Alberto Caeiro amoroso

          


Alberto Caeiro é um dos heterônimos de Fernando Pessoa mais famosos. Ele é considerado o mestre dos outros grandes heterônimos, Álvaro de Campos e Ricardo Reis, e de seu próprio autor. Tornando-se mestre literário e intelectual, apesar de ter completado apenas a educação primária.

A. Caeiro foi um poeta que prezava por olhar as coisas, ligado à natureza e desprezando qualquer tipo de pensamento filosófico. Entretanto, em sua simplicidade, ele acaba por criar uma nova filosofia. Ele proclama-se um anti-metafísico que acredita que “Pensar é estar doente dos olhos”. A linguagem de Caeiro é simples, familiar, seus versos são livres, objetivando sempre ver a realidade objetiva e natural. Dentre os poemas escritos por esse heterônimo pessoano, há também aqueles amorosos, que destacamos abaixo:

Quando eu não te tinha
Amava a natureza como um monte calmo a Cristo...
Agora amo a natureza
Como um monte calmo à Virgem Maria
Religiosamente, a meu modo, como dantes,
Mais de outra maneira mais comovida e próxima...
Vejo melhor os rios quando vou contigo
Pelos campos até à beira dos rios;
Sentado a teu lado reparando as nuvens
Reparo nelas melhor –
Tu não me tiraste a Natureza...
Tu mudaste a Natureza...
Trouxeste a natureza para o pé de mim,
Por tu existires vejo-a melhor, mas a mesma,
Por tu me amares, amo-a do mesmo modo, mas mais,
Por tu me escolheres para te ter e amar,
Os meus olhos fitaram-na mais demoradamente
Sobre todas as cousas.
Não me arrependo do que fui outrora
Porque ainda o sou.
(PESSOA, 2007, p. 229)

Destaquemos no poema acima as revoluções que o amor proporcionou ao eu lírico, uma vez que ele diz que não mudou, sendo o mesmo de antes, mas com menos névoa nos olhos. A primeira coisa a sublinharmos é a capacidade que o amor possibilitou o sujeito poético a vislumbrar a essência das coisas.

Se antes do amor, ele “Amava a natureza como um monte calmo a Cristo...”, agora ele a ama “Como um monte calmo à Virgem Maria”. Essa mudança na maneira de amar um monte ocorre, necessariamente, pela capacidade do eu lírico vislumbrar a essência das coisas, o início, o ponto zero, antes mesmo que elas surjam. Como Maria foi um instrumento divino de trazer Cristo ao mundo, é dela, enquanto ser humano, que parte a renovação do modo de ver, pensar, ser e estar no mundo, revelada por Jesus Cristo.

O amor fez com que a maneira de sentir a natureza, de alguma maneira, se tornasse distinta de antes. Pela existência do amor, a natureza é vista “vejo-a melhor, mas a mesma”, amada “amo-a do mesmo modo, mas mais”. Os próprios olhos do sujeito poético tiveram a paciência e capacidade de fitarem “mais demoradamente”, de vislumbrarem o mundo de maneira distinta, buscando sentir a essência das coisas.



Rodrigo C. M. Machado é mestrando em Letras, com ênfase em Estudos Literários, pela Universidade Federal de Viçosa. Dedica-se ao estudo da poesia portuguesa contemporânea, com destaque para a lírica de Sophia de Mello Breyner Andresen



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Adeus forró, vou ouvir Arautos do Rei: Identidade Cultural, Música e Religião


Katia  Peixoto dos Santos/ Fernanda Vidal .
Como é difícil para nós brasileiros, pensarmos nossa identidade cultural. Se fizermos um recorte nesta história toda, temos, para começo de conversa, grandes influências de várias etnias que fizeram parte no nosso processo de colonização. Nossos antepassados  imprimiram traços fortes na nossa forma de agir, pensar, vestir, etc. Porém, a todo instante novas influências surgem, acentuadas pelos processos de êxodos ocorridos no decorrer dos tempos, pelas imigrações e migrações oriundas de inúmeras motivações, pelas mídias e pela ampliação das Redes Sociais, You Tube, Google...  São tantas as possibilidades de crenças, valores e modos de viver que herdamos de distintas culturas, que o conflito se estabelece e é visível na nossa formação de comportamentos, de ações e reações, de intenções, e por ai vai. Somados a tudo isso temos ainda as diferenças sociais,  intelectuais, religiosas que também imprimem sentidos na nossa forma de agir e pensar e que estão muitas vezes dissociados. Um exemplo disso é o número de casamentos em igrejas realizados por pessoas que não costumam frequentar tais igrejas.
A música  tem um papel fundamental na formação da identidade de um povo. Este é um processo de mão dupla, ou seja, tanto as músicas que ouvimos desde criança podem influenciar nossos gostos e costumes ou, por outra via, se começarmos a ouvir músicas  inéditas para nós, podemos mudar nosso comportamento, nossas crenças e valores mediante as mensagem musicais oferecidas.
O Brasil é um pais imenso, um gigante que tem culturas regionais bem diversas. Cada estado brasileiro tem suas comidas prediletas, suas expressões artísticas e idiomáticas, suas danças, músicas, artesanato, que por sua pluralidade, podem surpreender qualquer brasileiro que não convive naquela cultura.
Mas, quando se vive em São Paulo, essa enorme metrópole, ficamos ainda mais suscetíveis a agregar novas formas de vidas e valores às nossas próprias vidas. Aqui a confluência destas culturas, regionais, mundiais e digitais, se mesclam e se convergem.  Estes processos, digamos, de aculturação, são constantes e ininterruptos. Depois da Grande Segunda Guerra Mundial, o Estados Unidos ganhou projeção em várias partes do mundo e seus valores religiosos, econômicos e comportamentais formam se expandindo pelos quatro cantos do mundo, e não foi diferente aqui no Brasil.
Na Faculdade de Música da FAC-FITO, em nossos estudos sobre culturas populares e étnicas, visualizamos como a religião e a música se integram e como podem mudar o comportamento e os costumes de um grupo.
Na coluna de hoje, Fernanda Vidal vai falar sobre a influência que o grupo Arautos do Rei, Grupo musical da Igreja Adventista do Sétimo Dia que ganhou vários prêmios nacionais e tem destaque internacional, teve em sua vida. Atualmente estão em sua 26° formação com os músicos: Milton, Ozéias, Tarsis e Jairo. A primeira formação do grupo aconteceu nos EUA, que foram os precursores do estilo musical  A Cappella, aqui na América. O grupo de formação americana, iniciado no ano de 1927, com o titulo de The King's Heralds, realizavam suas apresentações principalmente no programa A voz da Profecia. Uma edição brasileira do programa, com mesmo nome, foi montada e pedia um grupo nos mesmos moldes dos norte americanos. Assim, o quarteto Arautos do Rei,  era a versão em português que surgia em um programa também chamado A voz da Profecia,  produzido pela Igreja Adventista do Sétimo dia, desde 1943. 
Fernanda Vidal, aluna do primeiro semestre da Faculdade de Música, conta-nos um pouco de sua experiência com o grupo Os Araustos do Rei e como trocou o forrô pelos Arautos,  mudando seus hábitos comportamentais.

PROCESSOS DE ACULTURAÇÃO
Fernanda Vidal

Ao apresentar esse trabalho busquei pontuar uma única palavra, aculturação. Relatei um pouco da minha experiência pessoal a respeito dos processos culturais vivenciados por mim no período da adolescência, revivendo a forma que entrei em contato com a religião e como este fato influenciou a música que ouvia. Ao ler o livro Cultura, de Waldemir Caldas, entendi que poderia fazer uma ponte a respeito dos temas estudados no livro e o que vivi em minha adolescência.


Meu primeiro contato com o grupo Arautos do Rei ocorreu no inicio da minha adolescência, aos 11 anos de idade, quando minha família e eu ingressamos numa igreja Batista. Imediatamente, após nos engajarmos nos trabalhos eclesiásticos, nossa realidade musical mudou drasticamente. Nas festas de Natal não havia mais o tradicional forrô para dançar pois as cantatas dos Arautos, com direito a teatro e figurino, preenchiam toda a festa natalina, sons até então estranhos para mim.  Os convidados também mudaram. A ceia passou a ser com os irmãos da igreja, com todos reunidos no templo da igreja. De fato, essa nova sonoridade entrou em minha vida assim, meio de repente. Hoje sou casada e tenho um filho de três anos que gosta e pede para ouvir Arautos.
O que foi um grande choque na época, agora faz parte de mim. Quando ouço algumas canções mais antigas dos Arautos, posso sentir o cheiro dos bancos da pequena capela que frenquentava, construída em meados da década de 1980.
O mais interessante de tudo é perceber o processo de aceitação de cada membro da minha família, com a mesma experiência, no mesmo contexto mas com processos diferentes de assimilação desta nova ordem cultural de nossa casa. Ainda me lembro de minha mãe dizendo sobre seu desespero ao ver meu pai apreciando e ouvindo seu disco vermelho aos domingos, sete horas da manhã, enquanto acordávamos para ir à escola bíblica. Ela, minha mãe, até hoje não suporta. Acostumou-se, é verdade, mas nunca pegou nenhum LP para ouvir.
Acredito que assim acontece com todo processo de aculturação, essa injeção na veia, o choque de culturas, costumes, crenças etc. Mas o que levo de tudo isso resume-se em outra palavra: Tolerância.
Não nos cabe sentenciar juízo de valor, não me cabe medir experiências alheias em comparação às nossas, mesmo com todo o contexto envolvido nos processos.


* Fernanda Vidal de Meneses aluna da FAC-FITO, cursando Licenciatura em música. E-mail: nanda.musicoterapia@yahoo.com.br
Referências bibliográficas: www.novotempo.com.br


 Kátia Peixoto é doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP. Mestre em Cinema pela ECA - USP onde realizou pesquisas em cinema italiano principalmente em Federico Fellini nas manifestações teatrais, clowns e mambembe de alguns de seus filmes. Fotógrafa por 6 anos do Jornal Argumento. Formada em piano e dança pelo Conservatório musical Villa Lobos. Atualmente leciona no Curso Superior de de Música da FAC-FITO e na UNIP nos Cursos de Comunicação e é integrante do grupo Adriana Rodrigues de Dança Flamenca sob a direção de Antônio Benega.


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ENTREVISTA COM CLAUDIO WILLER

07:


Conheci Claudio Willer no ano passado em uma palestra na UFPR sobre seu livro Geração Beat. Se eu já tinha uma paixão por esse pessoal e sua literatura, meu interesse ficou ainda mais atiçado pela sua palestra, a ponto de fazer um projeto para doutorado tendo como objeto de pesquisa....a geração beat. Devido a diversas circunstâncias tive de mudar meu foco e consequentemente o projeto. Pena...mas não coloquei a idéia definitivamente na gaveta. Depois de uma longa troca de e-mails, Claudio gentilmente nos concedeu essa entrevista, para deleite dos assíduos leitores da nossa coluna. Ei-la, enjoy it!


P. Quando e como surgiu seu interesse pela chamada geração beat?

R. Desde sempre. Desde que caí na vida. Por volta de 1960, beat era tema, despertava grande interesse, principalmente por simbolizar rebelião, subversão de costumes e, é claro, inovação literária. Li On the Road. Em 1961, como relato em Geração Beat, o poeta Roberto Piva apareceu em casa com aquela pilha de edições da City Lights, Ginsberg, Corso, etc – pusemo-nos a traduzir. Em 1967, o convite, de Emilio Fontana, para que eu e Décio bar dirigíssemos espetáculo de poesia beat.

P. Como foi o seu contato com o poeta Allen Ginsberg?

R. Por cartas – uma delas está reproduzida on line, em meu blog e no da L&PM. Esclareceu dúvidas. Depois, fez que eu recebesse suas publicações subsequentes.

P.  O estilo beat influenciou sua produção literária?

R. Quem tem que dizer isso são os críticos. Beat é plural, não sei se há propriamente ‘estilo’ – espontaneidade, partilho. Leitores já identificaram trechos mais discursivos, parecidos com prosa, à escrita beat – mas poetas beat também tinham imagética cerrada. Meu gosto por anáforas: Breton ou Ginsberg? como vou saber? ambos, talvez.

P. Qual foi a motivação para escrever o livro "Geração Beat" que saiu pela L&PM em 2009?

R. Ensaio maior, queria fazer há tempos, prosseguindo o que escrevi sobre Ginsberg, inclusive em minha tradução dele – em 2008 Ivan Pinheiro Machado, ao lançar a coleção Encyclopaedia, L&PM Pocket, me convidou para fazer esse livro.

P. No livro, você considera que o escritor paranaense Paulo Leminski não pertence à geração beat, por que?

R. Ele que não se considerava.... Citei a citação de algumas bobagens que ele escreveu, no posfáciod aquela coletânea de Ferlinghetti. Bons poetas às vezes também escrevem bobagens...

P.  Como esse movimento influenciou especificamente a fotografia?

R. Não sei se ‘influenciou’ a fotografia, do mesmo modo como se poderia falar em influência do surrealismo na fotografia. Mas a beat foi e tem sido muito fotografada. Influenciou ou foi influenciado? Ginsberg era maníaco fotográfico, o acervo dele que vai aparecendo... tem aquela página de internet de Allen Ginsberg, é impressionante, não parava de fotografar. Robert Frank, o grande fotógrafo de The Americans, amigo de Kerouac, que o prefaciou. E muito mais. Mais que influência, foram tema de fotografias – há tantos livros bons de fotografias dos beats.

P.  Como você considera a participação das mulheres na geração beat?

R. Tema controvertido. Alguns autores acham que participação das mulheres foi secundária, que foram mantidas à margem, que alguns beats, especialmente Kerouac, foram machistas, ou então, que, sendo homossexuais, não gostavam muito de mulheres. Mas não é a visão da relação com mulheres dada pro um livro como “Women of the beat generation” de Brenda Knight – muito bom, por sinal. Quero traduzir algo da Diane di Prima, boa poeta e bela figura. A participação foi diversa, desde as boas poetas até as figuras trágicas, as vítimas – houve de tudo. Lembro esse ‘statement’ de Gregory Corso:
"Houve mulheres, estiveram lá, eu as conheci, suas famílias as internaram, elas receberam choques elétricos. Nos anos de 1950, se você era homem, podia ser um rebelde, mas se fosse mulher, sua família mandava trancá-la. Houve casos, eu as conheci, algum dia alguém escreverá a respeito."
A declaração de Corso abre o capítulo de Women of the Beat Generation sobre a poeta Elise Cowen, que se relacionou com Ginsberg e Orlowsky, e, depois de ser internada pela família, suicidou-se em 1962.

P.  Poderia explicar a mística que envolve os beats, na forma como você pesquisou em sua tese?

R. Não.... É um assunto extenso.... Em minha tese, Um obscuro encanto: gnose, gnosticismo e a poesia moderna (Civilização Brasileira, 2010) apenas toco na relação de beats com o gnosticismo. Vou mais fundo em um ensaio de pós-doutorado, pronto e à espera de editor, Geração Beat e místicas da transgressão, em que relaciono beats, especialmente Kerouac, ao “anarquismo místico” tal como estudado por Norman Cohn em The search of the Millenium, sobre rebeliões religiosas medievais. Isso, quanto a misticismo. Já a “mística”, acho que foi por terem exercido influência ao promoverem uma renovação e ao expressarem intensamente uma rebelião

Prá finalizar, um poema da extensa lavra de Claudio Willer, poema inspirado na Praia Mole de Florianópolis, SC, na década de 80.



praia na ilha
 
é assim que eu gosto: ninguém por perto

só o acolchoado de areia macia

estendido entre as dunas

onde o esforço de andar

transforma os passos em gestos voltados para baixo

na direção do caldeirão

onde se debate a fumegante cordoalha

labirinto de convulsões

vazio atravessado por espasmos

novelo de tentáculos de espuma, de correnteza polar 

e as mãos de gelo

que apertam a garganta e deslizam pelo ventre

labaredas de mar, ganchos fincados nas costas

para nos arrastar ao fundo

— penetrar nesse abismo

é navegar o dorso da morte, transformar a consciência

em pátio de ventanias —

mas, no entanto

não somos daqui

viemos de muito longe

para descobrir a derradeira praia deserta

no costão oceânico da ilha

cercada de muralhas de vento e claridade

onde cobertores de maresia

são estendidos sobre nossos corpos

mansamente reclinados

sobre a pele dourada do Tempo
http://claudiowiller.wordpress.com/


                                                             
Claudio Jorge Willer, nasceu em São Paulo em 1940. É poeta, ensaista, crítico e tradutor.
Graduado em Psicologia pela USP e em Ciências Sociais e Políticas pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo obteve o título de Doutor em Letras, pela FFLCH-USP, na área de Estudos Comparados de Literaturas de Lingua Portuguesa com a tese "Um Obscuro Encanto: Gnose, Gnosticismo e a Poesia Moderna", aprovada com distinção e louvor em março de 2008.
Como poeta, Willer distingue-se pela ligação com o surrealismo e a geração beat. Ao lado de  Sergio Lima e Roberto Piva é um dos únicos  poetas brasileiros a receber menção do periódico francês La Bréche - Actión Surrealiste, (criada por André Breton) em fevereiro de 1965.
                                                                                Claudio Willer no lançamento do livro "Dentes da Memória"                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                            
                                                                                                                                                
Seus trabalhos estão incluídos em antologias e coletâneas, no Brasil e em outros países. Bibliografia crítica formada por ensaios em revistas literárias, resenhas e reportagens na imprensa, além de citação ou comentários em obras de história da literatura brasileira, como as de Afrânio Coutinho, Alfredo Bosi, Carlos Nejar, José Paulo Paes, Luciana Stegagno-Picchio.
Ocupou cargos públicos em administração cultural e presidiu por vários mandatos a UBE, União Brasileira de Escritores. Co-editou, com Floriano Martins, a revista eletrônica Agulha, de 1999 a 2009. Ministrou inúmeros cursos e palestras e coordenou oficinas literárias em universidades, casas de cultura e outras instituições. Em sua filmografia e videografia, o destaque é para Uma outra cidade, documentário de Ugo Giorgetti com os poetas Antonio Fernando de Franceschi, Rodrigo de Haro, Roberto Piva, Jorge Mautner, Claudio Willer, SP Filmes e TV Cultura, (em 2000).







                                                                                                                           





Izabel Liviski,  é Fotógrafa e Professora de Sociologia, disciplina em que é Doutoranda pela UFPR. Pesquisadora de História da Arte, Sociologia da Imagem e da Cultura, e Linguagens Visuais. Escreve a coluna INCONTROS quinzenalmente às 5as feiras na Revista ContemporArtes.
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Grupos Skinheads Antifascistas e o 9 de Julho


Em meu último post, apresentei, em linhas gerais, a percepção de grupos Skinheads ligados a vertente nacionalista a respeito da Revolução Constitucionalista de 1932. Para eles, comemorar o “9 de Julho” significa, grosso modo, cultuar o mito da revolução gloriosa, segundo o qual o povo se insurge contra o poder central em nome do fim da exploração e, neste caso, pelo bem da nação.
Cabe complementar aqui algo que não foi exposto adequadamente no último post, mas percebido em conversa com meu amigo historiador Renato Dotta. Para alguns destes Skins, prestigiar o desfile cívico-militar do “9 de julho”, no parque do Ibirapuera, significa também cultuar o mito da excepcionalidade paulista, ou seja, a afirmação da superioridade do povo paulista em relação aos demais brasileiros pela crença de ser o único capaz de enfrentar as adversidades, sejam elas políticas, econômicas, etc..., legitimando assim a imagem de São Paulo como a “Locomotiva do Brasil”,  mesmo não defendendo ideias ligadas a secessão política ou racial, deve-se frisar.
Meu objetivo é utilizar esta efeméride como ponto de partida para problematizar a complexidade identitária destes grupos.
Neste post, pretendo dar continuidade ao tema do “9 de Julho’, enfocando outra vertente Skinhead que também se posiciona em relação a estes dois mitos, porém em sentido contrário. São os Skinheads Antifascistas. Eles são identificados por siglas como SHARP (Skinheads Against Racial Prejudice – Skinheads Contra o Preconceito Racial) e RASH (Reds and Anarchists Skinheads – Skinheads Comunistas e Anarquistas).
Esta vertente surgiu em meados da década de 1980, nos Estados Unidos e na Europa, como uma reação aos grupos de Skinheads entusiastas dos ideais  proferidos por movimentos e partidos políticos considerados de extrema direita, como a supremacia racial do europeu, a xenofobia, o anticomunismo e a crença de que somente um governo totalitário seria capaz de garantir o desenvolvimento da nação. Para os Antifascistas, todos estes grupos são denominados, genericamente, de Fascistas.
Cabe aqui ressaltar uma diferença entre o SHARP e o RASH. Enquanto a um tem como principal foco a luta contra o racismo, o outro amplia o seu foco de ação e milita não somente contra o racismo, mas também contra o fascismo, o machismo, a homofobia, o sectarismo entre as correntes partidárias de esquerda, a violência policial, o imperialismo, o capitalismo, além da defesa do poder para o operariado e do socialismo revolucionário. 


É importante ressaltar a postura dos membros dos coletivos Antifascistas sobre alguns aspectos doutrinários que historicamente colocaram o Anarquismo e o Comunismo em conflito, como, por exemplo, a necessidade da existência de um partido como força propulsora da revolução. Em respeito à individualidade e dos pontos de unidade acima citados, cada membro do coletivo tem o direito de professar livremente a sua opção ideológica, desde que seja radicalmente contrária ao Fascismo.  



No Brasil, estes grupos começaram a surgir de forma organizada, por volta da década de 1990 elegendo como grupos inimigos os Skinheads nacionalistas (como os Carecas do ABC e Carecas do Subúrbio) e Skinheads racialistas (como o Poder Branco ou White Power), por conta das gritantes diferenças ideológicas e de posturas entre eles. Para os Antifascistas, estes grupos personificam o extremismo político de direita local. Por isso, algumas ações desenvolvidas pelos Antifascistas tem o objetivo de esclarecer à sociedade de que a cultura Skinhead original, isto é, aquela que surgiu nos subúrbios operários londrinos na década de 1960, não tem relação alguma com o racismo ou a extrema direita. Essas seriam características dos grupos nacionalistas e racialistas e, portanto, segundo eles, nada seriam além de meros simulacros.
Os Skins Antifascistas, também se posicionam em direção contrária a organizações e partidos considerados como representantes do pensamento intolerante brasileiro, procurando se posicionar ao lado de organizações com ideais similares aos seus. Isto pode ser percebido pela participação e apoio de membros do RASH e também do SHARP, em eventos como a Marcha Contra a Homofobia, Parada do Orgulho GLBT ou somando forças a grupos que realizaram um ato de repúdio à manifestação em apoio ao Deputado Federal Jair Bolsonaro no vão livro do MASP, no primeiro semestre de 2011.
Em relação ao “9 de Julho” a RASH procura realizar ações objetivando desmistificar o sentido atribuído a ele por determinados setores da sociedade, enquanto um movimento de caráter popular e democrático, fruto da vontade indômita do povo paulista. Também denunciam a utilização deste evento como espeço para proselitismo de grupos nacionalistas e separatistas.
Para tanto, cito dois exemplos de ações realizadas envolvendo membros da RASH SP nos dias que antecederam o feriado. 
A primeira, em 2011, foi a colagem de cartazes estilo “lambe-lambe”, afirmando uma São Paulo “mestiça, mutltiétnica e multicultural”, buscando assim desconstruir o mito da excepcionalidade do paulista, especialmente, quando este mito é justificado pela herança européia.  Em um dos cartazes lê-se a seguinte mensagem: “Nordestinos, mineiros, gaúchos, bolivianos, espanhóis, italianos... Trabalhadores de todas as partes do mundo construíram uma São Paulo multiétnica”. Ou seja, São Paulo não foi construída pelos descendentes de europeus e destruída pelos brasileiros oriundos de outras regiões, especialmente do Nordeste.  Um recado claro para grupos como os White Power.



A segunda ação ocorreu neste ano e enfatizou o discurso da utilização da população paulista da época em proveito dos interesses das elites cafeeiras destituídas do poder. A ideia de que o povo de São Paulo se levantou contra o governo Vargas considerado opressor, ou seja, o mito da revolução gloriosa, é refutado com veemência pelos Antifascistas com a afirmação de que a Revolução foi uma rebelião da oligarquia cafeeira motivada pela perda dos seus privilégios políticos, antes da chegada de Vargas ao poder, e a população foi utilizada como massa de manobra para recuperá-los.



Assim, observamos a consolidação de grupos antagônicos de Skinheads em São Paulo envolvidos em uma “batalha de memórias” para defender seu ideário. Metodologicamente isto nos ajuda a apreender com mais densidade as singularidades de cada uma destas vertentes, evitando assim as generalizações.

Como fonte de informações, utilizei o sítio da seção local da RASH.: http://rash-sp.blogspot.com.br/
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APARÊNCIAS




Nossa, me deu uma vontade de tomar suco de laranja!
Laranjas, que frutas maravilhosas, não?
Você olha para elas e não consegue identificar nenhuma, tampouco se o sumo é doce ou azedo. 
São apenas laranjas, todas iguais no exterior. 
Chegam até a nos confundir. São misteriosas, ocultam segredos.
Para saber se uma laranja é boa, é preciso abri-la e conhecer seu âmago.
Durante a vida, muitas laranjas passam por nossas mãos. 
Algumas vezes no encantamos com a superfície lisa, para descobrir que são azedas como limão. Em outras, o tamanho nos impressiona, mas ao espremê-la percebemos que é seca.
Um dia desses, comprei um pacote de laranjas. Eram pequenas e  com casca irregular.

Estavam ensacadas e com preço muito baixo. Eu as trouxe. 
Uma a uma, essas laranjas foram se encaixando perfeitamente em minhas mãos, permitindo que delas eu tirasse totalmente o sumo. O caldo era deliciosamente perfumado, e saciei minha sede com muitos copos de laranjada.

Quantas vezes escolhemos a laranja errada! Achamos que por ser mais cara ou mais bonita será mais nutritiva ou gostosa. Quanta inocência. Só conhecemos as laranjas quando as trazemos para nossa casa e as esprememos.
Simone Pedersen é escritora. 
Tem vários livros publicados para crianças e adultos, com contos, crônicas e poemas.


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Último dia de Anima Mundi




Você gosta de filmes de animação? Se a resposta for sim, você com certeza tem um programa bacana para esse fim de semana – o Anima Mundi. Mas, se a resposta for negativa, talvez seja o evento que vai fazer você mudar de opinião, afinal, dentre as atrações do festival, estão bate-papos e palestras que ajudam a compreender melhor sobre o universo das animações e pode ser esse o empurrãozinho que faltava para você mergulhar nesse gênero de filmes.



Esse ano, o Festival Internacional de Animação do Brasil completa 20 anos de existência e para comemorar, têm novidades na programação do evento. Além dos 448 filmes (curta e longa metragens) que estão sendo exibidos desde o dia 25 (quarta-feira) na capital Paulista também fazem parte do evento palestras, oficinas e bate-papos com profissionais da área de animação.

A novidade desse ano é que o vencedor da mostra será indicado ao Oscar do ano que vem na categoria de melhor animação de curta-metragem. A votação das melhores criações em cada categoria é feita pelo próprio público presente e por um júri profissional. Vale lembrar que hoje dia é o último dia do evento!

Onde: Centro Cultural do Banco do Brasil e Memorial da América Latina.
Quanto: os ingressos inteiros custam R$ 8 e meia R$ 4.
Mais informações: http://www.animamundi.com.br/


Ana Paula Nunes é jornalista, Especialista em Mídia, Informação e Cultura pela Universidade de São Paulo. Coordena a Comunicação da Revista ContemporARTES.
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