quarta-feira, 6 de julho de 2016

Esse Lixo é para Sempre




Gorleben é a região para onde vai o lixo atômico produzido na Alemanha e no norte da França. Vira e mexe tem ativista se acorrentando na linha do trem que faz o transporte do lixo para o depósito, construído há alguns quilômetros da cidadezinha. A história é antiga, desde 1986 vem se "estudando" a possibilidade de enterrar para sempre todo este lixo num domo de sal na região. Todo alemão que ouve o nome "Gorleben" já sabe do que se está falando.

Fale "Gorleben" para um alemão, e ele vai pensar "energia atômica".

Outra referência na questão atômica, mas desta vez no combate e crítica à ela, é a Anti-Atomkraft-Bewegung, o Movimento Anti Energia Atômica, que existe há mais de 40 anos. Sua bandeira amarela com um sol vermelho sorrindo - Será que foi o avô do smiley? -  é conhecida em vários países, onde ele é ativo.  

O Movimento organizou ontem uma caravana de tratores para protestar contra a decisão da  Endlagerkomission, Comissão de Armazenamento Definitivo, que apresentou sua conclusão para o problema do armazenamento do lixo atômico e não descartou o domo de sal de Gorleben, apesar das críticas e das conhecidas dúvidas sobre a sua segurança. 

Ao fundo a Siegssäule, o Obelisco da Vitória.

 E foi por isso e assim que a minha cotidiana manhã de terça se transformou num passeio turístico da cultura de protesto. E ainda com um tema que, para mim, é "típico de alemão" e ainda "típico" dos anos 80 e 90: os protestos contra a energia atômica. Não nos esqueçamos que foram os alemães que nos venderam aquelas duas "maravilhas" lá de Angra dos Reis... 

Ao ser surpreendida no meio do meu caminho de volta para casa com um desfile de tratores, decidi ir acompanhando o protesto para ver onde e no que ia dar.  Foram parar na frente do Ministério do Meio Ambiente. Ali esperava por eles um grupo com bandeiras e faixas. 

Bandeiras do Movimento Anti Energia Atômica, ao fundo a cúpula do Reichstag.

 Fiquei observando o amontoado de poucas pessoas, talvez umas 100, contando com os jornalistas, e o mais jovem parecia já ter prá lá dos seus 40 anos. Ver pessoas mais velhas ativas, organizadas numa luta na qual devem estar engajados desde o final dos anos 70, me fez pensar em duas coisas, a primeira positiva, na força inabalável destas pessoas e na lição de cidadania que dão a todos nós. A segunda negativa, há quantas décadas os cidadãos estão lutando em vão pela segurança de suas vidas contra o "progresso tecnológico"...

"Quando o injustiça se torna lei, a resistência é obrigatória." (trad. livre)

E dando mais um passo, pensei na construção da ideia de progresso com algo bom, positivo. Pensei no Brasil: "Ordem e Progresso" é o lema da nossa bandeira. De repente "progresso" pra mim virou sinônimo de muita coisa ruim, de destruição e "ordem" de repressão e perda de liberdade...


E aqui acabou a caravana, em frente ao Ministério do Meio Ambiente.




Ana Valéria mora em Berlim e observa a cidade há quase duas décadas. Estudou história no Brasil e na Alemanha, mas cabou mesmo trabalhando como tradutora. 



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