Vale tudo?
Caminhando pelas ruas do centro do Rio de Janeiro,
apenas escutei uma discussão cujo tema era o que “A” achava do comportamento de
“B”. Nada mais ouvi, não sou tão fofoqueiro assim. Isso me relembrou de outros
momentos sociais em que o “achismo” ganhou cada vez mais espaço.
É muito comum ler nas redes sociais discussões
acirradíssimas sobre o que fulano acha ou o que cicrano discorda. Até aí tudo
bem! Mas, vejamos bem: é altamente preocupante o número crescente de cidadãos
autodidatas em várias áreas, desde medicina, direito, aos direitos humanos. Isso
porque cada um acha mais e melhor que o outro e, muitas vezes, sem nem
pesquisar a fundo sobre o tema. O que importa é impor a sua opinião como
verdade universal.
Há pouco tempo, até li uma matéria na qual Umberto Eco
acaba por criticar o mau uso das redes sociais. E, acho muito importante propor
uma reflexão sobre esse tema. Estamos sendo responsáveis ao relatar o que
pensamos? Pensamos mesmo isso ou apenas, num momento de compulsão, julgamos o
que não conhecemos a fundo?
Obviamente, isso implica em outro problema que causa
bastante confusão e que se lê por aí da seguinte forma: “E a liberdade de
expressão?”. Acho bastante complexo falar em liberdade de expressão quando isso
implica diretamente a privação/violação dos direitos alheios. Parece, na
verdade, que muitos acreditam que estamos numa sociedade do vale-tudo. Mas,
vale? E se fosse você a pessoa ofendida? Voltando ao início do meu texto e à
conversa que escutei, utilizando um argumento cristão, cadê o respeito ao livre
arbítrio?
Vivemos numa sociedade que não consegue sequer
compreender o que é “Moral”, a qual, conforme o filósofo Gilles Deleuze (2002, p.29)
relaciona-se ao julgamento, à utilização dos valores de bem e mal, que, muitas
vezes, acaba por propagar uma ilusão de valores a qual “se confunde com a
ilusão da consciência: porque a consciência é essencialmente ignorante, porque
ignora a ordem das coisas e das leis, das relações e de suas composições,
porque se contenta em esperar e recolher o efeito, desconhece toda a Natureza”.
Falar em moral, impondo uma determinada, não é ignorar? É tão custoso assim
conhecer e buscar um plano mais conciliatório pautado no respeito ao Outro e
não somente aos achismos acerca do outro? Reflexões que busco fazer sem intuito
pedagógico. Apenas acredito que o questionamento de si mesmo e das atitudes que
temos diante do Outro faz-se imprescindível no tal mundo que se deseja melhor.
E como teremos alguma melhoria num mundo onde todos devem ter os mesmos
direitos e deveres, mas que muitas vezes é conhecido por desrespeitá-los?
Referência:
DELEUZE, gilles. Espinoza: filosofia prática. São Paulo: Escuta, 2002.
Rodrigo Corrêa Machado é colunista da ContemporARTES desde 2009, quando a revista foi criada. Juntamente com Ana Dietrich, Izabel Livisk e Vanisse Simone é coordenador desse periódico. Ele trabalha com coordenação e orientação pedagógica no Colégio Pedro II, é professor substituto de literatura portuguesa na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), doutorando em Estudos de Literatura pela Universidade Federal Fluminense (UFF), mestre e licenciado em Letras pela Universidade Federal de Viçosa (UFV).
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