sexta-feira, 5 de abril de 2013

Genet e queerização

 
Essa coluna está sendo publicada às vésperas da estréia da peça “O diário de Genet”, no Festival de Teatro de Curitiba, um dos mais importantes do país. Essa peça é um mergulho no universo do autor francês Jean Genet (1900-1986) e em autores que d’alguma forma colaboram com os Estudos Culturais no entendimento que o binarismo de gênero é insuficiente para pensar as novas subjetividades contemporâneas. Somam-se, pois, textos e idéias de Eribon (2008), Sáenz e Carrascosa (2011) e Butler (2008). 


Assim, a dramaturgia de “O diário de Genet” foi construída negando a tradição logocêntrica, racional e linear que o texto tem ocupado ao longo da história e se aproxima daquilo que alguns autores vem chamando de não-dramático ao introduzir no formato do drama elementos alheios à estética realista do drama. Segundo Baumgärtel (2011:03) essa é uma nova dramaturgia que tenta substituir a lógica do realismo burguês não só por uma lógica não-realista, mas por uma escrita com uma multiplicidade de centros”. Dessa forma, o que fica claro é que em “O diário de Genet” outras vozes poderão (deverão?) ser reconhecidas, afinal, como Silvana Garcia já defendeu num antigo texto de 1995, esse tipo de dramaturgia revê “o papel preponderante do texto na construção do espetáculo passando a tomá-lo como um suporte de maior flexibilidade, passível de ser cortado, reorganizado em seus elementos internos (...) incorporando subtextos (...) a serviço da construção de uma dramaturgia, que é não apenas textual, mas cênica” (1995:19).


Esse processo de fragmentação, colagem e desmontagem colabora para transformar o texto em um portador de múltiplas vozes e instalar um jogo dinâmico entre ficção e teoria. Esse foi um pouco o trabalho de pesquisa realizado para a construção desse espetáculo – a multivetorização em sua elaboração utilizando diversas fontes para alimentar e ampliar o escopo da criação. Nele podemos perceber alguns aspectos da dramaturgia contemporânea, como a importância do “aqui e agora”; o princípio da intertextualidade; o trabalho da língua enquanto uma realidade polivocal e o abandono da abordagem psicológica (BAUMGÄRTEL, 2011, 08).


Em “O diário de Genet” o público é convidado a viajar com os atores pela nossa própria dificuldade em lidar com aqueles que – parecem – não nos constitui e para perceber o que temos feito e como temos tratado os diferentes, a como Genet, como eu, como tantos e nessa viagem, entender os deslocamentos, os descentramentos e a insuficiência do gênero para pensar categorias como homo ou heterossexualidade. 


Djalma Thürler é Cientista da Arte (UFF-2000), Professor do Programa de Pós-Graduação Multidisciplinar em Cultura e Sociedade e Professor Adjunto do Instituto de Humanidades, Artes e Ciências da UFBA. Carioca, ator, Bacharel em Direção Teatral e Pesquisador Pleno do CULT (Centro de Estudos Multidisciplinares em Cultura). Atualmente desenvolve estágio de Pós-Doutorado intitulado “Cartografias do desejo e novas sexualidades: a dramaturgia brasileira contemporânea dos anos 90 e depois”.

1 comentários:

Unknown disse...

Djalma, seus espetáculos são sempre fulcrais, falam a alma e tem um elo com o cotidiano que chega a assustar... adoro sua intensidade. bjs Ana Diet

5 de abril de 2013 às 15:50

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