Em defesa da Literatura
O
Colégio de Aplicação da Universidade Federal de Viçosa (COLUNI) possui um
rigoroso processo de seleção (uma espécie de vestibulinho) para selecionar os
alunos que nele desejam cursar o Ensino Médio. Nesse ano de 2012, a obra
literária indicada para esse vestibulinho foi Violetas e Pavões (2009) do premiado escritor Dalton Trevisan[1].
Tendo
como principal protagonista a obra de Dalton Trevisan, pais de alunos que
concorrem às vagas de tal colégio, cursinhos preparatórios e, pasmem, até instituições
religiosas repudiaram a escolha dessa obra literária. Conforme uma matéria
publicada no jornal Estado de Minas no dia 05 de setembro, os moradores de
Viçosa ficaram chocados com a linguagem picante, diálogos incomuns e eróticos,
universo de drogas, crime e sexo.
O
pior disso tudo é que o Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (Cepe) da
Universidade Federal de Viçosa (UFV) lançou uma nota no site de tal instituição
avisando que no dia 03 de setembro houve uma reunião que deliberou pela
retirada de Violetas e Pavões do
edital do vestibulinho. Enquanto aqueles que repudiavam o livro viam seus
desejos satisfeitos através de uma atitude provinciana (palavras utilizadas em
uma matéria publicada no dia 05 de setembro no site da VEJA, através da qual a
editora Record lamenta a atitude da UFV) e marcada pela censura, outras
pessoas, como os próprios alunos do COLUNI, questionavam essa ação – uma matéria
do jornal Estado de Minas publicada no dia 06 de setembro alunos e professores
do COLUNI protestaram contra a medida autoritária da universidade.
Em
meio a essa confusão que vejo pela janela de minha casa, eu, que li a obra, me
questiono, primeiramente acerca do conteúdo e do julgamento que a “sociedade”
viçosense fez acerca dos contos que compõem Violetas
e Pavões. É inegável que os contos de Dalton Trevisan retratam temáticas relacionadas
a drogas, tráfico, sexo, estupro, autodescobrimento, enfim, assuntos que são
nossos contemporâneos. Basta ligar a TV a qualquer hora do dia, assistir a telenovelas, acessar
qualquer site de notícias, ler qualquer jornal (enfim, ter acesso aos meios de comunicação) para deparar-se com alguma
matéria que contemple tais temas.
Eu
que moro nessa cidade “provinciana”, após ler os julgamentos acerca de tal obra
literária, até me perguntei se o mundo no qual a “sociedade” de Viçosa vive é
diferente do meu, apesar de desfrutamos do mesmo espaço físico. Questiono-me,
será que os jovens de 13 e 14 anos que querem adentrar em tal colégio não estão
preparados para ler contos que contenham matérias contemporâneas? Sendo assim,
eles estão devidamente preparados para viver no mundo contemporâneo?
Por
fim e não menos grave, a atitude da UFV é totalmente autoritária, hipócrita e,
porque não, paternalista, uma vez que somente durante regimes ditatoriais a
Censura a uma obra era exigida e levada a cabo. Parece que uma Universidade
Federal como essa desconhece a importância da literatura para a formação
crítica dos cidadãos. O que Dalton Trevisan almeja através da escritura de seus
contos, certamente, não é aliciar jovens para o tráfico, incitar ao sexo, ao
estupro, à violência. O autor somente retrata aquilo com o qual todos nós
deparamo-nos diariamente. Sendo assim, a literatura, é uma das maneiras de
levar o leitor a refletir sobre os acontecimentos que assolam o seu mundo e de
refletir acerca das maneiras de solucionar tantos problemas que se dão não só
no Brasil, como em todo o mundo.
Sites
Consultados:
Jornal Estado de
Minas:
VEJA:
Rodrigo C. M. Machado é mestrando em Letras, com ênfase em Estudos Literários, pela Universidade Federal de Viçosa. Dedica-se ao estudo da poesia portuguesa contemporânea, com destaque para a lírica de Sophia de Mello Breyner Andresen.
[1]
Autor que recebeu nesse ano de 2012 o Prêmio Camões, maior prêmio literário em
Língua Portuguesa.