Fotos de Caco Tirapani


Excepcionalmente a coluna Escritos Contemporâneos hoje publica um ensaio do fotógrafo e historiador Caco Tirapani, de Santo André, realizado em noite no famoso clube noturno dos anos 80 Madame Satã em março desse ano. O clube fica na Bela Vista (São Paulo-SP) e quem quiser conhecer sua história, leia mais aqui.








Caco Tirapani, historiador e coordenador da Casa da Palavra (Santo André), é fotógrafo.

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Salmo 91 - estreia



Dia 8 estreiou o espetáculo teatral Salmo 91, texto de Dib Carneiro Neto e Direção de Djalma Thürler, no Teatro Molière em Salvador. Para quem quiser assistir, a obra fica em cartaz para dia 25, de 5a. a domingo.


Abaixo, reproduzimos artigo publicado no site Cultura Baiana sobre o espetáculo.






Salmo 91 conta história dos presos do Carandiru


Dirigida por Djalma Thürler, essa é a segunda montagem brasileira do texto de Dib Carneiro Neto que estréia em Salvador em 08.03.
No ano do vigésimo aniversário do massacre Complexo do Carandiru, estréia no dia 08.03, em Salvador, apeça Salmo 91. Dirigida por Djalma Thürler, essa será a segunda montagem brasileira do texto, que venceu o Prêmio Shell em 2008. A temporada acontece de quinta a domingo, no Teatro Molière, sempre às 20h. O elenco conta com Lucio Tranchesi Rubio, Fábio Vidal, Duda Woyda, Rafael Medrado e Lucas Lacerda.
Com texto de Dib Carneiro Neto baseado no romance de Dráuzio Varela Estação Carandiru, a peça conta as histórias de dez presos do pavilhão nove, onde oficialmente 111 foram assassinados, naquela que é conhecida como a maior chacina do sistema penitenciário brasileiro. Crime, vaidade, medo, desejo e violência brotam das grades, desenhando um emaranhado vivo da vida no cárcere.
A delícia do crime – Estruturado em dez monólogos, o texto explora a visão pessoal dos presos sobre vida e crime. Mas as histórias não são isoladas; elas se comunicam entre si, com o personagem Dadá atravessando as falas dos companheiros, como narrador destes contos da vida real. “Quero mostrar que estes presos não são coitados, mas também têm prazer pela marginalidade” diz Thürler, para quem o grande trunfo do texto é dar voz ao subalterno. “Salmo 91 dá voz a bandidos inescrupulosos, matadores impiedosos e criminosos revoltantes.” completa.
A peça faz parte da trilogia sobre o cárcere, inaugurada com O melhor do homem, em 2010. Além das questões que envolvem o controle carcerário, Salmo 91 também trabalha com a produção de masculinidade. “É um universo muito masculino, mas também extremamente lírico. Se retirados do contexto penitenciário, seriam dramas sobre a crise da masculinidade tingidos de uma urgência trágica”, conta o diretor.

Estreia: 08.03
Apresentações: Quinta à Domingo
Local: Teatro Molière, Av. 7 de Setembro, 401 – Ladeira da Barra.
Horário: 20h
Preços: R$ 20 e R$ 10
Direção: Djalma Thürler
Texto: Dib Carneiro Neto
Cenografia: José Dias
Elenco: Lucio Tranchesi Rubio, Fábio Vidal, Duda Woyda, Rafael Medrado e Lucas Lacerda
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Sobre a condição do ser no atual estado de coisas por Tatyane Estrela



Muitas vezes me pergunto, qual a relevância da exposição dos mais íntimos detalhes de uma condição pessoal particular. Em minha trajetória, sempre compreendi, que a busca de equidade, respeito e participação deveriam ser os principais objetivos a serem alcançados de alguém que estivesse numa condição social fragilizada. Pouco ou nada contribuiria para atingi-los, ficar lamentando minhas desgraças ou desnudando meus dramas em praça pública. Não me faltaram oportunidades para conseguir obter ganhos pessoais com o uso populista de uma ou outra fragilidade, nem pessoas que cientes dos usos que se podem fazer das histórias alheias, que se aproximaram de mim para explorarem das minhas excentricidades. Obviamente sempre afastei-me de tudo isso. Isso permitiu que nos diversos caminhos que trilhei, pudesse ter uma certa “paz” e criar laços sociais mais fortes, intensos, sinceros, com pessoas que eram capazes de amar as(os) outras(os), independente de rótulos e livre do utilitarismo mesquinho que está presente como uma praga na maior parte das relações humanas.

Eis que coloco uma questão, se uma pessoa tem uma condição especial, que muitas vezes não é bem acolhida pela sociedade em que vive, quais posturas deveria adotar para viver melhor? sofrer menos? e evitar desgastes desnecessários? Penso que enfatizar sua diferença só lhe faria aumentar a hostilidade social. Escondê-la lhe causaria profunda destruição interna e lhe obrigaria a viver personagens que se distanciam muito de seus mais profundos sentimentos e desejos. O que fazer então diante de tal dilema? Não sei se é possível dar uma resposta razoável para situação de tamanha complexidade. Mas enxergo alguns caminhos ao horizonte, ao relembrar momentos históricos de lutas e transformações sociais.

Em primeiro lugar, creio que seja necessário montar um “quadro” sobre a sociedade e comunidade aonde se está inserida(o) e delimitar as bases teóricas, empíricas e religiosas sobre as quais foram estruturados os papéis sociais e as formas de vida possíveis em coletividade. Feito isto, o mapeamento das condições sociais que causam opressão, desconforto social e marginalização precisa ser realizado. Com o quadro e o mapa das “irregularidades”, deve-se buscar entender quais são as possibilidades de mudança social, quanto tempo seria possível para tal empreitada, a quantidade de esforços que se está desposta(o) a gastar em prol destas ações, quais os impasses e as possibilidades que se colocam no caminho, aonde se quer chegar com isso e o que se pode fazer depois de alcançar tais mudanças. Creio que o item “aonde se quer chegar” tem uma importância central nesta reflexão. Diante do panorama do fim das narrativas universais, da morte dos heróis e de qualquer paradigma sólido que pudesse amparar as construções pessoais dos indivíduos, parece que não há possibilidades de ter algum equilíbrio, consciência de si, de seus atos e da possibilidade de se ter alguns planos pessoais a se realizar. Entendo que tal realidade, tem forte respaldo nas vivências as quais somos submetidas(os). Curiosamente nos abre grandes possibilidades de manobras de nossas condições, de uma tal forma, que surpreenderia muitos de nossos antepassados. Mais intrigante é, o fato de que tudo isso pode nos imobilizar, imbecilizar, nos tornar apáticas(os), desinteressadas(os), desgastadas(os). Fazer com que ajamos como crianças delirantes, sem a inocência necessária para não sofrermos, mas sem a capacidade de discernimento necessária para tomarmos decisões diante dos problemas que se colocam sobre nós.

Longe de poder responder de forma suficiente a problemática colocada, desejo apenas implantar de forma radical em mentes e corações aparentemente centrados algumas questões: Qual o sentido? Vale a pena? Por que? Até onde isto é meu? Estou reproduzindo, recriando ou apenas seguindo a programação feita? Até onde vai o meu eu, se é que ele existe? Como posso conceber e delimitar o chamado livre-arbítrio? O que sobra desta suposta liberdade à que fui submetida(o) ao nascer, por um contrato social que não me recordo ter assinado? Devo crer em um(a) criador(a), ou criar-me como tal? Buscar a fé ou o conhecimento? O que é legítimo de ser feito, dito, pensado, desejado? São dignas tuas ações? Sente-se bem se enxerga o que há a tua frente? Considera-se tão especial que é incapaz de perceber os moldes que lhe deram forma? E se você pensasse ser outra criatura, e fala-se como outra, e agisse como outra, se é que você já não o faz? Onde está você? Para onde pensa que vai? …


Feitas estas considerações, deixo as reflexões para as(os) leitoras(es), como uma pitada de sarcasmo, diante da arrogância insuportável de seres desprezíveis que buscam animalescamente defender seu território, sem poderem perceber, o quão escravos estão da ordem estabelecida. Ordem decadente e deprimente, que não suporta a si própria e que ao sucumbir, há de levar consigo a corja que lhe sustentou. Diante disto é inútil querer expor as desgraças de si, numa realidade desnuda e putrefata pelas mazelas de uma sociedade que foi incapaz de criar as condições para que a plenitude humana fosse realizada no sentido de universalizar o que de melhor pode-se fazer quando bilhões de mentes, braços e corações estão unidos por um único ideal, fazer do amanhã (meu, seu, de outra(o)), melhor do que o dia que se finda.

Tatyane Estrela é graduanda no Bacharelado em Ciências e Humanidades e no Bacharelado e Licenciatura em Filosofia na Universidade Federal do ABC. Integrante do grupo de pesquisa: Conflitos, diversidades culturais e tecnologias e integrante do Apoena - Grupo de estudos filosóficos transdisciplinares. Bolsista de iniciação científica do CNPQ, no qual desenvolve pesquisa com o seguinte tema: Formação e atuação de entidades de representação LGBT no grande ABC: Impactos na formulação de políticas públicas.
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Dia da Mulher - Homenagem


Em homenagem a todos Clarices, Paulas, Solanges, Saras, Serafinas, a Contemporartes publica hoje a crônica do escritor baiano Marcelo de Oliveira Souza.

MULHER ADMIRÁVEL

Durante muito tempo, desde que o mundo é mundo, a mulher tem vital importância na sociedade, sendo ainda o verdadeiro sustentáculo da família, ainda progride e evoluí.
Quando falamos daquela mesma história da mulher ser o sexo frágil, ainda pensamos naquele estereótipo do século passado, onde o sexo feminino não podia nem votar, expressar os sentimentos, cujo homem seria o chefe da família.
Nos tempos modernos, felizmente isso mudou muito, as mulheres mostram que a diferença entre os sexos está na cabeça de quem enxerga, ela conquistou o seu espaço e hoje não precisa mostrar mais nada.
Essas mulheres admiráveis,  desfilam a sua elegância e sensualidade em todo o canto, alegrando a vida do homem, trazendo mais paz a esse mundo, ainda são catalisadoras da violência, como tem menor força bruta, sofrem agressões, são castigadas por produzirem, saírem de casa para sustentar ou ajudar no sustento na sociedade moderna.

Hoje todos nós percebemos que o “sexo frágil” não existe, a força de vontade sempre esteve com ela, faltava era a oportunidade de mostrar todo o seu valor, sua garra, pois a mulher é um corpo só que se divide em vários, produzindo, acalentando, apaziguando, amando e até governando.
Por isso nada é mais justo que no dia internacional da mulher, todos nós lembrarmos de seu valor e desejarmos um feliz dia da mulher!



Marcelo de Oliveira Souza
Salvador Bahia Brasil
http://marceloescritor.blig.ig.com.br
http://marceloescritor2.blogspot.com
www.poesiassemfronteiras.no.comunidades.net - Site oficial do concurso POESIAS SEM FRONTEIRAS


Escritor Filiado À Ube – Cappaz - ACLAC -Poetas del Mundo    




Hoje trazemos novidades do Núcleo Leste de Minas - coordenado pelo Prof. Mestre Adriano de Almeida. O núcleo, sediado em Caratinga (MG), traz novas frentes de pesquisa ao Laboratório.

Projeto Lepcon - Núcleo Leste de Minas
As propostas de projetos, tanto de pesquisa quanto de extensão, já estão em andamento e todos os pesquisadores, uma vez vinculados, estão convidados à apresentarem novas ideias e novos projetos a serem desenvolvidos junto ao Laboratório. 

- O projeto "Mãos de Tesoura Cineclube", é uma proposta que demandará um esforço conjunto do nosso Núcleo Leste de Minas para sua efetivação, uma vez que precisa de um grande apoio de várias frentes, mas iremos investir nesse caminho com toda a nossa dedicação.

Além desta temos, já arroladas, diferentes frentes de trabalho em pesquisa/extensão:

- O projeto "Paisagens Retratadas: O sagrado e o profano no cenário da cidade" que busca, por meio de uma metodologia de história oral, reconstruir a perspectiva dos lugares na memória dos moradores da cidade de Caratinga, apresentando essas formas finais em uma exposição e um livro de fotografias.

- O projeto do Prof. João Martins, de uma democratização do conhecimento junto à comunidade local em Vargem Alegre, ao qual aceitamos sugestões de título além da minha proposta citada "De cabeça e pés na estrada: Democratização e popularização do conhecimento entre estudantes do ensino fundamental e médio na cidade de Vargem Alegre-Mg"


Adriano de Almeida é mestre em Extensão Rural pela Universidade Federal de Viçosa.

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A INFÂNCIA ROUBADA

 
  
Olá a todos estamos de volta depois de uma longa, e boas férias. E nessa volta que refletir sobre a condição de ser criança na nossa sociedade.
Esse ano tenho trabalhado diretamente com crianças de 06 a 11 anos e a minha contestação é que algumas já perderam a essência e outras estão indo no mesmo caminho.
E o triste é que não há mais diferença entre um lar problemático e um lar consistente, elas não sabem mais brincar, conversar e muito menos interagir entre si.
Lembro que na minha infância podíamos brincar, tínhamos liberdade de ficar na rua e assim aproveitar cada instante do se criança. Gosto de lembrar as brincadeiras como pular corda, amarelinhas e tantas outras.
Nos dias atuais as maiorias das pessoas não se importam com a real situação das crianças, criam-se leis e mais leis de proteção ao menor e nada vemos acontecer de sólido.

O que tem acontecido é crimes que estão acontecendo de formas alucinadas contra nossos pequenos, é mãe jogando seus bebês no lixo, pais que matam sem a menor piedade, isso sem falar dos abusos sexuais seguidos de morte ou não. Às vezes penso que cometer um crime contra criança está se tornando tão corriqueiro como ir ao mercado, beber água e outras coisas corriqueiras. Não sei por onde anda o ECA, os Direitos Humanos e outras tantas organizações que dizem zelar pelos direitos dos pequenos.

Sinceramente gostaria de um dia ver as crianças serem crianças, gozando de liberdade, livres de maus tratos, da violência sexual, das violências psicológicas, do abandono, das latas de lixo, dos becos, das sarjetas.

Sonho com um Brasil pronto para cuidar e zelar pelas nossas crianças criando uma sociedade consciente que aprenda a respeitar cada um de nossos pequenos cidadãos.


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A poetisa de Goiás: Cora Coralina



"Feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina"

Hoje vamos falar de uma poetisa incomum, que soube plasmar sentimentos e orações, aproximando-nos de uma poesia singular e, ao mesmo tempo, bem peculiar. Hoje vamos falar de Cora Coralina. Nascida na Cidade de Goiás (antiga Vila Boa), Cora é além de poetisa, uma contista consagrada na literatura brasileira. Seu primeiro livro foi publicado quando ela já ultrapassava seus 75 anos de idade.

Mulher simples, sempre vivera no interior, sendo este, temática de sua obra, inclusive, podemos dizer que seja um estilo próprio da autora. Sua sobras retratam esse caráter singelo dos interiores do Brasil, sendo destaque, o interior de Goiás.



Com uma obra voltada ao conteúdo, não propriamente a forma, Cora Coralina conseguiu ser inigualável em seus escritos, absorvendo elementos folclóricos e inserindo em seus textos.
Cora Coralina faleceu na Capital do estado, Goiânia, em abril de 1985, deixando uma riqueza de obras para todos nós.

Publicações:

Estórias da Casa Velha da Ponte (contos)
Poemas dos Becos de Goiás e estórias mais (poesia)
Meu Livro de Cordel
O Tesouro da Casa Velha
Vintém de Cobre
A Moeda de Ouro que o Pato Engoliu (infantil)
As Cocadas (infantil)
Meninos Verdes (infantil)

Renato Dering é escritor, mestrando em Letras (Estudos Literários) pela Universidade Federal de Viçosa (UFV), sendo graduado também em Letras (Português) pela Universidade Federal de Goiás (UFG). Realizou estágio como roteirista na TV UFG e em seu Trabalho de Conclusão de Curso, desenvolveu pesquisa acerca da contística brasileira e roteirização fílmica. Atualmente também pesquisa a Literatura e Cultura de massa. É idealizador e administrador do site EFFI, que divulga o cinema e conteúdos audiovisuais. Contato: renatodering@gmail.com @rdering




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Capitu traiu ou não traiu? de Raphael Reis




 Leaphar entrou na livraria S., localizada na cidade mais conhecida como Manchester Mineira, apesar de que, atualmente, suas fábricas e indústrias estão “pegando” as boas ondas nas praias do Rio de Janeiro.
   Observou a decoração em madeira, percorreu com o olhar as prateleiras. Queria algo de ficção científica, mas o que mais chamou sua atenção foi a seção de romances. Tomou em suas mãos o dvd de Tristão e Isolda; gostou da sinopse, qualquer dia o iria ver. Imediatamente lembrou-se, de relance, do caso do “Curioso Impertinente” – foi algo efêmero. Abriu o livro de Shakespeare, Romeu e Julieta, mas levou  mesmo foi Dom Casmurro, embora já o tivesse lido na época de vestibulando; gostava dos escritores nacionais.fast food e outros tipos de consumismos. 
   Saiu da livraria, andou pelo shopping, viu pessoas bonitas, a maioria fútil.

  Admirou esteticamente algumas garotas, até assobiou para algumas. Seu pescoço às vezes parecia entortar de tanto olhar para trás. Tenho para mim que esses comportamentos revelam a sensibilidade que o homem tem em apreciar o belo.
   Chamou-lhe atenção a promoção do vinho chileno, Santa Helena; saboreou-o em sua imaginação, paladar convidativo. Porém, levou mesmo foi o vinho argentino Trapiche, induzido pelo vendedor.
   Saiu naquela tarde chuvosa; desceu os degraus, satisfeito com suas compras. Combinação perfeita: leitura e vinho. Deixou o shopping pensando na namorada Geise. Talvez fosse mais interessante a companhia feminina para a degustação do vinho. Decidiu: foi para a casa da namorada. Lá chegou às vintes horas, no bairro nobre do Bom Pastor. Beijou-a e, em seguida, assentaram- se no sofá. Assistiram a qualquer coisa sem importância, programação de domingo.

   Leaphar lembrou-se do dia anterior; os dois haviam comprado algumas caixas de bis; duas de bis branco e duas de preto. Colocaram no pote da mesa de centro, variando bis preto e branco. Geise detestava bis branco; ele gostava.
   Leaphar abriu o pote e observou que só havia bis preto. Em um relance, pensou: quem teria comido os bis brancos, visto que Geise morava sozinha e possivelmente não recebia visitas? Logo, perguntou a Geise: alguém veio aqui? Quem comeu os bis brancos?
   Ela serenamente respondeu que deu vontade e comeu todos eles.
   Inconformado, incomodado e confuso, levantou-se do sofá, foi até a geladeira, guardou o Trapiche. Silencioso, ficou a olhar o vazio da geladeira. Pegou a garrafa de champanhe da noite anterior, um problema sensorial: a garrafa estava em um terço de líquido, embora tivessem deixado pouco mais de meia garrafa – ausência suficiente para duas meia taças.
   Voltou à sala, caminhou até a varanda, avistou a bela paisagem que lhe configurava. A pracinha do Bom Pastor estava linda naquela noite, dia de lua cheia. Lembrou-se de uma das aulas de história na qual o professor dizia, com certo ar romano, as palavras de César para sua esposa: – não basta que sejas honesta,
 tens que parecer honesta!
   Pensamentos flageladores, bis brancos e champanhe, honestidade e aparência da honestidade. Geise podia até ser honesta com ele, mas não estava aparentando ser.
   É saber que no contexto em que vivera, a traição era algo normal, perdoável e até justificável. Às vezes, a vítima é que era culpada, mas não para ele; tinha uma honra a zelar.
   Estava evidente: Geise tomou champanhe com alguém e esse desgraçado alguém comeu seus bis brancos. Pensamentos construíram a cena da traição. Os sorrisos de Geise com o anônimo, seguidos de seus olhos sedutores de cigana, o champanhe sedutor, a vestimenta e o que a teria levado a fazer aquilo. Ele era um bom rapaz, sempre a respeitou. Pode dizer a leitora maliciosa e feminista: mas ele mexia com as garotas, as devorava  com os olhares. Mas, desafio esse tipo de leitora: qual homem que não faz isso? Friso: essa atitude é mais estética do que outra coisa, acreditem!
   Enraivecido, rangeu os dentes. Deu vontade de chorar, não chorou. Geise, notando a tensão do namorado  perguntou, dissimuladamente, se havia acontecido algo e pediu para que ele se sentasse ao seu lado.
   Leaphar só escutou a primeira parte. Disse que estava com mal-estar, despediu-se e combinou que no outro dia ligaria. Entrou no elevador e notou que sua fisionomia não estava nada boa. Encarou sua imagem no espelho e percebeu-se um fracasso; envergonhou-se; imaginou como seria a reação das pessoas quando soubessem que ele fazia parte do clube dos cornos. Gritou, silenciosamente, filha da puta!
   Os sonhos, o dia de trabalho, foram intranqüilos.

   O celular tocou, era Geise. Disse a Leaphar que algumas meninas da universidade a convidaram para ir a uma churrascaria e fez questão de deixar bem claro que não havia nenhum garoto na turma. Leaphar ficou mais desconfiado e irritado, embora tranquilo por uma suposta ausência masculina, isto é, claro, se fosse verdade. Respondeu que estava tudo bem, que poderia ir sem problemas, porém, não queria que ela fosse de jeito algum.
   Às vinte e três horas ligou para a casa de Geise, só chamava, ela não tinha voltado. Desesperado, ficou a sua espera no outro lado da rua. Ficou à espreita. Quem iria trazê-la para casa, pensou. Passaram-se mais trinta minutos; ligou para o celular da namorada. Depois de três chamadas insistentes, Geise atendeu.
   Leaphar não escutou uma palavra da namorada, só ouviu uma voz masculina que ria ao fundo. Desligou  tremendo de raiva e suas suspeitas já eram a mais pura realidade.
   O ódio e a imaginação lhe tomaram conta. Não aguentava mais esperar, seria insuportável ver a traição. Angustiado, lamentava
o que estava acontecendo com ele. Os fatos já indicavam tudo. Percebeu as polaridades do ser humano: o amor e o ódio, a traição e a fidelidade, instinto animal e comportamento padronizado. Foi para casa.

   O racional virou irracional e o irracional virou racional. Desprezou Geise, rechaçou todos os telefonemas, não queria mais conversar com ela, ignorou-a completamente.
   Após o sexto dia, a convite de um amigo, foi a um churrasco. Claro, sem Geise, nem comunicou a ela que iria. Lá encontrou Paula, mulher de fascínio e qualidades mil. Um metro e setenta de altura, cabelos lisos pretos e compridos, olhos escuros, roupa sedutora e salto alto com estampa de onça, unhas pintadas
da cor que ele mais gostava – o vermelho.
   Contudo, entre todas essas qualidades, o que mais chamou a atenção de Leaphar foi a boca e o sorriso. Gostava de mulheres que tinham boca grande e lábios carnosos, apesar de que os de Paula eram leves e finos.
   Primeiro, disfarçou. Colocou a aliança de compromisso em um dos bolsos da calça, aproximou-se, conversou alguns minutos e finalmente se beijaram.
   Para Paula ele foi apenas mais um e para Leaphar foi a glória, sentimento de alívio, de vingança, de revanche. Suas angústias foram desaparecendo aos poucos; afinal, para ele, os dois
estavam, agora, quites.
   Chegando a sua casa, tomou uma ducha refrescante. Antes de dormir, foi até sua mini-biblioteca. Pegou em mãos o livro machadiano que comprara na livraria; estava no último capítulo, “E Bem, e o Resto”?
   Como se algo estivesse errado, leu, desconfortavelmente: “não tenhas ciúmes de tua mulher para que ela não se meta a enganar-te com a malícia que aprender de ti”.
   Fechou o livro apressadamente, o desassossego lhe reinou. Foi ao telefone, ligou para Geise.

Este conto faz parte da obra "Contos que Machado de Assis e Jorge Luis Borges Elogiaram", de Raphael Reis
 
Raphael Reis
 
Livro "Contos que Machado de Assis e Jorge Luis Borges Elogiaram", de Raphael Reis. Confira no blog www.donraphaelreis.blogspot.com os pontos de vendas, críticas literárias e outras informações.
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