as possibilidades de crenças, valores e modos de viver que herdamos de distintas culturas, que o conflito se estabelece e é visível na nossa formação de comportamentos, de ações e reações, de intenções, e por ai vai. Somados a tudo isso temos ainda as diferenças sociais,  intelectuais, religiosas que também imprimem sentidos na nossa forma de agir e pensar e que estão muitas vezes dissociados. Um exemplo disso é o número de casamentos em igrejas realizados por pessoas que não costumam frequentar tais igrejas.
A música  tem um papel fundamental na formação da identidade de um povo. Este é um processo de mão dupla, ou seja, tanto as músicas que ouvimos desde criança podem influenciar nossos gostos e costumes ou, por outra via, se começarmos a ouvir músicas  inéditas para nós, podemos mudar nosso comportamento, nossas crenças e valores mediante as mensagem musicais oferecidas.
O Brasil é um pais imenso, um gigante que tem culturas regionais bem diversas. Cada estado brasileiro tem suas comidas prediletas, suas expressões artísticas e idiomáticas, suas danças, músicas, artesanato, que por sua pluralidade, podem surpreender qualquer brasileiro que não convive naquela cultura.
Mas, quando se vive em São Paulo, essa enorme metrópole, ficamos ainda mais suscetíveis a agregar novas formas de vidas e valores às nossas próprias vidas. Aqui a confluência destas culturas, regionais, mundiais e digitais, se mesclam e se convergem.  Estes processos, digamos, de aculturação, são constantes e ininterruptos. Depois da Grande Segunda Guerra Mundial, o Estados Unidos ganhou projeção em várias partes do mundo e seus valores religiosos, econômicos e comportamentais formam se expandindo pelos quatro cantos do mundo, e não foi diferente aqui no Brasil.
Na Faculdade de Música da FAC-FITO, em nossos estudos sobre culturas populares e étnicas, visualizamos como a religião e a música se integram e como podem mudar o comportamento e os costumes de um grupo.
Na coluna de hoje, Fernanda Vidal vai falar sobre a influência que o grupo Arautos do Rei, Grupo musical da Igreja Adventista do Sétimo Dia que ganhou vários prêmios nacionais e tem destaque internacional, teve em sua vida. Atualmente estão em sua 26° formação com os músicos: Milton, Ozéias, Tarsis e Jairo. A primeira formação do grupo aconteceu nos EUA, que foram os precursores do estilo musical  A Cappella, aqui na América. O grupo de formação americana, iniciado no ano de 1927, com o titulo de The King's Heralds, realizavam suas apresentações principalmente no programa A voz da Profecia. Uma edição brasileira do programa, com mesmo nome, foi montada e pedia um grupo nos mesmos moldes dos norte americanos. Assim, o quarteto Arautos do Rei,  era a versão em português que surgia em um programa também chamado A voz da Profecia,  produzido pela Igreja Adventista do Sétimo dia, desde 1943. 
Fernanda Vidal, aluna do primeiro semestre da Faculdade de Música, conta-nos um pouco de sua experiência com o grupo Os Araustos do Rei e como trocou o forrô pelos Arautos,  mudando seus hábitos comportamentais.

PROCESSOS DE ACULTURAÇÃO
Fernanda Vidal

Ao apresentar esse trabalho busquei pontuar uma única palavra, aculturação. Relatei um pouco da minha experiência pessoal a respeito dos processos culturais vivenciados por mim no período da adolescência, revivendo a forma que entrei em contato com a religião e como este fato influenciou a música que ouvia. Ao ler o livro Cultura, de Waldemir Caldas, entendi que poderia fazer uma ponte a respeito dos temas estudados no livro e o que vivi em minha adolescência.


Meu primeiro contato com o grupo Arautos do Rei ocorreu no inicio da minha adolescência, aos 11 anos de idade, quando minha família e eu ingressamos numa igreja Batista. Imediatamente, após nos engajarmos nos trabalhos eclesiásticos, nossa realidade musical mudou drasticamente. Nas festas de Natal não havia mais o tradicional forrô para dançar pois as cantatas dos Arautos, com direito a teatro e figurino, preenchiam toda a festa natalina, sons até então estranhos para mim.  Os convidados também mudaram. A ceia passou a ser com os irmãos da igreja, com todos reunidos no templo da igreja. De fato, essa nova sonoridade entrou em minha vida assim, meio de repente. Hoje sou casada e tenho um filho de três anos que gosta e pede para ouvir Arautos.
O que foi um grande choque na época, agora faz parte de mim. Quando ouço algumas canções mais antigas dos Arautos, posso sentir o cheiro dos bancos da pequena capela que frenquentava, construída em meados da década de 1980.
O mais interessante de tudo é perceber o processo de aceitação de cada membro da minha família, com a mesma experiência, no mesmo contexto mas com processos diferentes de assimilação desta nova ordem cultural de nossa casa. Ainda me lembro de minha mãe dizendo sobre seu desespero ao ver meu pai apreciando e ouvindo seu disco vermelho aos domingos, sete horas da manhã, enquanto acordávamos para ir à escola bíblica. Ela, minha mãe, até hoje não suporta. Acostumou-se, é verdade, mas nunca pegou nenhum LP para ouvir.
Acredito que assim acontece com todo processo de aculturação, essa injeção na veia, o choque de culturas, costumes, crenças etc. Mas o que levo de tudo isso resume-se em outra palavra: Tolerância.
Não nos cabe sentenciar juízo de valor, não me cabe medir experiências alheias em comparação às nossas, mesmo com todo o contexto envolvido nos processos.


* Fernanda Vidal de Meneses aluna da FAC-FITO, cursando Licenciatura em música. E-mail: nanda.musicoterapia@yahoo.com.br
Referências bibliográficas: www.novotempo.com.br


 Kátia Peixoto é doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP. Mestre em Cinema pela ECA - USP onde realizou pesquisas em cinema italiano principalmente em Federico Fellini nas manifestações teatrais, clowns e mambembe de alguns de seus filmes. Fotógrafa por 6 anos do Jornal Argumento. Formada em piano e dança pelo Conservatório musical Villa Lobos. Atualmente leciona no Curso Superior de de Música da FAC-FITO e na UNIP nos Cursos de Comunicação e é integrante do grupo Adriana Rodrigues de Dança Flamenca sob a direção de Antônio Benega.


1 comentários:

discutindo educação e história disse...

Entendo que nossa identidade é o multiculturalismo

4 de agosto de 2012 às 22:34

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