Genet e queerização
Essa coluna está sendo publicada às vésperas da estréia da peça “O diário de Genet”, no Festival de Teatro de Curitiba, um dos mais importantes do país. Essa peça é um mergulho no universo do autor francês Jean Genet (1900-1986) e em autores que d’alguma forma colaboram com os Estudos Culturais no entendimento que o binarismo de gênero é insuficiente para pensar as novas subjetividades contemporâneas. Somam-se, pois, textos e idéias de Eribon (2008), Sáenz e Carrascosa (2011) e Butler (2008).
Assim, a dramaturgia de “O diário de Genet” foi
construída negando a tradição logocêntrica, racional e linear que o texto tem
ocupado ao longo da história e se aproxima daquilo que alguns autores vem chamando
de não-dramático ao introduzir no formato do drama elementos alheios à estética
realista do drama. Segundo Baumgärtel (2011:03) essa é uma nova dramaturgia que
tenta substituir a lógica do realismo burguês não só por uma lógica
não-realista, mas por uma escrita com uma multiplicidade de centros”. Dessa
forma, o que fica claro é que em “O diário de Genet” outras vozes poderão
(deverão?) ser reconhecidas, afinal, como Silvana Garcia já defendeu num antigo
texto de 1995, esse tipo de dramaturgia revê “o papel preponderante do texto na
construção do espetáculo passando a tomá-lo como um suporte de maior
flexibilidade, passível de ser cortado, reorganizado em seus elementos internos
(...) incorporando subtextos (...) a serviço da construção de uma dramaturgia,
que é não apenas textual, mas cênica” (1995:19).
Esse processo de fragmentação, colagem e desmontagem
colabora para transformar o texto em um portador de múltiplas vozes e instalar
um jogo dinâmico entre ficção e teoria. Esse foi um pouco o trabalho de
pesquisa realizado para a construção desse espetáculo – a multivetorização em
sua elaboração utilizando diversas fontes para alimentar e ampliar o escopo da
criação. Nele podemos perceber alguns aspectos da dramaturgia contemporânea,
como a importância do “aqui e agora”; o princípio da intertextualidade; o
trabalho da língua enquanto uma realidade polivocal e o abandono da abordagem
psicológica (BAUMGÄRTEL, 2011, 08).
Em “O diário de Genet” o público é convidado a
viajar com os atores pela nossa própria dificuldade em lidar com aqueles que –
parecem – não nos constitui e para perceber o que temos feito e como temos
tratado os diferentes, a como Genet, como eu, como tantos e nessa viagem,
entender os deslocamentos, os descentramentos e a insuficiência do gênero para
pensar categorias como homo ou heterossexualidade.
Djalma Thürler é Cientista da Arte
(UFF-2000), Professor do Programa de Pós-Graduação Multidisciplinar em
Cultura e Sociedade e Professor Adjunto do Instituto de Humanidades,
Artes e Ciências da UFBA. Carioca, ator, Bacharel em Direção Teatral e
Pesquisador Pleno do CULT (Centro de Estudos Multidisciplinares em
Cultura). Atualmente desenvolve estágio de Pós-Doutorado intitulado
“Cartografias do desejo e novas sexualidades: a dramaturgia brasileira
contemporânea dos anos 90 e depois”.
1 comentários:
Djalma, seus espetáculos são sempre fulcrais, falam a alma e tem um elo com o cotidiano que chega a assustar... adoro sua intensidade. bjs Ana Diet
5 de abril de 2013 às 15:50Postar um comentário
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