ENCONTRO COM A MORTE
O Espaço do Leitor apresenta
um conto de Edmilson Corrêa. Esse texto
faz parte de uma coletânea chamada Gente
de Talento 2005 – As melhores histórias da gente da Caixa em prosa, verso e
imagem. A partir de um concurso de contos, poesias e fotografias,
aberto aos milhares de funcionários da Caixa Econômica Federal, jurados especialistas escolheram as melhores obras, aquelas que retratassem as singularidades da rotina de trabalho de um banco que está presente
em todo o país.
Gente de Talento, publicado em 2005
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Os jurados que selecionaram os
trabalhos em prosa foram Ivan Ângelo e Dad Squarisi. Já as poesias foram
escolhidas por Jorge Miguel. Rui Faquini ficou com a tarefa de escolher as
melhores fotos. O conto de Edmilson Corrêa narra um encontro muito peculiar. Vamos à ele:
Como funcionário da Caixa há
mais de quinze anos, cinco deles em agência, tive várias experiências
marcantes, mas, sem dúvida, a que mais me tocou foi o encontro que tive com a
morte. Cara a cara. Olho no olho.
A morte me chegou numa
quinta-feira à tarde, quase no horário de fechamento da agência, na figura de seu
Antônio, cliente fiel e antigo. Ex-militar, aposentado, cabelos grisalhos,
conservava uma alegria rara numa pessoa de setenta e cinco anos. Pelo menos
duas vezes por semana ele passava na
agência para acompanhar suas aplicações e fazer retiradas. Como de hábito,
parou na minha mesa (eu era o responsável pelas aplicações) e comentou que
precisava de dinheiro para viajar.
Carta de Tarô: A Morte
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Pediu dez mil reais para uma longa viagem
programada. Preenchi o documento e dei baixa na aplicação. Ofereci-lhe um
envelope para guardar o dinheiro, já que não podia levar tal quantia nas mãos.
Desejei-lhe uma boa viagem e me despedi. Mal sabia eu que ele faria mesmo uma
longa viagem, a definitiva, a que está marcada para cada um de nós.
Com o olhar acompanhei seu
passo lento até o caixa. Vi quando ele recebeu o dinheiro e guardou no
envelope. Sorrindo, se despediu. Observei que ele não se dirigiu à porta de
saída. Ao invés disso, sentou-se num sofá, perto de minha mesa. Ato contínuo,
deitou-se. Corri até
ele e outros funcionários chegaram para socorrê-lo. Chamei-o pelo nome e o
desespero tomou conta de todos. Ele estava pálido, os olhos esbugalhados, o
rosto perpassado pela dor, as mãos crispadas, ainda segurando o envelope com o
dinheiro. Alguém foi chamar uma ambulância e nós ficamos ali, impotentes,
apenas olhando. Um funcionário, que também era enfermeiro, começou uma massagem
vigorosa no peito de seu Antônio. O gerente fechou a agência e ficamos
esperando o socorro.
Ele não reagiu em nenhum momento, apesar dos
nossos esforços. De repente, estávamos todos tentando fazer com que ele
vivesse. Era só o que queríamos: a vida que havia nele há poucos minutos.
Queríamos o seu sorriso e a sua conversa franca e alegre. Queríamos a sua
figura digna, com seus cabelos brancos e sua altivez de ex-militar. Queríamos,
todos nós, o seu Antônio. Mas a morte também
o queria. A ambulância chegou e eles foram ágeis no atendimento. Em questão de
minutos, porém, pararam e anunciaram a morte por enfarte fulminante. Ficamos
todos em estado de choque.
Da vida nada se leva...
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O pacote de dinheiro, agora caído no chão,
ao lado do sofá, me remeteu àquela máxima de que da vida nada se leva. Por
questão de segurança, peguei o pacote e passei às mãos do gerente, que
posteriormente o repassou aos familiares.
Tínhamos de avisar a família. Localizamos o endereço no cadastro e fui com
a supervisora até a residência, mas não havia ninguém. O porteiro comunicou que
a filha trabalhava numa repartição pública e nos deu o endereço e o seu nome.
Fomos até ela. Combinamos que a supervisora daria a notícia. Chegamos no local,
nos anunciamos e a moça veio em nossa direção, sorrindo. Alegre e simpática
como o pai, pensei. A supervisora, tomada de súbita emoção, sussurrou que não
poderia dar a notícia, delegando a mim a tarefa triste e amarga, da qual não me
abstive.
http://fabriciomauricio.com.br/portfolio_page/77-lagrimas/ |
O que dizer a um filho nessa hora? Não sei
o que falei, não lembro das palavras exatas, tentei ser o mais cauteloso
possível e contei o ocorrido. A moça chorou e se desesperou. Depois de algum
tempo, nos acompanhou até a agência e tomou todas as medidas necessárias. Esta história aconteceu realmente e afetou a
cada um de nós, funcionários, de maneiras diferentes, íntimas e pessoais,
mostrando que a morte é poderosa, ela manda, determina e age.
Referências:
Caixa Econômica Federal. Gente de talento 2005: As melhores
histórias da gente da CAIXA em prosa, verso e imagens / Caixa Econômica Federal
– Brasília: Caixa 2005.
Imagens retiradas da Internet, sem
finalidades comerciais:
http://blog.cancaonova.com/diarioespiritual/tag/abandono/
http://www.conexaojornalismo.com.br/todas-as-noticias/as-caras-da-morte-0-19342
http://tarot-ellyllon.blogspot.com.br/2012_03_01_archive.html
http://www.cacodarosa.com/noticia/4904/homem-encontra-envelope-com-rs-50-mil-e-devolve-ao-proprietario
Edmilson Corrêa é administrador,
pós-graduado em
Gestão de Crédito
Imobiliário e funcionário da Caixa Econômica Federal há 25 anos.
Essa é uma das muitas histórias que ele tem
para contar...
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