quarta-feira, 26 de novembro de 2014

ENY CALDEIRA: PERCURSO ENTRE MODERNIDADES



Com o título acima, o pesquisador João Paulo de Souza da Silva - Doutorando em Educação pela Universidade Federal do Paraná, na linha de História e Historiografia da Educação - analisou a trajetória intelectual da educadora Eny Caldeira (1912-2002) na década de 1950, especialmente no tocante às suas ideias e ações educativas modernizadoras.

“1952. Pela primeira vez em 77 anos de existência, uma mulher estava à frente do Instituto de Educação do Paraná, a mais tradicional escola de formação de professores do estado. Às vésperas da Comemoração do Centenário de Emancipação Política do Paraná, intelectuais forjavam uma série de ações de cunho político voltadas para a modernização do estado, num projeto de modernidade que visava torná-lo cosmopolita, dentre os quais Eny Caldeira.



Na delimitação temporal da pesquisa foi privilegiada a década de 1950, em especial os anos de 1952-1955, recorte que coincide com a gestão de Eny Caldeira frente ao Instituto de Educação do Paraná, concentrando iniciativas dentro de um espectro de ações modernizadoras que aconteciam no Paraná e no Brasil, com o apoio dos que exerciam o governo à época, pois o período em análise revela a busca do progresso e do moderno, no campo educacional e em outras esferas da sociedade, e a ação de intelectuais nas diversas instâncias em que ocorriam processos de mudança.

A concomitância dessas ações é justificável, pois a modernização política não acontece e nem pode acontecer in vacuo, isto é, sem entrar em contato com a modernização dos outros setores e, em particular, com a modernização econômica e social.

Durante o período escolhido, a atuação de Eny Caldeira obtém uma dimensão pública em razão da nomeação como diretora do Instituto de Educação do Paraná. Gestão que a caracterizou como uma das personagens de transição na formação do campo educacional paranaense, com a assunção das ciências fonte: Sociologia, Biologia e especialmente a Psicologia como referenciais para o desenvolvimento de novos paradigmas educacionais no Estado.



 Ressalte-se também a busca de especialização científica dos quadros docentes, em contraposição à educação assentada em fundamentos filosóficos, desenvolvida por autodidatas e eruditos das gerações anteriores à sua. Iniciativas como as da criação da Escola Experimental Maria Montessori e do Centro Juvenil de Artes Plásticas (o qual mantém atividades até hoje), ambos na capital paranaense, caracterizam a ação da intelectual frente a projetos de modernização pedagógica e estética, representada na valorização da ciência, na busca da especialização, do emprego de laboratórios educacionais e de sua atuação como mulher administradora pública.

Eny Caldeira recebeu uma requintada formação acadêmica para seu contexto. Realizou o curso normal no Instituto de Educação do Paraná, formou-se na segunda turma de Pedagogia da Universidade do Paraná, efetuou especializações em São Paulo (Orientação Educacional e Educação Sanitária) e durante os anos de 1950 a 1952 realizou viagem de estudos pela Europa, onde foi aluna de Maria Montessori e Jean Piaget.



Profissionalmente atuou como professora normalista, como diretora do Instituto de Educação do Paraná, período em que foi importante personagem na formação de espaços educacionais como a Escola Experimental Maria Montessori e o Centro Juvenil de Artes Plásticas, ambos em Curitiba/PR. Foi também pesquisadora do INEP (1956-1960) com papel significativo na organização ou reforma institucional de espaços de formação docente como os Institutos de Educação de Goiânia/GO e Natal/RN.
 Participou como membro do Conselho Estadual de Educação do Paraná (1965-1970). Também atuou nos campos da Didática e Psicologia, sendo uma das fundadoras do Grupo de Estudos Cognitivos Piaget no Paraná, professora da Universidade Federal do Paraná, além de participar na organização de programas  de extensão da universidade ao longo da década de 60 do século XX em cidades do interior do estado e dirigir um laboratório de práticas pedagógicas no Setor de Educação da Universidade.



 Em sua trajetória estabeleceu ainda contato com diversos intelectuais, artistas e educadores, como Maria Montessori, Jean Piaget, Anísio Teixeira, Erasmo Pilotto, Bento Munhoz da Rocha Netto, Guido Viaro, Emma Koch e outros que foram tratados no decorrer do trabalho.
Para o desenvolvimento do trabalho foram empregadas fontes históricas provenientes de diversos arquivos e centros de pesquisa, como Biblioteca Pública do Paraná - BPP, Casa da Memória Romário Martins, Instituto de Educação do Paraná Professor Erasmo Pilotto - IEPPEP, Museu de Arte Contemporânea do Paraná – MAC-PR, Casa Alfredo Andersen, Colégio Estadual do Paraná, Conselho Estadual de Educação, Assembleia Legislativa do Paraná, Arquivo Público do Paraná, entre outras.



A modernidade em Eny Caldeira fica representada no discurso que apoia e se baseia nos conhecimentos advindos da ciência; na sua busca de especialização, primeiro em São Paulo e depois, na sua experiência na Europa; a constituição de laboratórios, como o Serviço de Orientação Educacional e a Escola Experimental Maria Montessori, também se configuram como expressão da modernidade nas ações de Caldeira; do mesmo modo compreendemos que a opção da mulher que não se casa, preferindo a ciência; que viaja sozinha pelo país e o mundo; de uma mulher administradora pública, são também elementos que caracterizam a intelectual em pauta como uma intelectual moderna.

Eny Caldeira trouxe ao Instituto de Educação, não apenas o seu desejo de uma modernidade educacional embasada na aplicação dos métodos advindos da psicologia, da procura da racionalização dos processos de ensino e aprendizagem, como também a busca de intervenção social por meio das escolas. Caldeira procurou estar a par do que era considerado moderno quanto ao ensino de arte, outra área de seu interesse, e na qual a modernidade se apresentou de forma diversa dos pressupostos de pensadores da educação.
Ela não foi somente uma acadêmica ou erudita. Foi uma autêntica representante da classe intelectual enquanto divulgadora de opiniões e manifestações públicas a favor de suas posições. Empenhou-se por buscar transformações para tornar a educação mais bela e mais humana. E não há dúvidas que, eivada de contradições, Eny Caldeira foi uma das mais importantes personagens da educação paranaense no século XX, sendo uma figura de transição ao manter o enfoque à filosofia e à cultura como elementos fundamentais da formação docente e uma das pioneiras em assumir a ciência como justificativa para suas ações educativas."
Este trabalho encontra-se em processo de publicação pela Editora Appris, de Curitiba, com previsão de lançamento em março de 2015 e João Paulo, segue com sua pesquisa acerca da educadora, desta vez com a intenção de traçar toda sua biografia.
Fotos: Cedidas pelo autor.






Izabel Liviski é Fotógrafa e Socióloga, atualmente cursando doutorado na UFPR. Escreve a coluna INCONTROS desde 2009, e é atualmente também co-editora da revista.




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