terça-feira, 15 de julho de 2014

AS CORDELISTAS





A origem da literatura de cordel data da Idade Média, da poesia trovadoresca portuguesa, onde os poetas andavam de burgo em burgo, castelo em castelo.  Os poetas nordestinos iam de feira em feira ou de cidade em cidade, seguindo os ciclos das festas religiosas.
Na idade Média era vetado às mulheres os prazeres da poesia, e dos recitais públicos. A elas cabia o gineceu (locais exclusivos às mulheres onde teciam canções de gesta, romances e serões literários. Eram grupos literários gestados por matronas sábias, que passavam a experiência para perpetuar a memória oral. Pois na vida privada as mulheres conservavam a leitura dos romances, porém na vida pública eram os homens que cantavam as tradições, entretanto ao serem questionados nos seus repertórios diziam claramente que decorriam de suas linhagens femininas. De acordo com a tese de Sílvio Romero de que: as mulheres não são somente arquivo das tradições orais, mas, sobretudo, autoras de muitas delas.”

O autor nos dá um parâmetro das regras que circundam o cordel, vale a pena transcrevê-las na íntegra:
Não adianta escrever poemas, trovas ou estrofes que não sejam em sextilhas, setilhas, décimas, setissilábicas ou em decassiílabos, e vir dizer que é Literatura de Cordel. Muitos eruditos andam escrevendo opúsculos até em prosa dizendo ser Literatura de Cordel.
Quando os versos são compostos em forma de narrativa, tem de ser em sextilhas […]. E assim o poeta vai continuando a sua narração arte completar 8, 16 ou mesmo 32 páginas – as mais usadas. Em cada página cabem cinco estrofes [sendo em sextilhas]. Na primeira, apenas quatro – para que o título da história, do folheto ou do romance fique mais destacado, bem como o nome do autor […].
O tamanho do folheto não deve ultrapassar 11-16 cm. Quando maior ou menor, perde sua característica de cordel.
Não adianta o poeta mostrar eruditismo sem colocar as palavras difíceis em seus respectivos lugares. O cordel sempre foi um veículo de aceitação nos meios rurais e nas camadas chamadas populares, porém precisa arte e técnica de que escreve. Um folheto mal rimado e desmetrificado é um dinheiro perdido de que empresa a sua edição. Existem folhetos que se tornam clássicos, quer pelo seu conteúdo, quer pela sua versificação. Precisa também muito cuidado na colocação do título, que deve ser rápido, sucinto e, ter seu “ponto focal” de atração para os leitores
          
            A tese de mestrado de Doralice Alves de Queiroz, Mulheres cordelistas – percepção do universo feminino na literatura de cordel, apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Letras – Estudos Literários, da UFMG, em 2006, analisa os perfis de mulheres no percurso da história da literatura oral e mais recentemente de cordel. Suas produções num reduto essencialmente masculino. Mas, não devemos esquecer que sempre coube a mulher a educação familiar, a transmissão dos conhecimentos e das tradições orais: cantigas, lendas, e costumes.

            A primeira mulher que publicou, em 1938, o fez sob pseudônimo masculino, somente a partir de 1970 é que se pode verificar a autoria feminina em publicação de folhetos de cordel. A figura da mulher sempre apareceu com características de – virtude, honestidade, beleza e, sob a ótica masculina e com cunho moralizante. A mulher, na sociedade patriarcal, era reclusa, aos cuidados do lar e a educação dos filhos, à satisfação social do marido. Sua educação não ia além da possibilidade de contar histórias e contos de encantamento para os filhos, das cantigas de ninar; ler e escrever livros de receitas, quando muito. Valia o jargão: “se uma mulher aprende a ler, será capaz de receber cartas de amor”. A estrutura de reclusão era imposta de forma muito velada e justificada como “zelo familiar”. Havia os gêneros mais adequados para as mulheres, face à moral e os bons costumes. Ainda assim, algumas mulheres, neste jogo de poder burlavam a vigilância patriarcal ou dos maridos e apoderavam das formas poéticas executadas pelos homens Veja a quadrinha popular do início do século XX, abaixo:

“Menina que sabe muito

É menina atrapalhada,

Para ser mãe de família,

Saiba pouco, ou saiba nada.”


           A mulher, no início do século XX, quando os folhetos de cordel proliferaram no Nordeste, na ausência de jornais, rádios e televisão, era descrita como: princesa – obediente e calada diante dos valores paternos, da sociedade e da religião; mãe devotada, esposa exemplar - àquela que protege o lar e filhos dos perigos, defensora da moralidade. O contrário disso era descrito como perigos para a manutenção da estrutura família. A mulher que se atrevesse a elaborar versos de cordel, era vista como em luta contra o diabo, a serpente e, isto como castigo por suas ações. A prostituição é tema de contraponto relevante entre poetas para exemplificar e exaltar a virtude e castigar as atitudes “inadequadas para uma mulher”, dessa forma fazia-se valer os valores da moralidade vigente.

            Uma das primeiras descobertas de mulher escrevendo cordel foi o folheto publicado em 1938, sob o pseudônimo de Altino Alagoano, pseudônimo de Maria das Neves Batista Pimentel, filha do poeta e editor Francisco das Chagas Batista. Nestes primeiros momentos de composições femininas, elas ainda reproduzem os valores temáticos masculinos. Somente recentemente esses valores foram deixados de lado e as mulheres buscam firmar suas próprias visões do mundo e da sociedade. Dentre essas mulheres cito Salete Maria, Dalinha Catunda, que rompem com a acomodação feminina e “viram a mesa” em suas abordagens ousadas – ora de clamores por valores sociais não respeitados, denúncias políticas e, abordam também o caráter de humor – um dos marcos da poesia de Dalinha Catunda; Bastinha Job, poeta e professora, que leva a literatura de cordel para a Universidade, também preocupada com linguagem e temáticas femininas; Creusa Meira, que discute os problemas de uma sociedade em que a mulher ainda busca sua afirmação; Nelcimá de Moraes, também professora, que leva para seus alunos a musicalidade da poesia de cordel como ferramenta interdisciplinar; Josenir Lacerda, Anilda Figueiredo, dentre outras tantas mulheres que firmam a personalidade feminina no universo masculino da literatura de cordel.

Todas, com base em suas vivências, expõem as feridas de uma sociedade patriarcal e coalhada de hipocrisias e falsos moralismos.

Vejamos algumas de nossas cordelistas contemporâneas: 

Salete Maria da Silva



É cordelista, professora e advogada, necessariamente nesta ordem. Reside entre Juazeiro do Norte-Ceará e Salvador-Bahia (Brasil). Sua poesia é emancipatória e contra preconceitos. É apologista do pluralismo cultural. Seu trabalho é utilizado em cursos, palestras e debates. Suas temáticas são múltiplas, com destaque para as questões marginais e periféricas. Sua ênfase é nos direitos humanos, sobretudo de mulheres e homossexuais. Salete Maria é, principalmente, cordelírica total.

Lugar de mulher



Do ponto onde me encontro

Na janela dum sobrado

Daqui donde me defronto

Com meu presente e passado

Fico metendo a colher

Do ‘meu lugar de mulher’

Neste mundão desgarrado



Do meu ângulo obtuso

Num canto da camarinha

Afrouxo um parafuso

Liberto uma andorinha

Desmancho uma estrutura

Arranco uma fechadura

Desmonto uma ladainha



Reza a história do mundo

Que mulher tem seu lugar

É um discurso ‘corcundo’

E prenhe de blá-blá-blá

Eu que ando em toda parte

Divulgo através da arte

Outro modo de pensar:



Lugar de mulher é quarto

Sala, bodega e avião

Lugar de mulher é mato

Cidade, praia e sertão

Lugar de mulher é zona

Do Estado do Arizona

À Vitória de Santo Antão



Lugar de mulher é sauna

Capela, bonde, motel

Lugar de mulher é fauna

Terreiro, campus, quartel

Lugar de mulher é casa

Seja na Faixa de Gaza

Ou no Morro do Borel



Lugar de mulher é cama

Seresta, parque, novena

Lugar de mulher é lama

Escola, laje, cinema

Lugar de mulher é ninho

Dos becos do Pelourinho

Às águas de Ipanema



Lugar de mulher é roça

Riacho, circo, cozinha

Lugar de mulher é bossa

Reisado, feira, lapinha

Lugar de mulher é chão

Das ruelas do Sudão

Às veredas da Serrinha



Lugar de mulher é mangue

Deserto, vila, mansão

Lugar de mulher é gangue

Novela, birô, oitão

Lugar de mulher é mar

Das praias do Canadá

Ao céu do Cazaquistão



Lugar de mulher é ponte

Trincheira, jardim, salão

Lugar de mulher é fonte

Indústria, baile, fogão

Lugar de mulher é mina

Do solo de Teresina

Ao Morro do Alemão



Lugar de mulher é barro

Palco, metrô e altar

Lugar de mulher é carro

Camarote, rede, bar

Lugar de mulher é trem

Dos caminhos de Belém

À serra do Quicuncá



Lugar de mulher é show

Favela, brejo e poder

Lugar de mulher é gol

Ringue, desfile e lazer

Lugar de mulher é creche

Das bandas de Marrakech

Às vilas do ABC



Lugar de mulher é serra

Obra, beco e parlamento

Lugar de mulher é guerra

Missa, teatro e convento

Lugar de mulher é pia

Das tendas de Andaluzia

À Santana do Livramento



Lugar de mulher é tudo

Por onde possa passar

Seja pequeno ou graúdo

Seja daqui ou de lá

Lugar de mulher é Terra

Mas não onde o gato enterra

O que precisa ocultar



Lugar de mulher é dentro

Mas também pode ser fora

Lugar de mulher é centro

Que a margem não ignora

Lugar de mulher é leste

Norte, sul, também oeste

De noite, tarde e aurora



De minha perspectiva

Mulher não tem ‘um lugar'

Onde quer que sobreviva

Pode ser seu habitat

Lugares existem zil

Eu mesma sou do Brasil

E vivo no Ceará!

(Salete Maria)



Zilma Ferreira Pinto




Nasceu em Tacima-PB. Muito jovem, ingressou por concurso no magistério, missão que exerceu não só na sua cidade natal como em Alagoa Grande, Pocinhos, Cabedelo e João Pessoa, cidade onde  atualmente reside. Ainda criança compôs seus primeiros versos. Iniciou-se nas letras paraibanas com o “Cancioneiro Experencial, em 1987. Sua obra tem sido reconhecida, tendo obtido alguns prêmios entres os quais o “Prêmio novos autores paraibanos”. Seja na categoria poesia, como na conto infanto-juvenil (A história da pedra maliciosa, 1977 ) como na  cordel (O romance de Ferdinando e Maria,  UFPB,1998), ou em concursos de trovas e poesias,  vem recebendo também vários prêmios.

Minha Cantiga 



No castelo do Destino

Dividi-me por igual.

Ficaram duas meninas

No meio de um roseiral.



Uma bordando a ouro,

Outra o mais fino metal.



Uma transpôs a soleira

Que era a porta pra o mar.

Tomou o barco da vida,

Partiu sem querer sonhar.



A outra subiu à torre

Que ia dar nas estrelas

No barco da meia-lua

Foi para a mais longe delas...



Um dia encontro as meninas

Bem longe do roseiral

Nelas havia a tristeza

Dividida por igual.



Nenhuma bordava a ouro,

Nem o mais fino metal.



Fui escolher! Não sabia

Com qual das duas ficar!?

Castelos já não havia

E a torre para sonhar.



.Sem manto bordado a ouro;

Sem palmatória de rei!

Ai! Minhas pobres meninas

Qual de vós escolherei?!



 (Zilma Ferreira Pinto)



Abram alas, meus senhores,
para o verso popular
que em nosso Cordel de Saia
a mulher tomou lugar.
É cordel feito ciranda
cantada à beira do mar
*
Vem de lá Xica Barbosa
com seu repente brilhante.
Vem Zilma Ferreira Pinto
Vem Socorro Cavalcante.
Nelcimá e tantas outras
Levando o cordel adiante.
*
Abram alas, meus senhores,
pra ciranda do cordel.
Que nesta nossa ciranda
a mulher tem seu papel.
E o cordel que ela canta
tem a doçura do mel.

(Zilma ferreira Pinto)

Dalinha Catunda


Maria de Lourdes Aragão Catunda, mais conhecida como Dalinha Catunda é uma cordelista natural de Ipueiras, Ceará. Dalinha ocupa a cadeira número 25 da ABLC que tem como patrono Juvenal Galeno. Possui vários folhetos publicados com temáticas de cunho social e sua vivência em sua terra natal; além disso, possui dois blogs, o Cantinho da Dalinha e o Cordel de Saia, que divide com a também cordelista e pesquisadora Maria do Rosário. Além disso, faz recitais, escreve no jornal Gazeta de Notícias do Vale do Cariri no sul do Ceará e é membro correspondente da AILCA - Academia Ipuense de Letras, Ciências e artes. Traz no bojo de sua poesia o humor. Os  substantivos, verbos e adjetivos são próprios do linguajar feminino. Seus versos são impecáveis no trato com a rima e da estruturação das orações.

Saias no cordel

1

Sou poeta cordelista

Nascida lá no sertão.

Ipueiras é minha terra,

O Ceará é meu rincão.

Adoro ser nordestina.

Levo comigo uma sina,

Amar meu agreste chão.

2

Minha mãe fazia versos,

E gostava de declamar.

Foi professora primaria,

Com ela aprendi a rimar.

Ter gosto pela cultura,

Abraçar a literatura,

E o velho cordel amar.

3

E assim me fiz mulher

Abraçando a poesia.

Meu mundo encantado

Era cheio de magia.

Talvez um pouco irreal.

Mas para mim era ideal,

Pois era o que eu queria.

4

A mulher abriu caminhos,

Difíceis de percorrer.

Pôs os pés na estrada.

Pra demonstrar seu saber.

Foi bem grande sua luta

Mas ficar sempre oculta

Impossível conceber.

5

Durante muito tempo

Fomos só inspiração.

Musa que os poetas,

Traziam no coração.

Sonhávamos ter um dia

Nossa popular poesia

Com farta publicação

6

Não estou insinuando

Que a mulher não atuava.

Ela já fazia seus versos

Apenas não publicava.

Mostrava sua alegria

Nas rodas de cantorias

E aplauso conquistava.

7

Apesar do machismo,

A mulher se aventurou,

Mesmo analfabeta,

Entrou na roda e cantou

Sem ligar pro: ora veja!

Encarando as pelejas

O homem desafiou.

8

No livro “Cantadores”

Pra minha satisfação

Conheci cantadoras.

Uma chamou atenção

Por ser bem animada,

E cheia de presepada,

Zefinha do Chabocão!

9

Pelo Nordeste afora,

Nas rodas de cantoria,

Rita Medeiros cantava,

Chica Barrosa se via.

Até Maria Tebana,

Agia naquelas bandas,

E aplauso garantia.

10

Quando a mulher decidiu,

Por imprimir seu cordel.

Foi nome masculino,

Que ela botou no papel.

Essas pobres criaturas,

Sofriam com a tortura,

Do patriarcado cruel.

11

Mas tudo modificou,

Hoje a coisa é diferente.

O cordel está em festa

E a mulherada presente.

Homem agora é parceiro

Até virou companheiro,

No cordel e no repente.

12

Hoje as cordelistas,

Assumem seu lugar.

Na Bahia, Pernambuco,

Paraíba e Ceará.

O Nordeste brasileiro,

Há muito virou celeiro,

De mulheres a versejar.

13

Pelos cantos do Brasil,

A mulher faz poesia.

Temos em Juazeiro,

A boa Salete Maria.

Que audaz em sua meta,

Tem postura correta,

E desbanca hipocrisias.

14

Na Paraíba temos,

Nelcimá de Morais.

Mestra e cordelista.

É engajada demais.

Pesquisando o cordel,

A mulher e seu papel,

Em tempos medievais.

15

Já Josenir Lacerda,

Com Bastinha, é fato,

As duas são pioneiras

Da academia de Crato.

Trazem com devoção

O cordel no coração,

Dando a ele bom trato.

16

Tem Maísa Miranda,

É safra lá da Bahia.

Temos Ilza Bezerra

Recebendo honrarias.

O cordel está crescendo

Mulheres aparecendo,

Sa1ve os novos dias.

17

Muitas mulheres agem

Neste mundo do cordel.

Ativas e anônimas

Respeito cada papel.

Mas pra falar a verdade,

A minha felicidade

É vê-las rasgando o véu.

18

Pesquisadores buscam,

Nossa arte revelar

Cordel de boca em boca.

Chega a todo lugar.

Agora com a internet

Esta obra do Nordeste.

Ficará mais popular.

19

Eu sempre fui inquieta

E cheia das novidades.

Enxerida como que!

Para falar a verdade.

Amasiada com cordel,

Faço dele meu corcel,

E minha felicidade.

20

Sou Dalinha Catunda,

Não foi minha intenção,

Sobre o cordel feminino,

Fazer vasta explanação.

Só um parco recado:

Que se abra o mercado

Para nossa produção



(Dalinha Catunda)




A mulher e sua trilha



Divina musa!  inspirai-me

Para narrar uma história

Que, os menestréis me contaram.

Mulheres de amor e glória,

Ilustraram os romances

De beleza e vitória

2

Meus poetas cordelistas

Hoje, venho vos narrar,

As histórias do passado,

De princesas vou falar,

Vivendo encasteladas,

Querendo o amor desfrutar

3

E muitas destas princesas

Em noites de escuridão

Choraram por seus amores

Naquela horrível prisão

Sonhando contos de fadas

De amores e paixão

4

Mas isto foi lá na Europa

Aqui a vida é mais dura

Não há príncipe encantado

Somente a desventura

Marcada pelo cangaço

E um mundo de amargura

5

Sem desfrutar do amor

Mulheres, quase meninas,

Transformaram suas vidas

Num castelo de ruínas

Filhas de pais muito austeros

Amargaram tristes sinas

6

E quando se rebelavam,

Seus pais desorientados

Reféns da ignorância

Davam-lhes as costas, coitados!

Sem imaginar que um dia

Sem preconceito ou pecados

7

Aquelas mesmas mulheres

Que lutaram por amores

De suas prisões voaram,

Superando suas dores

Cantando e trabalhando

Desenvolvendo pendores

8

Com amor e com trabalho

Conquistaram seu espaço

Ampliaram os horizontes

Vivendo sob o compasso

Do pensamento liberto

Nunca pensando em fracasso

9

Nosso mundo evolui

Hoje a mulher determina

Que norte dará à vida

Mesmo sendo nordestina

Não carrega o estigma

Daquela pobre menina

10

Tristes tempos do passado

Quando as meninas caseiras

Sem muita oportunidade

Só casamento e canseiras

Cheias de filhos, coitadas!

Era muita trabalheira

11

Hoje ela tem profissão

Escolhe a vida que quer

Sem preconceito que diga

Se meretriz, ou qualquer!

Conquistou a felicidade

O orgulho de ser mulher

12

No mercado de trabalho

Conquistou sua projeção

Em outros tempos diriam

Isso é conversação

Num mundo tão masculino

É mesmo pura invenção

13

Estatísticas demonstram

Em percentual seguro

A mulher ultrapassou

Da universidade, o muro

Soma número relevante

Demarcando o seu futuro

14

Além de educadoras,

De propensões naturais

São cientistas, sim senhor!

Estudam mapas astrais,

Olhos observadores,

Nos círculos celestiais

15

Antes os olhos só viam

Estrelas de romantismo...

Indagam solenes, agora,

Sobre o ambientalismo

Não esquecendo sequer,

De estudar o ecologismo...

16

São mulheres engajadas

Crescendo junto com os filhos,

Os companheiros percebem

Na profissão os seus brilhos

À braços com suas mulheres

Têm que andar nos trilhos

17

Com o futuro garantido

E sempre pra frente olhando

Uma vida mais tranqüila

Assim, vão assegurando,

Vivendo de seus trabalhos

Elas vão se orgulhando

18

São as mulheres de hoje

Cumprindo suas jornadas

São mães e profissionais

Caminhando nas estradas

Sustentando os seus lares

Amando e sendo amadas

(Rosário Pinto)


(Dedicado à Dalinha Catunda, Mulher, guerreira e poeta popular)

Assumir a bruxa
  
 No cordel, que é arraigado tão fortemente à religiosidade, nota-se o quão sem saída fica a mulher e sua imagem, alvo de especulações preconceituosas. Sempre havendo de ser castas e puras, não necessariamente carregam o título de donzelas; Eva foi a mulher que pecou, que expulsou o homem do paraíso; desde então, uma nuvem de mistérios ronda sua figura - sendo vilã, não é sua fragilidade mais que uma máscara para uma genialidade escondida. Não é raro os folhetos (sobretudo os mais antigos) anunciarem verdadeiros demônios que, com seus diversos meios de manipulação, maquinam planos e utilizam-se de seu “poder” para benefício próprio, para levarem uma vida de regalos, enquanto seus pobres cônjuges são alvos, presas de suas tramoias. Nas obras de diversos autores, ficam todas sem saída, uma vez que não há a tal candura que se pretende: são todos – homens e sua ingenuidade, objetos do mal feminino que domina. A fraqueza, no imaginário popular nordestino, é também instrumento de valorização masculina (geralmente unidos à dura pobreza) para derrotar os donos de terras e riquezas. O poder dos bens (tanto de posses quanto de divindade e inocência) fica com os homens, e com quem ficaria o dos feitiços?

Continuamos de pé... até breve!


Lívia Marcelino Xavier. Bacharel e licenciada em Ciências Sociais FAFIL/CUFSA. Pesquisadora da área da literatura, estética e arte. 
Rafael Nunes de Sousa nascido em São Bernardo do Campo, em 25 de agosto de 1990. Estudou Comunicação das Arte do Corpo na PUC-SP e Letras na Fundação Santo André. É feminista, poeta e professor.


0 comentários:

Postar um comentário

Seja educado. Comentários de teor ofensivo serão deletados.