terça-feira, 12 de novembro de 2013

JULIA WANDERLEY: O IDEAL REPUBLICANO e a INVENÇÃO da MULHER PROFESSORA


Nesta semana trazemos a contribuição de Silvete Crippa Araujo, doutoranda em Educação pela UFPR, que se debruçou sobre o estudo da personagem Julia Wanderley (1874-1918), considerada pioneira como professora, atuou também como fotógrafa amadora, embora as pesquisas sobre essa última atividade ainda estejam em curso. Mas sabe-se com certeza que ela fotografou o cotidiano de Curitiba na época em que viveu e colecionou um grande número de imagens que se encontram hoje arquivadas na Casa da Memória, em Curitiba. Com a palavra, a autora:

"A pesquisa sobre Julia Wanderley, professora e normalista inserida no grupo de trabalho História da Educação, apresenta alguns resultados de uma investigação que se vislumbrou numa dissertação de mestrado realizada na UFPR defendida em 2010. O presente trabalho tem o objetivo de realizar uma discussão sobre um período da História da Educação em que a formação da professora primária, através da Escola Normal, foi constituída enquanto uma representação da redentora da sociedade brasileira. O período estudado é o do final do século XIX e início do XX em Curitiba, Paraná. Neste cenário de mudanças (fim da escravidão, instalação da república, industrialização, imigração) se torna fundamental compreender a trajetória histórica de Julia Augusta de Souza Wanderley, estudante, normalista e professora que viveu em Curitiba no período de 1874 a 1918.

Não será possível estudar Julia Wanderley isolada de seu tempo e espaço de atuação, portanto, sua história de vida foi problematizada considerando o contexto da época em que viveu nossa protagonista, focando a personagem Julia Wanderley como objeto de pesquisa de maneira dinâmica e simultaneamente relacionando-a a institucionalização da instrução pública primária e secundária no Paraná ou e mais especificamente a feminização no magistério.

Retrato de Julia Wanderley- acervo da escola que leva o mesmo nome.

Julia Wanderley atuou como docente em Curitiba, reconhecida no Paraná como a primeira mulher a participar presencialmente do curso normal na capital do Estado. Trabalhou como professora primária durante o final do período imperial, passando no período republicano a ser também diretora do Grupo Escolar Tiradentes e membro do Conselho Superior do Ensino primário. Nesse período, Curitiba como outras cidades brasileiras, sofria um imperioso recrutamento de profissionais femininas para atender a difusão da educação entre uma população de origens e hábitos diversificados.


Nas primeiras décadas do século XX, uma nova cultura escolar vai se efetivando, com a presença das massas e das mulheres na escola, é neste contexto que se configura a pessoa de Julia Wanderley, inserida numa sociedade que deseja se constituir através do ideal de progresso e da ordem, com a pretensão de utilizar a escola pública primária, na pessoa da professora, como um agente de modernização e civilização. Esta pesquisa, portanto, tem um duplo movimento, o de tentar perceber os aspectos atrelados à mulher e a professora no final do século XIX e início do século XX, relacionados à trajetória de vida de Julia Wanderley, bem como delinear de que maneira se deu a construção da profissão feminina no magistério com apoio republicano. Ressaltando que o passado humano não é um agregado de histórias separadas, mas uma soma unitária do comportamento humano. 


Foram utilizadas nesta pesquisa como fontes documentos primárias e secundárias, alguns jornais da época em que Julia Wanderley viveu e posteriores, fotografias, impressos, relatórios escolares, caderno de notas e recortes de Julia Wanderley, biografias construídas sobre ela, entre outros. É importante assinalar que não é pretensão deste trabalho reconstruir o que os silêncios e as memórias calam, mas procurar compreender os relacionamentos, as tramas, as continuidades e descontinuidades, os limites que rompem ou unem as tramas vividas, procurando assim construir uma unidade aparente de vida da nossa atriz social.

Os anos finais do séc. XIX e iniciais do séc. XX apresentaram transformações significativas no Brasil em termos de uma nova mentalidade a respeito da entrada da mulher no magistério atrelada a novas legislações, organização e gestão do ensino primário e do Ensino Normal. Julia Wanderley, uma professora que é considerada no Paraná como a primeira mulher a participar presencialmente do Curso Normal na capital do Estado viveu nesse período de mudanças. Rememorada como mulher atuante no âmbito educacional, Julia Wanderley deixou poucos escritos específicos sobre educação, ou sobre temas políticos, e educacionalmente comprovadas por suas ações e seus discursos, ou seja, por suas próprias publicações nos veículos de comunicação da época. Personagem histórica, esta mulher e professora, teve sua memória construída e projetada como um mito da professora paranaense modelo.

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Julia Augusta de Souza Wanderley nasceu no dia 26 de agosto de 1874 em Ponta Grossa cidade da província do Paraná, uma província ainda jovem, instalada em 19 de dezembro de 1953, que buscava se firmar no cenário político e econômico do Brasil imperial. Como declarou Jesuíno Marcondes, auxiliar na administração provincial do primeiro presidente, Zacarias de Góes e Vasconcelos: “teremos muito que trabalhar para atender às necessidades do nosso aparelhamento econômico”, Marcondes delineava as grandes necessidades que precisavam ser atendidas: o estabelecimento de estradas que facilitassem as comunicações e diminuísse as despesas com transporte de pessoas e cargas (especialmente a erva-mate e o gado, as maiores riquezas da região) e a instrução pública para ricos e pobres.

Em Ponta Grossa, Julia Wanderley foi homenageada, no ano do centenário do seu nascimento, passando a figurar como nome da rua em que nasceu, assim como em Curitiba também existe uma rua com seu nome e também um colégio do estado. O historiador e professor Davi Carneiro, em artigo escrito para o jornal curitibano Gazeta de Povo, em 2 de agosto de 1974, na coluna “Veterana Verba” ao se referir à personalidade de Julia Wanderley, salienta uma característica que a professora teria herdado da mãe, a afetividade. Esse discurso é próprio para a época, coerente com o ideal republicano de representação do ser feminino, ideal este, que se pretendia hegemônico. Neste contexto, é extremamente necessário reforçar a figura ‘mítica’ da mãe tutelar e pacificadora, “valoriza-se a imagem da mãe, doce e protetora, garantia e confiança de que tudo está bem”. 

É perceptível, tanto neste documento como em outras fontes consultadas, a importância dada à afetividade de Julia Wanderley, adjetivo propício à formação da mulher pública, mas que deveria ser polida. Julia Wanderley se mostra como um padrão de mulher, especialmente um ‘padrão republicano’, que segundo Trindade (1996, p. 35), “ao mesmo tempo em que prega o estigma da mulher liberada ou mesmo pública a insere nos planos do Estado, por um viés patriótico e sentimental”. Julia Wanderley incorporou este modelo, mesmo porque, cresceu num lar em que o pai pertencia ao movimento republicano, e provavelmente seus filhos beberam da mesma fonte ideológica.

A identificação de Julia Wanderley como mãe amorosa e professora meiga, vai reforçar o mito da mulher ideal, instigando sorrateiramente o aprimoramento moral e a transmissão das virtudes femininas. Através deste exemplo de caráter, inspirado nos moldes da república em vigência, se dará o fortalecimento da imagem de uma mulher ideal, neste caso Julia Wanderley, modelo que será inculcado através de seus biógrafos e memorialistas, a fim de atingir e mobilizar uma ampla camada da sociedade, em especial as mulheres e professoras.

 O pai de Julia Wanderley é descrito por Herbert van Erven, como um homem de grande mobilidade geográfica e mental, que está sempre na busca de algo prazeroso, de liberdade, com um toque de artista. Possivelmente venha do pai, mas não só dele, o estímulo para que Julia Wanderley fosse atrás de seu ideal de ser uma professora normalista e lutasse por isto, ela vai à busca da igualdade, isto é, no seu desejo de se tornar uma normalista, aproveitando as redes de relações que possuía, pede permissão para frequentar as aulas na Escola Normal, como faziam os meninos da época.  Fortalecida pelo discurso do dom de ensinar, e pela necessidade de formar mais professores para atuarem no ensino primário, ela consegue ser aceita.

Evidencia-se que Julia Wanderley tinha um círculo de relações bem estreito entre algumas personalidades de Curitiba, como: Romário Martins, Sebastião Paraná, entre outros que na época, buscavam ressaltar o estado do Paraná como um estado forte, que podia se igualar ou superar São Paulo e também que lutava por ampliar seus limites sobre santa Catarina, região rica em madeira e erva-mate. Próximo de completar sete anos, Julia Wanderley começa  a sua vida de estudante, num período em que Curitiba se desenvolvia, se urbanizava e se modernizava.

Julia Wanderley e seus pares cresceram educados no ideal nacionalista inspirado pela configuração de um país republicano e de estados independentes, mas que deviam ser fortes, urbanizados e modernizados. No Colégio Curitibano, onde Julia Wanderley estudou, frequentavam sujeitos que se tornariam personagens importantes no Paraná, entre eles Sebastião Paraná, professor e político influente no Paraná, editor da revista A Escola, Fundador do jornal A Tribuna entre outros feitos e Luiza Cândida Saldanha que em  1884, seria a primeira mulher da província a receber diploma de normalista, embora sem a participação presencial no Curso Normal, mas por exames prestados perante uma banca, seria a primeira mulher curitibana a receber o diploma de normalista.

Entre outros colegas de escola de Julia Wanderley figuravam Romário Martins,  jornalista que trabalhou em vários jornais de Curitiba, foi político, escritor e historiador; Ermelino de Leão deputado, escritor e historiador; João David Perneta, político de relevo paranaense, escritor e redator da tese da Comissão Especial de Legislação Social, relativa às mulheres e crianças e Artur Martins Franco, engenheiro, foi deputado estadual e federal, e um dos fundadores da Universidade Federal do Paraná.

Provavelmente o privilégio que teve de estudar em escolas consideradas “de elite”, proporcionou a Julia Wanderley estabelecer uma rede de relações com pessoas de nível cultural elevado, que se destacaram política e intelectualmente no Paraná. Estas pessoas, colegas de escola, desfrutaram dos ensinamentos de ‘bons mestres’, que traziam o ideal de nação, mesmo considerando que, a educação das moças da elite no período Imperial, era feita nas próprias casas ou nas casas grandes das fazendas, pelos pais ou preceptores, porém a partir da metade do século XIX a educação das meninas das famílias de recursos passaria a ser confiada aos colégios particulares leigos ou religiosos, mas mesmo a essas jovens privilegiadas eram reduzidas às opções escolares. 

Entretanto, é preciso considerar que, deixando de vivenciar apenas o que ocorreria no ambiente privado, que era até então o mais adequado às mulheres, mas frequentando instituições escolares de excelente reputação, como o Colégio Curitibano, ela expandiu seus horizontes intelectuais. Fica evidenciado através de alguns relatos, que a professora Julia Wanderley também tinha firmeza em sua prática pedagógica, muito provavelmente influência de seus professores, em especial por Nivaldo Braga. Podemos relacionar a menção de uma ex-aluna Maria Nicolas referendando os depoimentos sobre a firmeza e a justiça como valores profissionais de  Julia Wanderley atrelados ao seu comprometimento pedagógico.

Na plenitude de seus 15 anos de idade, estudará  no Colégio Nossa Senhora da Glória com o professor Justiniano de Melo e Silva, desde 15 outubro de 1889, onde  começa seus estudos secundários, até 06 de dezembro de 1889 quando retira-se de Colégio Nossa Senhora da Glória. O professor Justiniano foi também diretor geral interino da instrução pública da província, deputado e jornalista no Paraná, fundador e diretor do jornal Sete de Março, órgão oficial do Partido Conservador. Este fato chama atenção embora o pai de Julia Wanderley fosse republicano, ‘assumido’ desde 1885, quando se associa ao clube republicano, sua filha vai estudar com um político conservador, provavelmente fosse mais importante à qualidade e o ‘status’ da educação de sua filha do que as divergências políticas da época.

   De acordo com Trindade e Andreazza (2001, p. 66), o governo aprimorava seus serviços, “higienizava o centro urbano com irrigação, limpeza pública, água esgoto; implementava a arborização, e instalava a iluminação pública; criava inclusive a guarda-civil”, e a instrução do povo, de acordo com os ideais republicanos, precisava ser ampliada, as escolas primárias precisavam ser valorizadas tanto quanto o ensino secundário, em especial a escola normal, “que será parte de um projeto civilizador de sociedade, ..., onde o movimento pela educação feminina seria reforçado pelo Positivismo”. 

            Julia Wanderley respira essa atmosfera de mudanças ideológicas, políticas, sociais e educacionais e embalada por este sentimento patriótico e sentimental do dever feminino na consolidação de uma nação forte e pelo estigma da mulher pública, isto é, a mulher “embora liberada, ou mesmo pública, fosse uma ameaça sempre oposta aos desejos de emancipação da consciência ou da independência feminina”. (TRINDADE, 1996, p. 15). Mesmo nesta panorâmica Julia Wanderley vai requerer a 05 de setembro de 1890, exame para uma vaga no primeiro ano do curso normal.
  
            Pela pesquisa feita por Maria Lourdes Miró de Ferrante, no Documento sobre a vida e Obra de Julia Wanderley, referente ao ano do centenário do nascimento da professora, ela atesta o envio do requerimento por parte de Julia Wanderley ao Governo do Estado em 1890.  No documento feito a partir das anotações de Julia Wanderley, fica evidenciado que ela vai atrás de uma vaga para participar no Curso Normal público de Curitiba. Após prestar os exames preparatórios para participar do curso normal, foi aprovada, entretanto novamente o texto reforça o termo com distinção, o que reforça o ideal de mulher culta para a época. Ela irá requerer a matrícula para frequentar o Curso Normal até então frequentado por meninos, porém o número de alunos matriculados, tanto no Instituto Paranaense quanto na Escola Normal, não ultrapassava duas dezenas por ano. (TRINDADE; ANDREAZZA, 2001)

Na família de Julia Wanderley, o magistério era opção conhecida, para homens e mulheres, mas, no caso dos homens, algumas vezes temporária, provavelmente exercida nos dias piores ou como apêndice de outra atividade mais lucrativa. O trabalho no magistério no século XIX para os homens era mais comum que para as mulheres, porém muitas já trabalhavam como professoras das primeiras letras, sem ter a formação de normalistas. Na Curitiba republicana a escola primária era muito aclamada, e a educação nessa nova Curitiba, terá em seus defensores, os representantes de um ativo círculo literário, uma inquietação constante.

 A preocupação com a ampliação da rede escolar e com a formação docente será pauta contínua. Julia Wanderley, e seus pares, incorporaram tal inquietação, e ao que transparece é na prática pedagógica que Julia Wanderley vislumbrará a importância do magistério feminino. A feminização do magistério ocorreu rapidamente, tendo por parâmetro os moldes republicanos, que proporcionam uma determinada abertura, “pela valorização que o positivismo confere ao sexo feminino e pelas possibilidades de autonomia individual introduzida pelo pensamento liberal” (TRINDADE, 1996, p. 147). Porém o magistério feminino ainda estava muito atrelado à ideia de extensão da maternidade, onde cada aluno deveria ser visto com um filho espiritual, sendo desta forma o magistério representado como uma profissão de amor, de entrega, e doação. 


         É preciso considerar o quanto nesses tempos de valorização do curso normal e de incentivo a entrada das mulheres no magistério, seria muito bem vinda à nomeação de uma normalista para um cargo de direção escolar, além disso, eram poucos os normalistas (homens e mulheres) no Paraná. Em 1895, eram apenas 5 professores e 5 professoras formados pela Escola Normal atuando em escolas mantidas pelo governo paranaense. No mesmo ano, atuavam nas escolas públicas paranaenses, 65 professores e 121 professoras não diplomados no curso normal.

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            Julia Wanderley irá dirigir e também lecionar na Escola Tiradentes, uma escola que passará a ser de 1º e 2º graus, primária. Em 1901, com 27 anos, Julia Wanderley tornou-se regente da Escola de 2º grau primário para meninas, da Capital, que funcionaria anexa a Escola Tiradentes. Professora exemplar, Julia Wanderley não perdeu a oportunidade para se apresentar como mulher culta e dedicada, aproveitando a chance para lecionar noções de botânica, zoologia, anatomia e fisiologia por acreditar que esses conhecimentos eram importantes para a formação das estudantes, embora não estivessem incluídos no programa oficial.

            Em 1915 Julia Wanderley foi elevada a professora da classe mais graduada dos professores normalistas do Paraná, por ter mais de 20 anos de efetivo exercício do magistério público. No mesmo ano, foi nomeada membro efetivo do Conselho Superior do Ensino Primário do Estado e foi designada “professora e diretora da Escola Intermediária que funcionaria anexa ao Grupo Escolar Tiradentes. Portanto se legitimava no Paraná o curso normal para ambos os sexos, com a presença marcadamente feminina tendo na pessoa de Julia Wanderley a precursora das professoras normalistas do Estado.

Julia Wanderley consegue se formar no curso normal, e a partir daí irá trabalhar como professora normalista atuando no ensino primário e secundário, foi diretora do Grupo Escolar Tiradentes, também foi nomeada membro efetivo do Conselho Superior do Ensino Primário do Estado. Faleceu em 05 de abril de 1918 de neoplasma pelviano. Sua morte noticiada pelos jornais de Curitiba e de todo o Paraná, demonstra a relevância da circularidade exercida por ela no cenário político e educacional, o que deve ter suscitado aos seus amigos, colegas e admiradores a ideia de promover diversas homenagens na preservação de sua memória histórica.

        No aspecto pessoal, Julia Wanderley casou-se com com o escultor gaúcho, Frederico Petrich, e não tendo filhos, adotou o sobrinho Julio, nascido em 1901. Para ele Julia deixou um manuscrito sobre seus antepassados e uma importante coleção fotográfica, constituída principalmente de cartões postais.  Já sua atuação como professora, diretora e membro do Conselho de Superior se Educação durou pouco, pois, em agosto de 1917, Julia Wanderley adoeceu gravemente e solicitou afastamento, por três meses, de suas atividades escolares e do Conselho Superior do Ensino Primário do Estado. Em outubro do mesmo ano, tentou reassumir suas funções, mas não conseguiu. 

         Não voltaria a atuar profissionalmente. Faleceu no dia 5 de abril de 1918, assumindo a direção do Grupo Escolar Tiradentes uma ex-aluna de Julia Wanderley.  Não se pode negar a contribuição de Julia Wanderley para a institucionalização da presença feminina na escola normal do Paraná, mesmo que tenha sido uma adequação aos modelos e ideias republicanos.

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        Julia Wanderley foi uma mulher de classe média, filha de um comerciante republicano, que viveu numa época de transição política no país, de Império para a República, período também de transformações socioeconômicas importantes, momento em que no Brasil a educação da população, especialmente a educação primária, ganhou atenção acentuada, em grande parte devido ao pensamento positivista dos organizadores do novo regime político. Nesse contexto, também marcado por teses liberais e pelo "catolicismo ultramontano", o papel da mulher ganhou nuances que valorizavam sua ação como professora primária, uma segunda maternidade, por meio da qual poderia contribuir para o engrandecimento da nação através da formação de crianças e jovens para desta forma "se desvelar um futuro promissor para o Brasil".

O magistério primário foi então delineado como missão feminina, porém desde que não entrasse em conflito com a harmonia da vida familiar, pois o modelo de mulher era a que tinha como função primordial ser esposa exemplar, educar seus filhos, cuidar da casa. Embora seguindo de perto essas convenções sociais, Julia Wanderley se destacou das mulheres de sua época, como por exemplo ao valorizar a fotografia retratando a cidade de Curitiba, revela uma sensibilidade e uso diferenciado da fotografia dos seus contemporâneos.

         "Ela aproveitou os primeiros momentos da popularização da fotografia para preservar a memória do Paraná. Enquanto a maioria das pessoas viu na fotografia somente a perpetuação da imagem pessoal e familiar, Júlia, com a perspicácia de quem sentia as possibilidades de seu tempo, nela vislumbrou uma forma eficaz de registrar os acontecimentos cotidianos", analisam os historiadores Marcelo Sutil e Maria Luisa Gonçalves Baracho, do Departamento de Patrimônio Cultural da Fundação Cultural de Curitiba. Eles fazem parte da equipe que organizou uma exposição com a coleção de imagens reunidas por Julia Wanderley, chamada  muito apropriadamente "Um olhar para o futuro".


Referências: 
TRINDADE, E. M. de C. - Clotildes ou Marias: Mulheres de Curitiba na primeira República. Curitiba: 
Fundação Cultural, 1996.
TRINDADE, E. M. de C.; ANDREAZZA, M. L. Cultura e educação no Paraná. Curitiba: WANDERLEY, J. A. 
Juízo competente. A República, Curitiba, 25 nov. 1899.

                LEGENDAS:
F1: Portrait de Julia Wanderley quando jovem, autor desconhecido, s/d.
F2: A professora com o sobrinho Júlio, adotado por ela.
F3: Julia Wanderley, seu marido Frederico Petrich e o sobrinho.
F4: Monumento em homenagem à professora pioneira, em Curitiba.



A coluna INCONTROS da Revista ContemporArtes, é editada por Izabel Liviski, fotógrafa e doutoranda em Sociologia pela UFPR. 





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