Na Tapera de Entre Rios: um pré-modernista
Haverá
o dia - pensei. Este texto, se chegar ao que pretende, será uma
apresentação breve de uma longa história, uma quase nota
biográfica. O Prof. Edward Leão, ausente nos manuais e esquemas
literários, afastado de Massaud, conservou-se no tempo, recolhido à
memória raulsoarense. No entanto, como diria o meu amigo Ricardo:
Há quem
hoje
por lá
não saiba
do poeta.
Em 1932,
em Quadro Sintético da Literatura Brasileira, Tristão de
Ataíde, pseudônimo do carioca Alceu Amoroso Lima, empregou, pela
primeira vez, o termo pré-modernismo ou
período eclético.
Eclético, porque o trecho que vai entre o Simbolismo e o Modernismo se caracteriza, acima de tudo, por não poder ser resumido numa escola dominante e, ao contrário, compreender a coexistência de simbolistas, realistas e parnasianos, até mesmo os da geração que, em 1920, iriam desencadear o Modernismo. (ATAÍDE, 1958, p. 28)
Edward Leão, faz parte deste grupo trans-época, esse movimento
indeterminado, composto por estéticas que se entrecruzaram e se
permearam concomitantemente, na construção do que viria a ser o
Modernismo Brasileiro. Nascido em 06 de abril de 1898, em Tocantins,
Minas Gerais, o poeta, amante da língua portuguesa e francesa,
começaria a escrever ainda muito cedo, influenciado por autores como
Flaubert,
Dumas, Zola, Daudet, Victor Hugo e etc. Em 1920 muda-se para Raul
Soares, pequena cidade mineira, casa-se com dona Maria de Aquino
Leão, com quem teve dois filhos, e passa a lecionar, primeiro em
cursos particulares, depois no Ginásio São Sebastião, onde
ministrou disciplinas de história, biologia, francês e geografia.
Sua
obra ainda se encontra esparsa, dividida em periódicos como o jornal
Raul
Soares,
A
Tribuna,
O
Imparcial,
Jornal
do Povo, e
em dois livros, publicados por iniciativa própria, intitulados Alma
errante e
Tapera Ensolarada.
Deixo
aqui alguns poemas e o link de uma ótima seleção, divulgada no
blog do excelentíssimo Sr. José Geraldo Leal, contabilista,
pesquisador, historiador, escritor e colunista do Jornal de Raul
Soares.
Com
vocês, o nebuloso pré-modernista e poeta mineiro, Edward Leão:
LÁGRIMAS
Lágrimas ? Verto-as . . . verto-as e, no entanto,
sou homem - pobre filho da desgraça -
e quem no mundo existirá que passa
sem ver correr a linfa do seu pranto ?
Ninguém. Por isso eu choro. A negra massa
que forma a nuvem não se extingue enquanto
não descarrega do enfunado manto
aa água que cai em flocos de fumaça.
Choro e sou homem. Quem, dirá que um homem,
sejam quaisquer as mágoas que o consomem,
volte aos papéis ingênuos de criança !
Mas, a lágrima às vezes me consola.
E em cada gotas que na face rola
vejo outra vez brilhar uma esperança.
Lágrimas ? Verto-as . . . verto-as e, no entanto,
sou homem - pobre filho da desgraça -
e quem no mundo existirá que passa
sem ver correr a linfa do seu pranto ?
Ninguém. Por isso eu choro. A negra massa
que forma a nuvem não se extingue enquanto
não descarrega do enfunado manto
aa água que cai em flocos de fumaça.
Choro e sou homem. Quem, dirá que um homem,
sejam quaisquer as mágoas que o consomem,
volte aos papéis ingênuos de criança !
Mas, a lágrima às vezes me consola.
E em cada gotas que na face rola
vejo outra vez brilhar uma esperança.
O
CARREGADOR
Vergado ao peso enorme do volume
e ruminando o fel da vida amarga,
eis o homem cuja vida se resume
em ser paciente azêmola de carga.
Doem-lhe os rins e sente em cada ilharga
a pressão de um punhal de afiado gume
- Atlas de dorso nu e espádua larga
que canta por disfarce ou por costume –
Ó meu irmão de músculos retesos,
de olhos em brasa eternamente acesos
e compleição de lutador romano,
eu não invejo o teu vigor de atleta,
porque na alma raquítica de poeta
carrego o peso do tormento humano.
Vergado ao peso enorme do volume
e ruminando o fel da vida amarga,
eis o homem cuja vida se resume
em ser paciente azêmola de carga.
Doem-lhe os rins e sente em cada ilharga
a pressão de um punhal de afiado gume
- Atlas de dorso nu e espádua larga
que canta por disfarce ou por costume –
Ó meu irmão de músculos retesos,
de olhos em brasa eternamente acesos
e compleição de lutador romano,
eu não invejo o teu vigor de atleta,
porque na alma raquítica de poeta
carrego o peso do tormento humano.
ALMA
ERRANTE
Curvas longínquas . . . montes altaneiros
- Rodovias do Sonho e da Ilusão -
Abismos negros . . . báratros traiçoeiros
em que se engolfa incauto o coração.
Soberbos alcantis . . . despenhadeiros
Fortes, cheios de ameaça e de atração,
Espaço imenso . . . trilhos condoreiros
- Caminho aéreo da imaginação -
Ninhos de águia na excelsa majestade
dos mais augustos sólios da realeza
Vzinhos naturais da tempestade
Altos arranha - céus da Natureza.
Vozes de aves, que em doce alacridade
gorjeiam carmes lindos na devesa . . .
Pios tristonhos . . . nenias de saudade
na música dolente da tristeza . . .
Serpentes líquidas, répteis coleantes
- Artérias d’água abertas sobre a terra
mares e oceanos, quérulos gigantes,
plangendo a magoa que seu bojo encerra.
Pepitas de ouro . . . minas de diamantes
- Astros que a picareta desenterra -
rubis sangüíneos . . . gotas borbulhantes
das veias inorgânicas da terra.
Edênicas miragens policromas
formam quadros de efeitos deslumbrantes,
miscelânea de cores e de aromas
Num cenário de múltiplos cambiantes.
Trancos enormes, majestosas comas,
ao sabor de galernos sussurrantes . . .
feras ligeiras, sacudindo as pomas
chamam os filhos prófugos, distantes.
Esplendidas manhãs . . . deslumbramentos
de cor na luz mirífica do dia . . .
Penumbras vesperais . . . . recolhimentos . . .
Horas de amor e de melancolia.
Eu vejo tudo e sinto a imensidade
Desse infinito que me envolve a Vida
- Teia de fios forte da Verdade
pelas mãos da quimera entretecida -
e sinto em mim indômita vontade
de subir, voar, levando de vencida
a força etérea, a lei da gravidade
e toda a ciência velha, encanecida.
Oh ! Quem me dera erguer deste solo,
desta galé fatal que me agrilhoa,
subir no carro esplendido de Apolo,
e pelo mundo jornadear à-toa.
E tenho a sensação de que me evolo
numa quimera eternamente boa,
alado a transitar de polo a polo
na delícia suprema de quem voa.
Fora do mundo real a que pertenço,
desagregado da matéria ingrata,
eu sinto o meu espírito suspenso,
ruflando as asas rútilas de prata.
Ascendo às grimpas desse espaço imenso,
Onde minh’alma louca se arrebata
e abrange o mundo num olhar intenso
nesse delírio de nefelibata.
Minh’alma é inquieta, nômada, erradia,
qual novo Ahasverus arrastando o fado,
vai á mercê de doida fantasia
correndo atrás de um sonho irrealizado.
- Alma errante, sedenta de harmonia,
busca no espaço um páramo encantado
- Região de luz, de lenda ou de magia
onde poisar teu sonho incontentado !
Marcha, minh’alma, cumpre o teu destino :
Galga e supera os cumes de granito !
Singra o azul como um facho peregrino
- Asa de luz brilhando no Infinito -
Curvas longínquas . . . montes altaneiros
- Rodovias do Sonho e da Ilusão -
Abismos negros . . . báratros traiçoeiros
em que se engolfa incauto o coração.
Soberbos alcantis . . . despenhadeiros
Fortes, cheios de ameaça e de atração,
Espaço imenso . . . trilhos condoreiros
- Caminho aéreo da imaginação -
Ninhos de águia na excelsa majestade
dos mais augustos sólios da realeza
Vzinhos naturais da tempestade
Altos arranha - céus da Natureza.
Vozes de aves, que em doce alacridade
gorjeiam carmes lindos na devesa . . .
Pios tristonhos . . . nenias de saudade
na música dolente da tristeza . . .
Serpentes líquidas, répteis coleantes
- Artérias d’água abertas sobre a terra
mares e oceanos, quérulos gigantes,
plangendo a magoa que seu bojo encerra.
Pepitas de ouro . . . minas de diamantes
- Astros que a picareta desenterra -
rubis sangüíneos . . . gotas borbulhantes
das veias inorgânicas da terra.
Edênicas miragens policromas
formam quadros de efeitos deslumbrantes,
miscelânea de cores e de aromas
Num cenário de múltiplos cambiantes.
Trancos enormes, majestosas comas,
ao sabor de galernos sussurrantes . . .
feras ligeiras, sacudindo as pomas
chamam os filhos prófugos, distantes.
Esplendidas manhãs . . . deslumbramentos
de cor na luz mirífica do dia . . .
Penumbras vesperais . . . . recolhimentos . . .
Horas de amor e de melancolia.
Eu vejo tudo e sinto a imensidade
Desse infinito que me envolve a Vida
- Teia de fios forte da Verdade
pelas mãos da quimera entretecida -
e sinto em mim indômita vontade
de subir, voar, levando de vencida
a força etérea, a lei da gravidade
e toda a ciência velha, encanecida.
Oh ! Quem me dera erguer deste solo,
desta galé fatal que me agrilhoa,
subir no carro esplendido de Apolo,
e pelo mundo jornadear à-toa.
E tenho a sensação de que me evolo
numa quimera eternamente boa,
alado a transitar de polo a polo
na delícia suprema de quem voa.
Fora do mundo real a que pertenço,
desagregado da matéria ingrata,
eu sinto o meu espírito suspenso,
ruflando as asas rútilas de prata.
Ascendo às grimpas desse espaço imenso,
Onde minh’alma louca se arrebata
e abrange o mundo num olhar intenso
nesse delírio de nefelibata.
Minh’alma é inquieta, nômada, erradia,
qual novo Ahasverus arrastando o fado,
vai á mercê de doida fantasia
correndo atrás de um sonho irrealizado.
- Alma errante, sedenta de harmonia,
busca no espaço um páramo encantado
- Região de luz, de lenda ou de magia
onde poisar teu sonho incontentado !
Marcha, minh’alma, cumpre o teu destino :
Galga e supera os cumes de granito !
Singra o azul como um facho peregrino
- Asa de luz brilhando no Infinito -
Lucca Tartaglia está onde Deus é servido conceder-lhe que seja, em companhia dos anseios, desejos, moscas, mosquitos e outros elementos auxiliares do bom estado das casas e dos sonos. Gradua-se (ou Graduam-no) na Faculdade de Letras e Artes (mais uma que outra) da Universidade Federal de Viçosa. É colunista na ContemporARTES desde que se tem por isso. Desenvolve pesquisas na área de Literatura (Ocultismo em Fernando Pessoa) e LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais).
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