ENTRE O LIXO E O LUXO, ONDE ESTÁ A RAINHA?
Tudo começou quando da
contemplação do vento, o qual trouxe aos pés da mineirinha um verde brilhante
que lembrava uma preciosa esmeralda. O instante marca a transformação e o material,
papel de bala, ganha a forma de uma flor. A partir e então, o papel de bala, tornou-se
seu desejo de colheita, matéria prima feita egrégora criativa que a
despertou. Passa a criar recriar, inventar, reinventar, experienciar e por
horas é a cientista da coleta seletiva, que agrupa poeticamente aquilo que lhe chega
às mãos. Mãos que, marcadas pelas cicatrizes da sobrevivência rural e urbana,
aprendem e produzem, fazendo surgir a Rainha do Papel de Bala.
Retrato de Efigênia Rolim |
Efigênia Ramos Rolim nasceu em Vila Granada, Abre Campo, no dia 21
de setembro (dia da árvore) de 1931, no Estado de Minas Gerais onde vivia como
agricultora. Por sugestão do cunhado, em busca de melhoria nas condições de
vida, desde a década de 70, fixou residência em Curitiba, Paraná. Artesã,
escultora, poeta, assobiadora, performer, contadora de histórias, artista
popular e estilista. Segundo consta, no catálogo da Sala do Artista Popular –
1999/2012, da Secretaria de Estado da Cultura do Paraná,
“Seu
currículo é extenso. Já fez inúmeras exposições e eventos, recebeu prêmios e a
medalha da Ordem do Mérito Cultural do Ministério da Cultura. Foi entrevistada
na Globo News, pelo repórter Caco Barcellos. Participou do program de Jô
Soares, entre outros. A artista trabalha com material reciclável e dá vida a
bonecos (...)”.
Lembrando, MUNARI (1990), “O
sonho do artista é chegar ao Museu seja de que maneira for, enquanto o sonho do
designer é chegar aos mercados de bairro”. A arte pura é uma forma de expressão
do ser humano, que produzindo com as próprias mãos utiliza materiais, técnicas
e meios que remetem a um fazer tradicional, apresentando esculturas, pinturas,
gravuras e desenhos repletos de significado, beleza e harmonia. O artista
possui intuição artística, habilidades específicas, técnicas e estilo. Com visão
pessoal romântica e idéias subjetivas concebe o mundo de forma pessoal, sendo
suas obras privilégio de uns poucos capazes de compreendê-las.
Foi personagem do documentário
premiado Rainha de Papel (1999), de Estevan Silveira e Tiomkim. Expôs na Sala
do Artista Popular em 2003, e vem sendo tema de produções acadêmicas, nos
cursos de Artes-Visuais e Antropologia de diversas universidades brasileiras.
Participou como artista
convidada, da Exposição Arthur Bispo do Rosário +3 (2005) realizada no Museu
Oscar Niemeyer, Curitiba. Seguiu participando, em vários pontos do Brasil, de encontros
de cultura popular, e foi tema do filme Rainha (2006), do argentino Sergio
Mercúrio. Produziu figurinos para teatro e foi convidada, por escolas públicas
e particulares, para contar histórias e falar da importância da reciclagem do
lixo para a saúde do planeta.
Recebeu, em 2007, o prêmio de
culturas populares do Ministério da Cultura, e com esta premiação reformou sua
casa e ateliê, onde instalou o Museu A Vida do Papel de Bala. A artista expressa, ainda, uma oralidade que
remete ao repente, a poesia, ao drama, performance, contação de histórias que
dá às suas construções forma e vida. São animais, personagens/pessoas, objetos,
roupas, acessórios, vestimentas, flores, poesia. Sua poesia assume a forma de
repente e passa a ser publicada em Cordel, a partir de 2008.
A vida e obra de Efigênia Ramos
Rolim inspiram a peça Papel Amassado
Sonho Sonho Revelado (2010), dirigida por Eduardo Salles
Ulia, e uma de suas obras é adquirida para integrar o acervo do Museu Oscar
Niemeyer. O grupo de Música Popular Brasileira, da Universidade Federal do
Paraná, incluiu sua composição O Conta Gotas no CD Terra de Pinho II, por
ocasião dos festejos da universidade. E a jornalista Dinah Ribas Pinheiro, lança
em 2012, A Viagem de Efigênia Rolim nas Asas do Peixe Voador, em 180 páginas
que narram a trajetória completa da artista e sua crescente ascensão no mundo
das artes.
Ganha, em 2013, sala individual na
Bienal Internacional de Curitiba. Mantendo presença na Mostra Permanente PR/BR Produção da Imagem Simbólica do Paraná na Cultura Visual
Brasileira, do Museu Oscar Niemeyer, com curadoria de Maria José Justino.Seu
talento é internacional com presença na Suíça, México e França sem abandonar a
simplicidade de plantar no quintal de casa – couve, cebolinha, salsinha... A
Rainha do Papel participa do Verão Contemporâneo; e, no Memorial Minas Gerais
Vale, ministra a oficina Penenem, ensinando como produz suas obras. Ainda, é
tema do espetáculo Eles Também Falam de Amor, no Centro Cultural Banco do
Brasil.
Na cultura contemporânea as
discussões e questionamentos oriundos da comunicação, interação e fusão dos
campos da arte, considerando arte e design, remetem à tarefa árdua, reconhecer
um talento criativo e sua criação. A
transversalidade percorre, entre as
áreas das artes visuais, artes cênicas, moda, literatura, um caminho de
invencionices peculiares que transformam realidades individuais e coletivas. Possuindo
encantamento, mesmo que carregando o descartado pelo outro, com narrativa
próxima aos contos de fadas, marcado pela presença de sapatinhos na janela.
Ou observando-se um contexto
cultural híbrido, no qual a estilista mostra criações para o campo da moda, com
forte tendência ao design arte que caracteriza ainda, protótipos para solução
do lixo urbano. Um verdadeiro luxo.
Espie.
*Referências:
MUNARI, Bruno. Artista e designer.
Lisboa: Editorial Presença, 1990.
Catálogo Sala do Artista Popular (1999-2012), Secretaria de
Estado da Cultura. Paraná.
**As figuras aqui mostradas são detalhes das obras de Efigênia
Ramos Rolim, integrantes da mostra Bienal Internacional de Curitiba, expostas
no Museu Oscar Niemeyer, todas feitas pela autora.
A foto 1, retrato de Efigênia Rolim, foi retirada de: http://www.50emais.com.br/artigos/a-incrivel-historia-da-octagenaria-efigenia-rolim/
A foto 1, retrato de Efigênia Rolim, foi retirada de: http://www.50emais.com.br/artigos/a-incrivel-historia-da-octagenaria-efigenia-rolim/
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SOLANGE CHEMIN, é artista plástica, especialista em artes e museologia. Foi responsável pelo implante e manutenção do setor de ação educativa do MON (Museu Oscar Niemeyer).
É também designer de produtos na área
da moda, e foi responsável pela ação educativa da Bienal Brasileira de Design,
Curitiba, elaborando material didático, treinando monitores e preparando
educadores e professores para aquela bienal.
3 comentários:
Solange, lindo e sensível seu texto de estreia! Parabéns.... está devidamente compartilhado entre amigos. Seja bem vinda à comunidade Contemporartes!
17 de fevereiro de 2014 às 18:25Não só um texto leve e solto, mas uma aula sobre essa artista exemplar que me deixou um pouco menos ignorante. Parabéns.
17 de fevereiro de 2014 às 18:37A Efigênia merece esse texto. Muito bom. Abs.SG.
20 de março de 2014 às 23:28Postar um comentário
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