sexta-feira, 23 de setembro de 2016

O lenço azul






Como é o instante em que se perde um grande amor? Para responder a essa pergunta, trago um texto de uma mulher que relembra esse momento...





Dezembro. Sol lilás perdido na espiral do tempo. Brisas fugidias a soprar sussurros de mágoas nas sombras rendadas das centenárias árvores. Praça Ozório. Lusco-fusco de personas, children e o ônibus amarelo.


Uma jovem. Vinte e dois anos. Olhos negros profundos e inertes, fixos em seu algoz. Sim, escolhemos nosso algoz. Seu corpo trêmulo, desconexo, suspenso pela surpresa da ingratidão e da traição. Sonhos desfeitos. Quimeras. Pássaros cantando o desamor daquele trágico momento. Seus olhos ardiam, sarça denunciando as labaredas da alma.



Então o gesto de adeus e o lenço azul. Nem era sua cor preferida. Copiosas lágrimas pela face emudecida pela dor. Foram as últimas choradas, em sua existência.  E a dor de amor, que não tem cura. É para sempre. O lenço azul, oferecido como último ato de misericórdia,  para suavizar as lágrimas insanas.



Hoje seus olhos esmaecidos buscam no crepúsculo um repouso.
E o lenço azul, banhado pelas lágrimas atemporais do adeus e do desamor  descansa, como em relicário patinado pelo tempo, em uma caixa com flores de lavanda secas e esmaecidas, emoldurado pela finitude da vida não vida.







Margot Stern é enfermeira e professora. Ainda acredita no amor e ainda guarda aquele lenço azul...



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